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Opinião – Indústria ferroviária brasileira, estratégica para o Brasil

06.06.2022 | | Notícias do Mercado

Por Vicente Abate
Presidente da ABIFER - Associação Brasileira da Indústria Ferroviária

 

Instalada no País na primeira metade da década de 1940, com o objetivo de suprir o mercado brasileiro com produtos e serviços nacionais, substituindo importações, naturalmente mais difíceis em tempos de guerra, a indústria ferroviária nacional, desde então, tornou-se estratégica para o Brasil e continua a sê-lo até os dias atuais, ao lado do transporte ferroviário de carga e de passageiros.

Oitenta anos depois, podemos constatar, com imensa satisfação, os avanços que nossa indústria experimentou ao longo deste tempo, sem deixar de comentar, à frente, suas dificuldades atuais.

Inovações tecnológicas implementadas por todos os fabricantes e prestadores de serviços foram de grande valia para as ferrovias atingirem um elevado grau de competitividade, devido à produtividade oferecida por estes produtos e serviços, o que colaborou para aumentar sua eficiência na operação.

As ferrovias também contribuíram para tal, na medida em que seu corpo técnico sempre esteve alinhado com o da indústria, discutindo os projetos desde a sua concepção e realizando as necessárias evoluções, sempre em busca da maior eficácia e com o menor custo.

Uma ampla gama de vagões de carga foi projetada e fornecida, de forma customizada, para atender especificamente a cada tipo de produto transportado, privilegiando o aumento da carga útil e com sensíveis melhorias nos sistemas de carga e descarga, inclusive de forma remota, com o vagão em movimento. Sabendo-se que as condições da via permanente em algumas ferrovias brasileiras não são as melhores, devido ora à sua deterioração orgânica, outras vezes por seu traçado mais que centenário, a utilização de softwares especiais permitiu o desenvolvimento de truques cada vez mais capazes, concebidos também para contornar as imperfeições da via e diminuir o desgaste de seus componentes e os do sistema de choque e tração.

São exemplos, os vagões double stack, os graneleiros, para minérios e, mais recentemente, os vagões total sider, para transporte de celulose.

Já nas locomotivas, a evolução se deu de várias formas, através do desenvolvimento de motores de corrente alternada, que reduzem o consumo de combustíveis, aliando-se à disponibilidade nacional de combustíveis alternativos, desde o biodiesel, passando pelo gás natural liquefeito, ambos adicionados ao diesel convencional, até chegarmos às locomotivas elétricas 100% a bateria (Carbono Zero), uma realidade no Brasil desde 2020, para, num futuro próximo, chegarmos à tração pelo hidrogênio verde. Ou seja, além da redução do consumo de um item classe A nos custos de uma concessionária, as locomotivas hoje emitem cada vez menos gases e particulados, nocivos ao meio ambiente. A avançada digitalização embarcada nas locomotivas foi outra inovação trazida por seus fabricantes, que, além dos benefícios já expostos, contribuíram para o controle da operação em tempo real, de forma eficiente e segura.

Nos trens de passageiros, de variados tipos, sejam para metrô, de superfície, monotrilho, VLT ou aeromóvel, os fabricantes nacionais trouxeram o estado da arte em tecnologia, proporcionando segurança e conforto aos passageiros, além dos benefícios às operadoras na redução de seus custos de tração, através também de motores de corrente alternada, que reduzem o consumo de energia elétrica, além da tração pneumática e diesel-hidráulica, realidades nacionais, e da futura tração a hidrogênio verde. Sem deixar de mencionar as exportações, já contratadas à indústria nacional, para os metrôs de Bucareste, Taipei e Santiago, além do fornecimento de trens às operadoras nacionais de metrô e de trem de superfície. Nossa indústria espera também, ansiosamente, pelo Edital do TIC – Trem Inter Cidades, entre São Paulo e Campinas, a ser lançado pelo governo, possivelmente, ainda neste ano.

A cadeia produtiva de nossa indústria é composta ainda por fabricantes de materiais e equipamentos de via férrea, como máquinas de manutenção e construção de vias, dormentes de concreto, aço, madeira e polímero, aparelhos de mudança de via, grampos e placas de fixação, soldagem de trilhos e por um sem-número de outros componentes fundidos e forjados de aço, como rodas, eixos e sistema de choque e tração, freios, sapatas, molas, que são fornecidos às montadoras dos veículos ferroviários, às concessionárias de carga e de passageiros e destinados à exportação. Fazem parte também de nossa indústria, as empresas prestadoras de serviços de reparação, adaptação e modernização de vagões, locomotivas e trens, de remanufatura de rolamentos e, ainda, de serviços de Engenharia e de Tecnologia da Informação.

Ainda que nossa indústria tivesse apoiado, enfaticamente, as Renovações Antecipadas, as novas Concessões e as recentes Autorizações Ferroviárias, na área de carga, bem como as concessões das operações das linhas de transporte urbano de passageiros à iniciativa privada e a Política Nacional de Transporte Ferroviário de Passageiros – PNTFP, esta indústria amarga, há muitos anos, uma dramática ociosidade, de 80% na fabricação de vagões e locomotivas e de 100% na fabricação de trens, que impactam fortemente suas cadeias produtivas.

Urge, assim, que as encomendas de equipamentos cheguem mais celeremente à indústria ferroviária brasileira, para que ela possa recuperar rapidamente os empregos qualificados que lhe foram subtraídos, forçados pela flagrante ociosidade que elas vivenciam, não de hoje.

Artigo a ser publicado na Revista Sobretrilhos