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Artigo – A onda de investimentos

12.02.2021 | | Notícias do Mercado

Foto: Pedro França/Agência Senado

Existe uma parte da economia que olha de longe para as agruras do governo em aprovar o Orçamento ou viabilizar a prorrogação do auxílio emergencial: a de infraestrutura. Esse setor vai bem, obrigada, e contribui para empurrar a recuperação econômica com investimento. Não é por acaso que o ministro Tarcísio Gomes de Freitas volta e meia aparece ao lado do presidente Jair Bolsonaro, em lives e entrevistas. Tem notícias positivas a dar.

A falta de soluções para conter o crescimento das despesas obrigatórias tem derrubado os investimentos do governo federal a mínimos históricos. Nesse quadro, concessões são uma alternativa. Em 2021, a pasta liderada por Tarcísio pretende entregar 52 ativos para empresas.

Só em abril, 29 ativos vão a leilão. São 22 aeroportos, entre os quais os de Curitiba, Manaus e Goiânia. Além desses, há cinco terminais portuários, a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) e um conjunto de trechos rodoviários em Goiás e Tocantins, formado pelas BRs 153, 080 e 414. Ao longo do período da concessão, que chega a 30 anos, esses empreendimentos movimentarão R$ 18,5 bilhões em investimentos e gerarão 351.037 empregos diretos, indiretos e pelo efeito-renda, estima a pasta.

Preocupações com o quadro macroeconômico do Brasil pouco aparecem nas conversas dos integrantes do Ministério da Infraestrutura com potenciais investidores, diz a secretária de Fomento Planejamento e Parcerias, Natália Marcassa de Souza. “Estamos falando de projetos de 30 anos, então ninguém espera obter retorno neste ano”, comenta. “O Brasil é um país emergente, que precisa de infraestrutura e tem uma demanda interna consistente.” As indicações são de que haverá interessados em todos os leilões.

O leilão da BR-153 tem um valor simbólico. Esse trecho de rodovia integra um conjunto de concessões feitas no governo Dilma Rousseff, a chamada Terceira Etapa, que fracassaram por causa da recessão e da Lava-Jato. A BR-153 foi a primeira do grupo a voltar para as mãos do governo, por descumprimento do contrato. Outras rodovias e o aeroporto de Viracopos seguiram o mesmo caminho.

Para a volta da BR-153 ao mercado, foram feitos ajustes que buscam contornar os problemas que levaram as concessões da Terceira Etapa ao fracasso. O principal é o critério de vencedor do leilão. Será aquele que concordar em cobrar o pedágio mais barato, como nos empreendimentos já leiloados. Porém, haverá um limite para o desconto. Se houver empate, vencerá aquele que concordar em pagar a maior taxa de outorga ao governo para ficar com a concessão.

Os leilões da Terceira Etapa foram marcados por deságios muito grandes, na casa dos 50%. As tarifas muito baixas, porém, não foram capazes de manter as as finanças da concessão equilibradas, porque logo em seguida veio a crise e as projeções de movimento na rodovia foram por água abaixo. Nesse quadro, o BNDES não deu os empréstimos com as quais as concessionárias contavam.

O fato de a maior parte delas ser lideradas por grandes construtoras que eram alvo da Lava-Jato não ajudou. À boca miúda se diz no governo que as empresas tinham expectativa de elevar as tarifas de pedágio com a ajuda de suas redes de contato no alto escalão.

Além desse conjunto de concessões federais, está prevista para abril a privatização da Cedae, de responsabilidade do governo do Rio de Janeiro. São no mínimo R$ 10,6 bilhões em outorga e R$ 31 bilhões em investimentos.

Todo esse conjunto deverá dar força ao discurso do ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre a necessidade de mudar o motor da recuperação econômica. Se no fim de 2020 foi o consumo, impulsionado pelo auxílio emergencial, agora é necessário mudar para um modelo mais sustentável, ancorado em investimentos do setor privado.

Na lista de 35 prioridades legislativas do governo há outros itens que ajudam a melhorar o ambiente para os investimentos. Por exemplo, o projeto de lei que muda as regras para debêntures de infraestrutura. Permite que uma concessionária emita títulos no mercado externo para se financiar. E dá a ela um prazo mais longo para iniciar os investimentos. Além disso, dá incentivos tributários para que a emissora possa oferecer retornos maiores e com isso atrair mais recursos, principalmente de pessoas jurídicas.

Para o Ministério da Infraestrutura, é importante também a aprovação do projeto de lei que muda regras para pedágios. O governo quer, nas novas concessões, permitir que seja cobrada tarifa por distância percorrida, o chamado “free flow”. E punir de forma mais severa a evasão dos pedágios, entregando o produto das multas às concessionárias.

Entre as prioridades está ainda o projeto de lei que permite a construção de ferrovias por meio de autorização, e não mais de concessão. É a transposição do modelo adotado para portos em 2013, que fez crescer o número de terminais privados. Vai beneficiar principalmente trajetos curtos que vão, por exemplo, conectar uma determinada empresa a uma ferrovia próxima.

Há um longo caminho a ser percorrido para que os investimentos que estão no horizonte se convertam numa onda e tragam para cá parte dos recursos externos mal remunerados que estão em busca de boasoportunidades. Para que venham para o Brasil mais investidores e mais capital do que se vê hoje.

Guedes já foi cobrado, em conversa com investidores estrangeiros, pela complexidade do sistema tributário brasileiro e pela insegurança jurídica. Foi questionado também quanto a um mecanismo de proteção contra perdas dos investidores diante da instabilidade do câmbio. Um integrante da equipe econômica reconhece, além do mais, que os investidores não virão para o Brasil se houver uma perspectiva de calote mais adiante. Mesmo fora do centro das conversas com os técnicos do Ministério da Infraestrutura, a questão fiscal paira principalmente sobre as decisões de financiamento.

Se a já confirmada prorrogação do auxílio emergencial vier num formato que aponte para a irresponsabilidade nas contas públicas, muitos investidores ficarão esperando uma nova administração que ofereça melhor perspectiva. É disso que se trata.

 

Fonte: Valor

Data: 12/02/2021