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Critérios para a infraestrutura

11.10.2019 | | Notícias do Mercado

Propor regras para os investimentos em infraestrutura é bom para o interesse público

 

Segundo o Tribunal de Contas da União, das 38 mil obras públicas federais, cerca de 14 mil (38%) estão paralisadas. Além da perda dos investimentos, isso acarreta prejuízos indiretos, como entraves à economia local e a privação de serviços. O Tribunal estima que uma das causas principais é a deficiência na elaboração e avaliação dos projetos. A maior parte dos empreendimentos do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), por exemplo, foi dispensada da apresentação de estudos de viabilidade, sob a justificativa de que eles prejudicavam a celeridade das obras. Para boa parte delas, isso resultou em atrasos e majoração de custos. A fim de racionalizar os critérios de escolha para investimentos em infraestrutura, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e a Secretaria de Desenvolvimento da Infraestrutura do Ministério da Economia elaboraram um estudo para determinar parâmetros de priorização.

Trata-se de estabelecer indicadores para mensurar o custo-benefício dos projetos. A ponderação entre gastos e retornos socioeconômicos é especialmente complexa no caso de empreendimentos em infraestrutura. Primeiro, por causa da diversidade de impactos indiretos – por exemplo, a redução de acidentes após alguma obra rodoviária, ou os ganhos para a saúde com obras de saneamento, ou os efeitos ambientais de uma hidrelétrica. Em segundo lugar, projetos de infraestrutura têm por natureza uma vida operacional prolongada, abrangendo em geral duas gerações, o que exige uma avaliação intertemporal de seus custos e benefícios. É comum, por exemplo, que um gestor tenha de decidir entre um alto retorno, mas num futuro distante, e um retorno modesto, porém imediato.
O principal parâmetro consagrado pela comunidade internacional para a análise de custo-benefício é a chamada “taxa social de desconto”, que representa a quantidade de recursos econômicos de que a sociedade estaria disposta a abrir mão no presente para auferir benefícios do projeto no futuro. Isso implica ponderar três elementos: 1) o valor atribuído a um determinado bem ou serviço por seus demandantes; 2) o valor atribuído pelos ofertantes; e 3) o impacto líquido sobre a sociedade, ou seja, os benefícios além dos custos. Quanto maior a taxa social de desconto, maior a preferência pelo consumo presente em detrimento dos benefícios futuros.

Conforme a metodologia detalhada na pesquisa, a qual foi submetida a uma consulta pública ao longo de um mês, o índice proposto para a taxa social de desconto no Brasil é de no mínimo 10% ao ano. É uma meta relativamente alta, considerando-se que em países contemplados no estudo, como Austrália, Reino Unido ou Estados Unidos, o índice varia de 3% a 7%. Mas está de acordo com a referência média de 10% a 12% recomendada para países em desenvolvimento por organismos multilaterais como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento.
Os cálculos consideraram relações estruturais de longo prazo, a fim de obter fórmulas atinentes ao comportamento normal da economia brasileira. Segundo os pesquisadores, a determinação de um valor perene, uniforme e sistemático para todos os projetos de infraestrutura do governo federal – procedimento adotado por países de referência em governança de investimentos públicos – é fundamental para a isonomia do critério de investimento e para que projetos possam ser comparados. Além disso, em períodos de recessão, caracterizados pela ociosidade dos fatores produtivos, a taxa alta obriga a priorizar projetos cujos benefícios econômicos se concretizem em prazos mais curtos, contribuindo mais efetivamente para a retomada do crescimento.
Tais resultados podem e devem passar pelo escrutínio de autoridades e estudiosos em finanças. Mas o fato de propor regras básicas para os investimentos em infraestrutura demonstra uma tendência a que esse jogo seja jogado em favor dos interesses públicos, e não das ambições circunstanciais do governo de turno.

 

Fonte: Estadão
Data: 10/10/2019