30.10.2025 | ABIFER | Notícias do Mercado
Fonte: Valor Data: 30/10/2025
Enchentes, ondas de calor, chuvas muito além do esperado e deslizamentos de terra. As mudanças do clima há muito deixaram de ser um tema distante da realidade das populações. Na ponta, as cidades encaram com cada vez mais frequência os impactos de eventos climáticos extremos, que desafiam governos a buscar soluções de adaptação. No Brasil, 2.807 municípios, mais da metade das cidades do país, já estão em situação de alta ou muito alta vulnerabilidade climática, segundo a plataforma Adapta Brasil, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
Os riscos se traduzem nos números do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). Desde 2011, quando o órgão foi criado, quase 30 mil alertas foram emitidos e 14 mil ocorrências registradas (os casos passaram a ser contabilizados em 2016). O recorde foi em 2024, com 3,6 mil alertas, metade deles de deslizamentos de terra. Já as ocorrências alcançaram 1,7 mil registros, o terceiro maior nível da série histórica. Quase 70% dos casos foram de origem hidrológica, como enchentes e inundações.
Uma iniciativa do governo federal tenta coordenar projetos para mitigar impactos e adaptar as cidades para enfrentar as mudanças no clima. O Programa Cidades Verdes Resilientes (PCVR), articulado pelo Ministério de Meio Ambiente (MMA) e pelo MCTI com bancos de fomento e entidades da sociedade civil, visa criar uma espécie de “federalismo climático”, fazendo a ponte entre os governos e recursos técnicos e orçamentários para desenvolver e tirar soluções do papel. “A ideia é coordenar esforços e integrar políticas urbanas, climáticas e de inovação para ajudar as cidades e Estados a saber o que eles têm que fazer para aumentar a resiliência”, afirma Adalberto Maluf, secretário de Meio Ambiente Urbano e Qualidade Ambiental do MMA.
Maluf explica que a iniciativa envolve a criação de uma lista de 50 cidades-modelo, que estão recebendo auxílio técnico, para identificar vulnerabilidades climáticas e elaborar dois projetos, um de mitigação e um de adaptação. Os recursos para essas iniciativas vêm de organizações privadas como Fundação Bloomberg, Google, IBM e C40, rede global que reúne 96 municípios com o compromisso de combater mudanças climáticas.
Além da falta de coordenação técnica, o orçamento é um dos entraves para a maioria dos municípios. Por isso, o governo federal aportou R$ 27,5 milhões em áreas periféricas de 11 cidades. A ideia é fomentar a elaboração comunitária de soluções baseadas na natureza (SBNs), isto é, projetos que usam elementos naturais para resolver problemas ambientais e urbanos, como corredores verdes e jardins de chuva. Há ainda uma articulação do MMA para acesso de cidades a financiamentos com taxas de juros mais baixos e carência de pagamento junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no escopo do Fundo Clima.
O PCVR ainda inclui um banco de projetos com 323 planos inscritos por prefeituras, a maior parte sobre áreas verdes, uso e ocupação do solo, gestão de resíduos e mobilidade sustentável. Os projetos estão orçados em R$ 15 bilhões. “Trabalhamos com deputados e senadores para a destinação de emendas parlamentares para esses projetos. As cidades que mais precisam investir em adaptação são as que têm as piores capacidades de pagamento”, prevê Maluf.
As metas do programa incluem a previsão de 35% dos municípios com capacidade adaptativa até 2035, 57% das pessoas vivendo em ruas com pelo menos três árvores, e 17,5% das cidades com registro e implementação de SBNs.
Tornar as cidades mais resilientes será tema de um dos pavilhões de discussão da COP30. Com coordenação do Instituto Bem Ambiental (Ibam), o espaço deve reunir municípios, universidades, organismos internacionais e empresas. “O objetivo é ser um hub das discussões. O foco da agenda climática tem sido a redução de gases do efeito estufa e transição energética, mas pouco se fala sobre a urgência de adaptar os nossos territórios”, observa Sérgio Myssior, presidente do Ibam.