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Estado licita novos estudos para implantar metrô entre Rio e São Gonçalo

09.11.2023 | | Notícias do Mercado

Fonte: Extra
Data: 06/11/2023

Tantas foram as vezes que autoridades e políticos se comprometeram a implantar a Linha 3 (Rio-Niterói-São Gonçalo) que até o boliviano Carlos Alberto Espinoza, que se mudou com os pais em 2008 para São Gonçalo, vira e mexe ouve anunciarem “o tal metrô”. Entre promessas, mudanças de traçado e anúncios de licitações para estudos e obras, desde 1968 — quando o projeto metroviário do Rio de Janeiro foi lançado — a história da eventual via reúne pelo menos 26 capítulos, quatro deles escritos este ano, e muitos gastos. Só a elaboração de um projeto chegou a ser contratada por R$ 62,5 milhões.

No último capítulo, o governo do estado lançou edital de concorrência, prevista para 19 de dezembro, para a realização de mais um estudo “de viabilidade técnica, jurídica, econômica e ambiental” de implementação da Linha 3, agora interligando a Praça Quinze (Rio), a Praça Arariboia (Niterói) e Alcântara (São Gonçalo), passando sob a Baía de Guanabara. O edital não estima o valor do serviço, para servir de parâmetro a empresas interessadas. Já a execução do trabalho — inclui trecho metroviário entre o Jardim Oceânico, na Barra, e o Recreio — tem prazo de 18 meses.

— Saindo o novo estudo e o projeto básico, espero que a Linha 3, finalmente, saia do papel — diz o arquiteto e urbanista Carlos Eduardo Ribeiro, membro do coletivo Ressuscita São Gonçalo.

Ainda em 2000, um trabalho contratado pelo BNDES (o banco não localizou o estudo) comprovou que o túnel subterrâneo seria viável. À época, foi calculado que a ligação entre as estações Carioca, no Rio, e Guaxindiba, em São Gonçalo, poderia beneficiar 750 mil passageiros por dia.

Dez anos depois, em 2010, o Tribunal de Contas da União (TCU) incluiu na “relação de obras e serviços com indícios de irregularidades graves” estudos e levantamentos topográficos, geológicos e geotécnicos, apenas no lote 2 da via (entre Niterói e Guaxindiba), no valor de R$ 62,5 milhões. Tais falhas levaram o órgão a suspender na ocasião o uso de verbas federais nas obras de construção do lote 2.

No penúltimo capítulo do imbróglio, em agosto, o governador Cláudio Castro recebeu uma comitiva da CRRC Corporation Limited, empresa de infraestrutura chinesa, que apresentou uma proposta, prevendo a construção e a operação da via. No mesmo mês, o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado pelo governo federal, incluiu R$ 20 milhões para a realização de estudos visando a “retomada, conclusão e novas obras” da Linha 3.

Antes, porém, em março, o estado, em parceria com a prefeitura de São Gonçalo, iniciou as obras do Muvi (Mobilidade Urbana Verde Integrada) num trecho de 18 quilômetros e 31 estações, entre Neves e Guaxindiba, que está no traçado da Linha 3 e onde operou uma linha férrea até 2007. Lá, estão sendo implantados corredor preferencial para ônibus (BRS), faixas para carros, nova rede de drenagem, calçadão e ciclovia.

— Tomara que o metrô saia um dia. Mas, pelo menos, o Muvi poderia chegar à estação das barcas de Niterói para que os passageiros não tenham que enfrentar engarrafamento de Neves até lá — diz Espinoza, de 29 anos, que tenta o vestibular para Medicina na Uerj.

O estado garante que “o traçado do Muvi não interfere no projeto da Linha 3″. Apesar de considerar positivas as intervenções urbanísticas e paisagísticas previstas no Muvi, o arquiteto Ribeiro entende que parte do que está sendo construído terá que ser quebrado se o metrô chegar a São Gonçalo:

— Não vejo como construir uma via elevada para o metrô sem quebrar calçadas para instalar pilares. Dinheiro pode estar sendo jogado fora.

Professor do Departamento de Construção Civil e Transportes da Uerj, Leandro da Rocha Vaz, embora considere importante para a melhoria do fluxo entre Rio, Niterói e São Gonçalo, não vislumbra a possibilidade de construção do túnel sob a Baía de Guanabara.

— É uma obra cara, que exige uma tecnologia absurda. E, para agravar, o estado ainda está em Regime de Recuperação Fiscal — argumenta ele, que vê na ligação metroviária elevada entre Niterói e São Gonçalo, ou até através de um corredor rodoviário, uma saída: — Mas é preciso levar o passageiro até a estação das barcas e aumentar o fluxo dessas embarcações para atenderem à nova demanda de usuários.

Ao longo de 55 anos, ex-presidentes, ex-governadores e ex-secretários estaduais foram porta-vozes do anúncio de parcerias entre os governos federal e estadual e de alocação de verbas. Em 2001, chegou a ser lançado um edital de licitação, mas só do trecho Niterói-São Gonçalo e de um metrô de superfície.

Doze anos depois, o então governador Sérgio Cabral e a então presidente Dilma Rousseff anunciaram uma parceria, com o objetivo de arrecadar R$ 2,57 bilhões para a construção da Linha 3, já encurtada, entre Niterói e São Gonçalo. Depois, surgiram ideias de substituir metrô por BRT ou Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) para ligar as duas cidades, que acabaram descartadas em 2015.

Defesa do eleitor

O advogado Ozeas da Silva Melo, de 63 anos, que mora desde os 5 em São Gonçalo conta que, sem um transporte mais eficiente entre o seu município e o Rio, seus dois filhos, universitários, levam entre duas e duas horas e meia para chegar ao Fundão e precisam pegar dois ônibus:

Desde 1986 morando em São Gonçalo, o aposentado Paulo Sérgio Correia, afirma que se sente “enganado”:

— Há mais de 30 anos, ouço candidato dizer que a gente vai ter metrô. Ganha, e depois some.

O aposentado Haroldo Goulart, de 67 anos, que trabalhou no Rio, também não acredita na chegada do metrô. Já Luís Cléber de Oliveira, de 60 anos, porteiro do condomínio Tamoio, manifesta algum otimismo:

— Tenho fé que um dia teremos metrô. Nem que seja para meus filhos e netos.

Desapropriações lentas

Segundo o estado, estão sendo investidos R$ 262 milhões nos 18 quilômetros do Muvi. E as obras, diz o governo, têm previsão de conclusão em abril de 2024. No momento, estão sendo executadas no trecho 2 (entre os bairros de Porto Velho e Camarão) e sendo iniciadas no 1 (de Neves a Porto Velho).

Nos outros quatro trechos, onde se concentram as desapropriações a serem feitas pela prefeitura, ainda não há qualquer vestígio de intervenções. O município informa que iniciou com visitas técnicas, em 2021, o processo de desocupação de construções erguidas sobre a antiga linha férrea, para a construção de calçadão e ciclovia do Muvi.

— Não era BRT (ônibus articulados trafegando em canaleta)? Será BRS (limitado por faixa azul)? Prometeram mais coisa para a gente — lamentou a jornalista Ohanna Carolina Ribeiro dos Santos, moradora do bairro Porto da Madama (trecho 2) ao saber de detalhes do projeto. — Estou meio confusa com essa obra. Tomara que não tirem a estação antiga de trem. Para fazerem a nova pista, na Rua Comandante Ari Parreiras, tiraram algumas garagens e puxadinhos que estavam sobre a linha do trem.

O arquiteto Ribeiro considera muito apertado o prazo fixado para concluir o Muvi, tendo em vista o andamento das obras e as desapropriações necessárias sobretudo no trecho da comunidade do Jardim Catarina. Para ele, como o corredor não seguirá até a estação de barcas de Niterói, haverá um afunilamento em Neves. Rodrigo Molina, de 37 anos, que nasceu e mora no bairro da Mangueira, em São Gonçalo e trabalha na Tijuca, no Rio, concorda:

— Não vejo muita vantagem se o corredor acabar em Neves. Para a gente que pega engarrafamento todos os dias, indo de ônibus até o Rio, é complicado. Quem usa as barcas também sofre, porque nos horários de rush, elas não dão vazão. Não tem para onde correr.