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Brasil pode liderar descarbonização do aço

20.10.2022 | | Notícias do Mercado

Fonte: Valor Econômico
Data: 19/10/2022

Avançar no processo de reduzir emissão de gases poluentes para mitigar o aquecimento global e tornar seus produtos mais sustentáveis é o grande desafio da indústria do aço hoje. Neste cenário, o Brasil tem potencial de liderar este processo de descarbonização. É o que aponta um relatório recente divulgado pela consultoria McKinsey & Company que o Prática ESG teve acesso com exclusividade.

A consultoria traça três potenciais caminhos para a descarbonização nesta indústria: otimização da operação existente, ajustes nos investimentos (Capex) de empresas, e novas tecnologias.

Considerada um dos maiores vilões das emissões de gás carbônico (CO2), a siderurgia é, mundialmente, o setor industrial que mais joga o gás na atmosfera. De acordo com a World Steel Association, representa entre 7% e 9% dos Gases de efeito estufa (GEE), que, além do CO2, inclui também óxido nitroso e metano.

João Guillaumon, sócio da McKinsey e um dos responsáveis pelo estudo, comenta que as empresas brasileiras são beneficiadas por serem globalizadas, seja por ter exportações significativas, principalmente de produtos semiacabados, como também no controle acionário – muitas têm sócios estrangeiros ou pertencem a multinacionais:

-Desta forma, as exigências de descarbonização por parte dos clientes e acionistas internacionais estão antecipando os efeitos de regras e limitações sobre a emissão de carbono que ainda estão sendo elaborados no Brasil.

Para Guilherme Abreu, gerente geral de sustentabilidade da ArcelorMittal Brasil, que opera na produção de aços no país, com capacidade instalada superior a 12,5 milhões de toneladas/ano e receita líquida de R$ 69 bilhões em 2021, os debates e ações na área estão evoluindo.

O executivo salienta que as unidades do grupo no Brasil contribuem para cerca de 2,9% das emissões globais e o país está se movimentando por meio de compromissos assumidos internacionalmente, para reduzir em 50% as suas emissões absolutas até 2030 e ser um país neutro em carbono até 2050. “Metas que consideramos ousadas e em consonância com o Acordo de Paris.”

Para cumprir o combinado, a ArcelorMittal já investiu cerca de 300 milhões de euros no desenvolvimento de tecnologias de carbono neutro em seus Centros de Pesquisa e Desenvolvimento até agora. Até 2030, deverá investir mais US$ 10 bilhões. A empresa não abre dados do Brasil.

– O Brasil possui vários diferenciais que favorecem uma migração para uma economia de baixo carbono: matriz elétrica 85% renovável, geografia favorável à produção de energia eólica e solar e uso de biomassa renovável – diz Abreu.

De fato. A questão energética é um atrativo e tanto para um setor tão intensivo em uso de combustíveis fósseis para esquentar suas matérias-primas e transformá-las em aço e produtos derivados. O relatório da McKinsey destaca o acesso a fontes de energia alternativas um dos grandes diferenciais do Brasil, em especial ao hidrogênio verde.

“A disponibilidade de energias renováveis competitivas coloca o Brasil entre os produtores do hidrogênio verde mais competitivos do mundo. Mesmo sob as projeções mais otimistas sobre a disponibilidade da matéria-prima na Europa, é mais econômico para a região comprar e importar do Brasil”, pontua o texto.

O uso do hidrogênio verde para o processo de redução do minério é um dos três pilares tecnológicos que a consultoria acredita que farão a diferença para o setor se descarbonizar e alcançar o net zero (zero emissões líquidas de carbono) na produção do aço.

Os outros dois são o desenvolvimento de mecanismos de captura, utilização e armazenamento de carbono (CCUS) – processo que captura até 90% das emissões, evitando a intensificação do efeito estufa; e o avanço do uso da biomassa.

Esta última tecnologia engloba a produção do biocarbono, que é obtido a partir da carbonização de biomassa, sendo uma fonte de energia renovável, que não solta na atmosfera carbono. É nesta frente que a Tupy, multinacional brasileira que desenvolve e produz componentes estruturais em ferro fundido de alta complexidade, atua.

Em parceria com o Senai, a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a companhia investe no desenvolvimento de briquetes – bloco denso e compacto de materiais energéticos – de biomassa como forma de substituição parcial ao coque industrial na fabricação de produtos. O valor investido especificamente no projeto não é, porém, revelado.

– A conclusão dos estudos está prevista para 2024, quando poderemos iniciar a adoção da tecnologia validada. Tratamos este tema como prioridade- afirma Fernando Cestari de Rizzo, CEO da Tupy, que reportou receita de R$ 7 bilhões no ano passado.

De acordo com o executivo, considerando os investimentos em ativos, a empresa alocou em 2021 mais de R$ 90 milhões em tecnologia, treinamentos e busca de novas alternativas para alcançar um cenário favorável à descarbonização. Somente em pesquisa e desenvolvimento (P&D), foram ao todo R$ 25 milhões, sendo 70% alocado em iniciativas voltadas para a sustentabilidade.

-Também temos estimulado e subsidiado a pesquisa e o desenvolvimento de universidades e institutos de pesquisa brasileiros. Isso tem um impacto social muito importante, ao reconhecer talentos e competências que temos no país, e aplicá-las em soluções que serão comercializadas para mais de 30 países- explica o executivo.

A produtora de aço Gerdau também não fica para trás. A gigante nacional de R$ 78 bilhões de receitas em 2021, assumiu em fevereiro um compromisso de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa dos escopos 1 e 2 (relacionados a sua própria produção) para um valor menor do que 50% da média global da indústria do aço. A neutralidade do carbono é esperada para 2050.

Atualmente, a empresa afirma possuir uma das menores médias de emissão de gases de efeito estufa (CO2e), de 0,90 t de CO22e por t de aço, o que representa aproximadamente a metade da média global do setor, de 1,89 t de CO2e por t de aço, segundo os dados de 2020 divulgados pela World Steel Association. Para 2031, a estimativa é chegar a 0,83 t de CO2e por tonelada de aço.

-Para isso, já demos os primeiros passos com a instalação de parques solares em Minas Gerais e um parque fotovoltaico em Midlothian, no Texas, nos Estados Unidos. Ambas as iniciativas têm como objetivo fornecer energia renovável para as unidades de produção de aço – explica Cenira Nunes, gerente geral de meio ambiente da Gerdau.

Segundo a executiva, como iniciativa de descarbonização de curto prazo, a empresa já instalou em Ouro Branco (MG), uma das unidades de produção de biocoque, que contém até 2% de biomassa em substituição ao carvão mineral. Só isso confere redução de 32kgCO2e/ton de aço ou 10.000 tCO2e/mês. Foi desenvolvido ainda um projeto com comunidades locais para o abastecimento de biomassa – o carvão era importado.

O carvão vegetal, que funciona como biorredutor na fabricação do ferro-gusa, principal formador do aço. Para 2022, a perspectiva é a unidade de Ouro Branco dobrar o consumo de biocoque de carvão vegetal e avançar no desenvolvimento de biomassas de bagaço de cana e resíduos de milho e café.

2 de 2 Três potenciais caminhos para a descarbonização do setor siderúrgico: otimização da operação existente, ajustes nos investimentos (Capex) de empresas, e novas tecnologias. — Foto: Carlos Ivan/Infoglobo

Três potenciais caminhos para a descarbonização do setor siderúrgico: otimização da operação existente, ajustes nos investimentos (Capex) de empresas, e novas tecnologias. — Foto: Carlos Ivan/Infoglobo

Para 2022, a Gerdau anunciou que os investimentos em melhorias de práticas ambientais superam R$ 800 milhões.

— Estes investimentos contemplam a expansão de ativos florestais, atualização e aprimoramento de controles ambientais, incrementos tecnológicos que resultam em eficiência energética e redução de emissões de gases de efeito estufa – fala Cenira.

Está nos planos ainda ampliar o uso da sucata ferrosa como matéria-prima para a produção de aço.