14.04.2025 | ABIFER | Notícias do Mercado
Fonte: Valor Data: 14/04/2025
Enquanto o governo prepara a nova leva de concessões e autorizações, as empresas do setor ferroviário aceleram projetos que somam milhares de quilômetros de novos trilhos. De Mato Grosso ao litoral baiano, passando pelo semiárido nordestino, os investimentos prometem transformar rotas de escoamento e expandir a malha nacional. A Rumo lidera os aportes, com projeção de aplicar entre R$ 5,8 bilhões e R$ 6,5 bilhões neste ano em obras que vão da ampliação de terminais portuários à construção de novos trechos ferroviários.
A empresa está aumentando a capacidade da Malha Paulista, corredor logístico entre Rondonópolis e Santos (SP). Alguns trechos foram separados para o governo do Estado de São Paulo implantar o Trem Intercidades entre a capital paulista e Campinas. Em parceria com a operadora DP World, de Dubai (Emirados Árabes Unidos), e a cooperativa norte-americana CHS, a Rumo investe R$ 2,5 bilhões na construção de um novo terminal portuário de uso privado em Santos.
A Vale está construindo o primeiro trecho da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico), uma das contrapartidas da antecipação da prorrogação do contrato da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM). Seu objetivo é escoar a produção de soja de Mato Grosso para os portos de São Luís, Santos e Paranaguá (PR). A obra deve ser concluída no primeiro trimestre de 2028. Em fevereiro, a mineradora começou a operar em fase de testes os 34 vagões de passageiros da nova frota na EFVM e, a partir de 2026, vai ampliar as viagens de passageiros na alta temporada.
Em janeiro, a VLI finalizou a captação de R$ 1 bilhão via emissão de debêntures e se prepara para investir na Ferrovia Centro-Atlântica (FCA). Os recursos serão utilizados para modernização da via permanente, na construção e modernização de pátios e em melhorias no material rodante. “Essa captação nos prepara para fazer novos investimentos na FCA, assim que ocorrer a renovação da concessão, esperada para 2026”, diz Fábio Marchiori, diretor-presidente da VLI.
A Ultracargo avança em projetos como os desvios ferroviários nos terminais de Rondonópolis (MT) e Paulínia (SP), além da expansão da capacidade em Rondonópolis e da inauguração do novo terminal em Palmeirante (TO), previsto para 2025. “Essas conexões vão reduzir os custos e as emissões de carbono, além de desenvolver as regiões produtoras de etanol e biodiesel”, diz Fulvius Tomelin, vice-presidente comercial e de novos negócios da Ultracargo.
Dois estudos técnicos divulgados em março aprofundaram as críticas à viabilidade socioambiental da Ferrogrão. Um deles, elaborado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Instituto Socioambiental (ISA) e Observatório do Clima, aponta que o Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA), atualizado em 2024, ignora os impactos cumulativos do projeto. Segundo os autores, a ausência dessa avaliação compromete a capacidade do governo de tomar decisões estratégicas com base em riscos reais à floresta, aos povos indígenas e à dinâmica fundiária. “Transferir essa análise para o futuro processo de licenciamento equivale a não fazê-la”, conclui o parecer.
O segundo estudo, assinado por pesquisadores e organizações da sociedade civil, analisa o EVTEA sob o ponto de vista da governança territorial. “O traçado avança sobre áreas de altíssima vulnerabilidade socioambiental, estimulando práticas ilegais de ocupação e desmatamento”, afirma o advogado Melillo Dinis do Nascimento, que representa o Instituto Kabu, do povo Kayapó Mekrãgnoti, e a Rede Eclesial Panamazônica. A análise aponta a exclusão de diversas terras indígenas da área de influência do projeto e a ausência de “consulta livre, prévia e informada” aos povos potencialmente afetados, um direito estabelecido pela Constituição e pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A Estação da Luz Participações (EDLP), responsável pelo EVTEA, sustenta que o estudo segue os parâmetros técnicos definidos pelos órgãos reguladores e incorpora dados atualizados sobre demanda, engenharia e aspectos socioambientais. Segundo a empresa, o projeto foi estruturado para minimizar impactos diretos e indiretos, com previsão de programas ambientais para cada etapa da implantação. A estimativa é que a obra trará R$ 62,5 bilhões em benefícios sociais, em valores de hoje. Cada trem irá retirar 422 caminhões da rodovia BR-163, um dos principais eixos de desmatamento do país.
Em resposta às críticas sobre a ausência de avaliação de impactos cumulativos, a EDLP argumenta que essa etapa será realizada durante o licenciamento ambiental. A empresa afirma que o EVTEA tem caráter preliminar e estratégico e que as avaliações detalhadas sobre desmatamento, consulta a comunidades tradicionais e medidas de mitigação serão conduzidas conforme as exigências legais. Diz ainda que o impacto da obra será predominantemente em áreas que já foram desmatadas. A premissa central do EVTEA é que o custo de não fazer a Ferrogrão é maior que o de fazê-la.