Av. Paulista, 1313 - 9º Andar - Conjunto 912 (11) 3289-1667 [email protected]
pt-bren

Mudanças de governo devem reduzir ritmo dos leilões de concessões

30.03.2023 | | Notícias do Mercado

Fonte: Valor
Data: 30/03/2023

As mudanças dos governos federal e estaduais no início deste ano devem reduzir o ritmo de novas concessões e da relicitação de ativos que estão sendo devolvidos por concessionárias. Também colocam uma interrogação sobre alguns pontos, como a participação acionária de 49% da Infraero nos primeiros terminais aeroportuários concedidos no país, e com relação à desestatização de terminais portuários, como o maior do Brasil, o de Santos.

Na União, a grande aposta para 2023 é a relicitação do aeroporto de São Gonçalo do Amarante, em Natal (RN), que deve dar as bases para o que será a possível licitação dos aeroportos do Rio de Janeiro – Galeão e Santos Dumont –, afirma Ewerton de Souza Henriques, diretor de projetos de infraestrutura, PPPs, concessões e privatizações do banco Fator. O edital do certame foi publicado em fevereiro no Diário Oficial da União. A previsão é de que o leilão seja realizado em 19 de maio.

Quem vencer a disputa vai administrar o terminal aéreo potiguar pelos próximos 30 anos e terá a obrigação de investir pelo menos R$ 308,9 milhões no ativo. Trata-se do primeiro aeroporto do país, como também primeiro ativo do setor de transportes, a ser relicitado. Ele está em processo de devolução pela Inframerica – mesma concessionária que administra atualmente o aeroporto de Brasília. A devolução foi solicitada há mais de dois anos, mas a nova licitação só foi aprovada no início do ano pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

A relicitação do aeroporto de São Gonçalo do Amarante é a primeira de um processo que envolve outras dez concessões no setor de transportes. Sete rodovias, uma ferrovia e outros dois terminais aéreos esperam por novos processos de concessão, após suas gestoras desistirem da administração. Ato voluntário da concessionária, o pedido de relicitação segue os requisitos estabelecidos na Lei n° 13.448, de 5 de junho de 2017, e no Decreto nº 9.957, de 6 de agosto de 2019.

Consiste na devolução amigável do ativo, seguida do leilão e da assinatura de novo contrato com o vencedor do certame. O procedimento foi criado para gerar segurança jurídica e garantir a continuidade da prestação dos serviços, evitando prejuízos à população, porque a concessionária deve manter a qualidade e os requisitos de segurança operacional até que a nova empresa assuma as operações do empreendimento.

Os processos se tornaram mais complexos com a pandemia, que trouxe pleitos regulatórios. “A questão de indenização dos investimentos não amortizados é um ponto que sempre enseja discussão e a pandemia trouxe questionamentos ainda mais complexos”, afirma o sócio de infraestrutura do Mattos Filho Advogados, André Freire. O processo de relicitação ainda envolve uma etapa em que o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), do governo federal, deve indicar à Presidência da República se o ativo deve ser relicitado. Atualmente, o órgão ainda está sendo montado.

Há dúvidas também sobre o avanço da desestatização do setor portuário. Quem administra o maior terminal do país, por onde passa um quarto das cargas, é a Santos Port Authority, empresa pública vinculada ao governo federal. O ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França, já se declarou contrário à privatização do porto de Santos.

Em rodovias, a expectativa é em relação a avanços no programa de concessão de rodovias do Paraná, que deve reunir estradas federais e do Estado. Os trechos englobam a interligação do porto de Paranaguá, o maior porto exportador de produtos agrícolas do Brasil; a região metropolitana de Curitiba, composta por 29 municípios, com mais de 3,5 milhões de habitantes e diversas indústrias instaladas; as regiões norte e oeste do Estado, que se destacam pela grande produção agrícola; e a ponte da Amizade na fronteira do Brasil com o Paraguai, que constitui importante ligação com o Mercosul e está inserida em região de grande apelo comercial e turístico. São seis lotes e os dois primeiros já contam com aval da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e do Tribunal de Contas da União (TCU).

Em aeroportos, o terminal do Santos Dumont, no Rio de Janeiro, com uma das mais movimentadas rotas do mundo, a ponte aérea entre Rio e São Paulo, é o último dos principais terminais ainda não licitados. Seu futuro depende da decisão da devolução do terminal do Galeão. O aeroporto pode ser adicionado ao de Santos Dumont para licitação, mas ainda depende de uma solução do governo federal com a concessionária.

“Em relação aos Estados, as apostas são de que São Paulo e Minas Gerais devem liderar os processos de transferência de concessões”, afirma o sócio da Una Partners, Daniel Keller. Com a reeleição de Romeu Zema Neto (Novo), o governo de Minas pretende realizar em maio a concorrência internacional para operação, manutenção, monitoração, conservação, ampliação do trecho rodoviário de Varginha-Furnas, com extensão de 432,8 quilômetros (km). O leilão dá continuidade ao programa de transferência de estradas estaduais para a iniciativa privada. Estima- se que possa envolver mais de R$ 10 bilhões em investimentos. Em 2022, foram assinados dois contratos de concessão.

O primeiro lote, que fica no Triângulo Mineiro e tem quase 630 km de extensão, passa pelas cidades de Uberaba, Uberlândia e Araxá. Já o segundo lote, no sul de Minas, tem 454 km e atravessa Pouso Alegre, Poços de Caldas e Itajubá. O grupo, formado pelas empresas Equipav e Perfin, será responsável pela operação, manutenção, ampliação da capacidade e melhoria do nível de serviço dos trechos do sistema rodoviário pelo prazo de 30 anos. Os contratos somam 1.081,7 km e têm investimentos previstos de R$ 5,5 bilhões para duplicações, acostamentos, adequação de pontes e viadutos, além de R$ 4,8 bilhões em serviços para os usuários, como ambulância e socorro mecânico 24 horas por dia. Outros quatro lotes poderão ser concedidos pelo governo de Minas Gerais nos próximos meses.

Em São Paulo, em fevereiro, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), qualificou 15 projetos de concessões e de Parcerias Público-Privadas (PPPs) no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos de São Paulo (PPI-SP). Trechos de rodovias que cortam o Estado também passarão por estudos nos próximos meses para averiguar a viabilidade de concessão. Parte dos lotes que serão avaliados é referente às estradas que cortam o litoral paulista, com investimentos estimados em R$ 3 bilhões. Uma parcela dos investimentos será destinada à rodovia Rio-Santos (SP-055), uma das afetadas pelas recentes chuvas intensas com consequentes deslizamentos de terra. O trecho a ser concedido contemplará do entroncamento com a Mogi-Bertioga até o porto de São Sebastião e da praia de Martin de Sá até a rodovia Oswaldo Cruz, com um total de cerca de 135 km de extensão. Além disso, outros 1,8 mil km de vias no interior poderão ser leiloados para a operação, manutenção e realização de investimentos pela iniciativa privada, incluindo as atuais concessões da ViaOeste e Renovias, podendo chegar a R$ 25 bilhões de investimento.

Ainda na área estadual, o governo do Pará licitou, em meados deste mês, sua primeira concessão de rodovia, de 526 km, de Marabá (no sul do Estado) até Ananindeua (norte do Estado). Só o consórcio Conquista do Pará, de quatro empresas (Encalso, XConata, Infracon e OCC), participou. Os investimentos previstos em obras são de R$ 3,7 bilhões ao longo de 30 anos.

Em mobilidade urbana, o governo paulista estuda a concessão das Linhas 10, 11, 12, 13 e 14 da CPTM e de linhas atualmente operadas e em estudo para implantação e/ou expansão pelo metrô. O mais ambicioso projeto, no entanto, é a criação do sistema de Trem Intercidades (TIC), que prevê a criação de uma rede ferroviária regional com quatro linhas a partir da capital para o transporte regular de passageiros a Campinas, Sorocaba, São José dos Campos e Santos. Os investimentos são estimados em R$ 69 bilhões. O TIC para a região metropolitana de Campinas envolveria ainda a concessão da Linha 7 de trens na cidade de São Paulo, já operacional.

Os projetos coincidem com uma mudança no mercado financeiro, com a alteração da política monetária nos Estados Unidos, a quebra dos bancos Sillicon Valley e do Signature Bank e das recuperações judiciais no Brasil de Lojas Americanas e Oi. Para Henriques, do banco Fator, vale separar os projetos em dois grandes blocos. “Os projetos recém-licitados, em que o privado não realizou as devidas captações de recursos, devem sofrer com a restrição de recursos disponíveis e a elevação das taxas a valores mais altos em relação às previstas inicialmente, o que tende a gerar redução dos ganhos por parte dos investidores. Porém o mercado ainda trabalha com a situação de inviabilidade ou devolução dos projetos recém-licitados. Do outro lado estão os projetos que devem ir a mercado e deverão contemplar sua viabilidade econômico-financeira, incorporar as novas condições do mercado e, portanto, serem licitados com taxas de retorno mais elevadas como forma de compensar a piora no cenário de crédito.”