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Empreendimentos de transporte público são financiados pelo Governo Federal sem estudos adequados, diz TCU

12.03.2021 | | Notícias do Mercado

O que se vê no Brasil são exemplos de monotrilhos sendo colocados em traçados que necessitariam de metrô pela alta demanda, de escolha de trilhos onde ônibus dão conta ou de sistemas de ônibus onde trilhos são necessários

 

Pilastra de monotrilho em São Paulo

O Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), do Governo Federal, não realiza de maneira adequada a avaliação de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental (EVTEA) para os empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade que financia, como corredores comins de ônibus, BRTs (Bus Rapid Transit), trens, VLTs (Veículos Leves sobre Trilhos), monotrilhos e sistemas de Metrô.

A conclusão é de uma auditoria feita pelo TCU (Tribunal de Contas da União) que apontou que “há risco de o governo federal estar financiando empreendimentos desalinhados com os planos municipais de mobilidade urbana e com os planos de desenvolvimento urbano integrado, além de não serem viáveis do ponto de vista técnico, econômico ou ambiental. Consequentemente, ocorre alocação ineficiente de recursos públicos e, na maioria das vezes, atrasos e paralisações de obras.”

Na prática, podem estar sendo escolhidos sistemas de ônibus ou de trilhos inadequados para as demandas previstas de passageiros, com erros de projeto, no traçado, nas formas de contratação e custos além dos necessários, como diz parte da nota do TCU.

“As obras financiadas sem os estudos podem ainda não apresentar a melhor solução em termos de custo/benefício, não serem suficientemente maduras ou ainda não serem viáveis do ponto de vista técnico, econômico ou ambiental”.

O TCU diz que procurou saber se as análises de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade condizem com os princípios e as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana e com os referenciais que abordam o tema.

A conclusão não foi positiva.

Para o órgão de contas, o Ministério não faz as análises de forma criteriosa e não possui normas ou manuais que regulem as rotinas e os procedimentos voltados para a apresentação desses estudos por estados e municípios.

Segundo o acórdão do TCU, cujo relator é o ministro Vital do Rêgo, uma das principais causas para a ausência de análise dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental é que o Ministério do Desenvolvimento Regional tem “deficiências na estrutura”, como indisponibilidade de equipe técnica qualificada e falta de normativo que regulamente os procedimentos de avaliação.

Na prática, além de escolher meios de transportes inadequados e mais caros, a condição de mobilidade das pessoas não vai melhorar, pelo contrário, em médio ou longo prazo, um sistema escolhido, projetado ou construído sem ser condizente à necessidade da demanda piora a situação porque muitas vezes impede a implantação posterior de um sistema melhor.

Esse empecilho se dá porque tecnicamente pode ser quase impossível desmontar um meio de transporte para construir outro e porque já foi gasta uma grande quantia em dinheiro e os recursos são limitados.

O que se vê no Brasil são exemplos de monotrilhos sendo colocados em traçados que necessitariam de metrô pela alta demanda, de escolha de trilhos onde ônibus dão conta ou de sistemas de ônibus onde trilhos são necessários.

O TCU assim determinou que o ministério estabeleça “critérios mínimos para a avaliação e a manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos EVTEA dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade a serem contratados.”

A unidade técnica do TCU responsável pelas fiscalizações foi a Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Urbana.

Adamo Bazani, jornalista especializado em transportes

Veja o acórdão na íntegra:

Número do Acórdão

ACÓRDÃO 408/2021 – PLENÁRIO

Relator

VITAL DO RÊGO

Processo

037.580/2018-3

Tipo de processo

RELATÓRIO DE AUDITORIA (RA)

Data da sessão

03/03/2021

Número da ata

6/2021 – Plenário

Interessado / Responsável / Recorrente

3. Responsáveis: Rogério Simonetti Marinho (***.011.294-**); Tiago Pontes Queiroz (***.932.574-**).

Entidade

Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR).

Representante do Ministério Público

Não atuou.

Unidade Técnica

Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Urbana (SeinfraUrbana).

Representante Legal

não há.

Assunto

Auditoria operacional realizada com o objetivo verificar em que medida as análises acerca da viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade são suficientes e aderentes aos princípios e diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, bem como em referenciais que abordam o tema.

Sumário

AUDITORIA OPERACIONAL. TRANSPORTES PÚBLICOS DE MÉDIA E ALTA CAPACIDADE. ANÁLISES DE VIABILIDADE TÉCNICA, ECONÔMICA E AMBIENTAL. DESCONFORMIDADE COM A POLÍTICA NACIONAL DE MOBILIDADE URBANA. DETERMINAÇÃO. RECOMENDAÇÃO.

Acórdão

VISTOS, relatados e discutidos estes autos que tratam de auditoria realizada no Ministério do Desenvolvimento Regional com o objetivo verificar em que medida as análises acerca da viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade são suficientes e aderentes aos princípios e diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, bem como a referenciais que abordam o tema;

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, ante as razões expostas pelo Relator, em:

9.1. determinar ao Ministério do Desenvolvimento Regional, com fundamento no art. 43, inciso I, da Lei 8.443/1992, c/c art. 250, inciso II, do Regimento Interno do Tribunal de Contas da União, e nos arts. 2º, inciso I, e 4º, inciso II, da Resolução-TCU 315/2020, e com base nos arts. 6º, inciso IX, e 116 da Lei 8.666/1993, arts. 19, 20 e 21 da Portaria Interministerial 424/2016, e arts. 5º, inciso II, e 6º, inciso VIII, da Lei 12.587/2012, que:

9.1.1. no prazo de 150 dias, estabeleça critérios mínimos para a avaliação e manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade a serem contratados nos instrumentos de repasse federais bem como nos de financiamento da União, alinhando-os à Política Nacional de Mobilidade Urbana e aos planos de mobilidade urbana, planos diretores urbanos e planos de desenvolvimento urbano integrado, considerando a viabilidade durante todo o ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a operação dos empreendimentos;

9.1.2. após o estabelecimento desses critérios mínimos, abstenha-se de celebrar instrumentos de transferências de recursos federais, bem como de financiamentos, cujos projetos não contenham devida avaliação do EVTEA, acompanhada de manifestação conclusiva sobre sua suficiência e adequação;

9.2. recomendar ao Ministério do Desenvolvimento Regional, com fundamento no art. 43, inciso I, da Lei 8.443/1992, c/c art. 250, inciso III, do Regimento Interno do Tribunal de Contas da União e nos arts. 2º, inciso III, e 11 da Resolução-TCU 315/2020, além dos arts. 5º, inciso II, 6º, inciso VIII, e 16, incisos IV e VI, da Lei 12.587/2012, que, ao estabelecer os critérios mínimos de avaliação e de manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade, considere:

9.2.1. a estrutura básica apresentada na Seção V do relatório de auditoria, feita com base em técnicas de comparação com referenciais;

9.2.2. a possibilidade de participação externa ao MDR para realizar essa atividade;

9.2.3. a necessidade de elaboração de normas e manual de procedimentos;

9.3. autorizar a unidade técnica a proceder ao monitoramento das determinações e recomendações constantes dos subitens anteriores;

9.4. dar ciência desta decisão ao Congresso Nacional, por meio da Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara dos Deputados, informando-a acerca da importância de criação de normas que passem a exigir a elaboração e avaliação de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade, de modo a tornar mais eficiente a alocação de recursos federais nas obras dessa tipologia que requeiram financiamento público; e

9.5. dar ciência desta decisão à Caixa Econômica Federal e ao Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) .

Quórum

13.1. Ministros presentes: Ana Arraes (Presidente), Walton Alencar Rodrigues, Benjamin Zymler, Aroldo Cedraz, Raimundo Carreiro, Bruno Dantas, Vital do Rêgo (Relator) e Jorge Oliveira.
13.2. Ministro-Substituto convocado: Marcos Bemquerer Costa.
13.3. Ministros-Substitutos presentes: Augusto Sherman Cavalcanti, André Luís de Carvalho e Weder de Oliveira.

Relatório

 

Adoto aqui o relatório elaborado no âmbito da Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Urbana (peça 33) , cujas propostas contaram com a anuência dos dirigentes daquela unidade técnica (peças 34 e 35) , transcrito a seguir com os ajustes de forma pertinentes:

I. INTRODUÇÃO

I.1. Contextualização

Trata-se de auditoria de natureza operacional com o objetivo de verificar em que medida as análises acerca da viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade são suficientes e aderentes aos princípios e diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, bem como em referenciais que abordam o tema, possibilitando a contratação, a entrega e a operação de empreendimentos viáveis do ponto de vista técnico, econômico e ambiental.

A Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional e Urbano (SMDRU/MDR) e¿ a responsável por formular e implementar no Brasil uma política de mobilidade urbana que proporcione o acesso universal a¿ cidade, de forma segura, socialmente inclusiva e sustentável. Já os estados e municípios são os entes responsáveis pela organização e prestação, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, dos serviços de transporte coletivo, que tem caráter essencial.

Ao longo dos anos, a SMDRU/MDR vem apoiando diversas ações por meio de transferências voluntárias e empréstimos com recursos do FGTS de forma a dar suporte aos entes subnacionais para a implementação de transportes públicos de média e alta capacidade, uma vez que, geralmente, esses empreendimentos possuem um custo superior a¿ capacidade de endividamento ou de autofinanciamento destes entes. Tal direcionamento, inclusive, encontra amparo no art. 16, inciso IV, da Lei 12.587, de 3 de janeiro de 2012, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, em que atribui a¿ União fomentar a implantação de projetos de transporte público coletivo de grande e média capacidade nas aglomerações urbanas e nas regiões metropolitanas.

Ainda assim, verifica-se que muitas cidades no Brasil possuem dificuldades para implementar suas redes de transporte público de média e alta capacidade em escala e ritmo suficientes para acompanhar o crescimento da população urbana, o desenvolvimento econômico e a necessidade de implantação de modais de transporte público mais equilibrados ambientalmente. Um problema sistêmico apontado em diversas auditorias do TCU e¿ a carência, em termos de planejamento urbano, de alinhamento entre os projetos propostos e os planos diretores, de mobilidade e metropolitanos, bem como em relação às necessidades da população. Além disso, constata-se a ocorrência de contratação de empreendimentos com insuficiência de estudos técnicos e econômicos que abordem os projetos em seus ciclos de vida desde a concepção, passando pela construção até a operação, o que pode levar a empreendimentos que não atendam a demanda projetada e com problemas operacionais e de custeio que poderiam ter sido tratados ou identificados nos estudos iniciais.

I.2. Metodologia

A presente auditoria operacional sobre a mobilidade urbana e¿ decorrência do Despacho exarado pelo Ministro Relator Vital do Rêgo, no âmbito do processo de planejamento do controle TC Processo 033.818/2018-5.

Os trabalhos foram realizados em conformidade com as Normas de Auditoria do Tribunal de Contas da União e com observância ao Manual de Auditoria Operacional do TCU. A equipe foi composta por integrantes da Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Urbana e o desenvolvimento dos trabalhos contou com o apoio da Secretaria de Métodos e Suporte ao Controle Externo (Semec) deste Tribunal. A supervisão da Semec teve o objetivo de otimizar os recursos empregados na execução da auditoria operacional, bem como de mitigar riscos de detecção em auditoria.

Na fase de planejamento, foram realizadas, primeiramente, pesquisas na legislação, na jurisprudência, na bibliografia relativa ao setor e em artigos e trabalhos técnicos publicados na imprensa, por órgãos públicos federais ou disponíveis na internet. Em sequência, foram realizadas entrevistas com gestores da atual Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional e Urbano do Ministério do Desenvolvimento Regional (SMDRU/MDR) .

Importante lembrar a realização da auditoria nos controles internos nas secretarias finalísticas do então MCidades (atual MDR com a fusão, em janeiro de 2019, do MCidades com o antigo Ministério da Integração Nacional) , incluindo a Semob (atual SMDRU) , auditoria que, em razão de sua amplitude nos processos de trabalho do ministério, foi objeto de análise desta equipe para melhor delimitação do escopo da atual fiscalização.

Em razão do tempo decorrido daquela auditoria bem como das mudanças na pasta ministerial, a equipe deste trabalho avaliou ser necessário revalidar os eventos de risco da matriz de eventos (TC Processo 031.563/2016-3, peça 99) que não foram priorizados no escopo daquela fiscalização.

Dos doze eventos de risco, cinco integraram o escopo daquela auditoria, TC Processo 031.563/2016-3, peça 104, p. 111 (tabela 2 abaixo) . Assim, esta equipe reavaliou os outros sete eventos de riscos. A revalidação contou com a colaboração de seis auditores do TCU, não participantes desta fiscalização, com experiência junto às secretarias finalísticas do MDR, mais seis servidores do MDR, entre gestores da SMDRU/MDR e servidores do controle interno do órgão.

Solicitou-se que os doze participantes avaliassem, com base na escala de impacto e probabilidade, suas notas acerca de suas percepções de risco baixo (0-9,99) , médio (10-39,99) , alto (40-79,99) e extremo (80-100) , conforme modelo apresentado no Referencial Básico de Gestão de Riscos do TCU, p. 28, para cada um desses sete eventos de risco. Ao final, obteve-se as seguintes médias, conforme tabela 1 abaixo:

Tabela 1 – Revalidação dos eventos de risco não escopo da auditoria dos controles internos em 2017

Evento Evento 3 Evento 5 Evento 6 Evento 8 Evento 10 Evento 11 Evento 12
Avaliação média 34,08 42,25 41,25 39,42 26,92 56,42 45,33
Risco Médio Alto Alto Médio Médio Alto Alto

Fonte: equipe de auditoria

Após o resultado dessa revalidação, a equipe comparou esses valores com a avaliação dos eventos de risco que integraram o escopo da auditoria dos controles internos. Esses eventos de risco tiveram sua medição à época, conforme segue:

Tabela 2 – Avaliação dos eventos de risco, escopo da auditoria dos controles internos em 2017

Evento Evento 1 Evento 2 Evento 4 Evento 7 Evento 9
Avaliação média 80 64 64 80 80
Risco Extremo Alto Alto Extremo Extremo

Fonte: Matriz de eventos de risco – auditoria dos controles internos TC Processo 031.563/2016-3

Para se saber o alcance daquele trabalho perante os eventos de risco da tabela 2, foi necessário realizar análise de conteúdo daquele relatório de auditoria e das deliberações contidas no Acórdão 2153/2018-TCU-Plenário.

Ao final dessa avaliação, verificou-se que o evento de risco 2, que se refere à emissão indevida de parecer favorável à seleção de empreendimentos, permanecia ainda com considerável risco para o alcance dos objetivos do SMDRU/MDR, especificamente com relação à adequada seleção de empreendimentos sem viabilidade técnica, econômica e/ou ambiental (primeira consequência relacionada naquela matriz ligada a esse evento) .

Com isso, a equipe de auditoria realizou entrevistas com os gestores do ministério, solicitando informações da carteira de empreendimentos da SMDRU/MDR.

A partir de então, foi elaborada a matriz de planejamento procurando atender ao objetivo do trabalho exposto no primeiro parágrafo desta introdução.

Para validação da matriz de planejamento, a equipe de auditoria realizou em 10/3/2020 painel de referência interno, com representantes da unidade técnica do TCU patrocinadora do trabalho. Destaca-se também que foi agendado um painel de referência externo para discussão da matriz em 17/3/2020, com especialistas e gestores envolvidos no segmento de mobilidade urbana. Todavia, esse painel teve de ser cancelado, tendo em vista a edição da Portaria-TCU n. 146, de 12/3/2020, e a adoção de medidas de mitigação dos riscos decorrentes do novo coronavírus, incluindo a suspensão temporária da realização de eventos coletivos nas dependências do TCU, sem previsão de retorno. Diante do cenário, como medida mitigadora, a equipe optou por enviar a matriz a todos os convidados do painel em 17/3/2020 para comentários e sugestões remotas, contando com algumas contribuições em resposta.

Ainda no planejamento, a equipe reuniu os critérios para avaliação dos objetos selecionados, a partir de dispositivos legais e normativos, análise de bibliografia especializada, incluindo referenciais e estudos sobre a elaboração e a avaliação de EVTEAs de diferentes setores. Por meio desses documentos, a equipe buscou fazer uma leitura dos componentes de EVTEAs mais considerados nesses referenciais e mais pertinentes para os empreendimentos de mobilidade, num estudo consolidado.

Na fase de execução da auditoria, foram realizados procedimentos de análise nos processos administrativos de seleção de empreendimentos de transporte de média e alta capacidade (TMA) solicitados pela equipe ao MDR e foi desempenhada uma análise de planilha contendo os principais empreendimentos de TMA integrantes da carteira da SMDRU/MDR.

A partir das análises empreendidas sobre as respostas recebidas e sobre os processos analisados da carteira de empreendimentos obtida, a equipe elaborou a matriz de achados e realizou painel de referência externo em 9/6/2020, com representantes da unidade técnica do TCU patrocinadora do trabalho, incluindo também representante do gabinete do Ministro-Relator e o coordenador-geral de Controle Externo de Infraestrutura. Participaram desse painel diversos gestores e especialistas de órgãos e entidades atuantes no setor de políticas em mobilidade urbana, como o Ministério do Desenvolvimento Regional (SMDRU; Departamento de Projetos de Mobilidade e Serviços Urbanos) , Caixa Econômica Federal (Gerência Nacional de Padronização e Normas Técnicas de Governo e Gerência Nacional de Produtos de Saneamento e Infraestrutura) , Presidência da República (Secretária Especial de Assuntos Federativos) , Ministério da Economia (Secretaria Especial de Desburocratização) , Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados e Controladoria-Geral da União.

I.3. Escopo e Questões de Auditoria

Conforme já descrito no objetivo da presente auditoria, este trabalho tem por escopo os transportes públicos de média e alta capacidade (TMA) . Estão dentro do conceito de TMA os corredores de BRT, as composições de trem urbano, metrô, monotrilho e veículo leve sobre trilhos (VLT) .

O escopo nos transportes públicos de média e alta capacidade se justifica pela materialidade, risco e relevância. Em relação à materialidade, atualmente a carteira administrada pela SMDRU/MDR aponta um valor total de R$ 15,34 bilhões de apoio federal, entre OGU e financiamento, conforme planilha apresentada pela SMDRU/MDR (peça 15, item não digitalizável) . Sobre o risco, verifica-se que a alta exigência técnica, econômica e ambiental na implementação dos empreendimentos de TMA torna complexa para o gestor público as escolhas das melhores alternativas. Quanto à relevância, cita-se a importância que os transportes públicos de média e alta capacidade possuem para a qualidade de vida da população e para a economia e produtividade das cidades, conforme explorado abaixo na seção II. Visão Geral da Mobilidade Urbana no Brasil.

Para alcançar o objetivo, foram elaboradas as seguintes questões de auditoria:

Questão 1 – As análises acerca dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade verificam a aderência dos projetos aos planos de mobilidade urbana, planos diretores urbanos e, nos casos das regiões metropolitanas, aos planos de desenvolvimento urbano integrado?

Questão 2 – As análises acerca dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade consideram todo o seu ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a sua operação?

Como não escopo da auditoria, podem ser citados todos os outros modais não considerados transporte público de média e alta capacidade, a exemplo das faixas de ônibus convencionais que circulam em vias não exclusivas, compartilhando o mesmo espaço com outros sistemas de transporte.

Também integram o não escopo os empreendimentos de PPP patrocinados por governos estaduais e municipais e financiados em parte com recursos federais, em razão de deliberações do TCU, a exemplo dos Acórdãos 2906/2015 e 1665/2016, ambos do Plenário, no sentido de direcionar a competência para avaliação de EVTEAs de PPP locais aos entes subnacionais, com o devido acompanhamento do respectivo tribunal de contas e do sistema de controle interno competente, cabendo à União uma atuação suplementar, quanto à viabilidade da concessão de apoio federal, que não se confunde com a viabilidade do empreendimento em si. Nesses casos, os órgãos federais devem se certificar de que há EVTEAs elaborados pelos respectivos poderes concedentes, ratificados por suas agências reguladoras, onde houver, e, preferencialmente, certificados pelos respectivos órgãos de auditoria interna e tribunais de contas.

Não obstante, as análises, conclusões e encaminhamentos tratados neste relatório podem também servir como referencial para avaliação de EVTEAs no âmbito dos órgãos estaduais e municipais em futuros empreendimentos de TMAs.

II. VISÃO GERAL DA MOBILIDADE URBANA NO BRASIL

II.1. A Política Nacional e as fontes de recursos para a mobilidade urbana

II.1.1. A Política Nacional de Mobilidade Urbana

A atual Política Nacional de Mobilidade Urbana – PNMU foi instituída pela chamada Lei da Mobilidade Urbana (Lei 12.587/2012) , sendo este o instrumento que identifica as diretrizes, princípios e objetivos com a finalidade de fomentar o desenvolvimento da mobilidade urbana e ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.

O referido normativo veio a atender mandamento preconizado no art. 21, inciso XX da Constituição Federal de 1988: compete à União “instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos”.

A referida determinação constitucional vincula-se ao previsto no art. 182 da Carta Magna: “a política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes”.

A PNMU (art. 24, §1º) exige que os municípios com população acima de 20 mil habitantes ou pertencentes a regiões metropolitanas, além de outros, elaborem e apresentem seu Plano de Mobilidade Urbana (PMU) , considerado “o instrumento de efetivação da Política Nacional de Mobilidade Urbana”.

A melhoria da qualidade dos deslocamentos das pessoas nas cidades brasileiras, com a consequente redução dos custos generalizados, requer investimentos significativos em infraestrutura. Deve-se considerar as externalidades negativas, a exemplo da poluição ambiental, longos períodos desperdiçados nos deslocamentos e custo social dos acidentes, bem como as externalidades positivas, tais como a redução de tempo de viagem para os usuários e cargas e a diminuição do número de acidentes.

O cenário observado, de crescimento urbano desordenado e de deficiências de planejamento, ratifica a necessidade de requalificação da mobilidade urbana nos grandes centros e aglomerados urbanos.

Para atendimento das demandas relativas à mobilidade urbana, o Governo Federal, por meio do atual Ministério do Desenvolvimento Regional – MDR, se estabelece em posição de apoio aos demais entes federados, seja pela destinação direta de recursos orçamentários ou por financiamento com recursos oriundos do FGTS.

A política de apoio tem por objetivo, nos termos das diretrizes estabelecidas na PNMU (Lei 12.587/2.012, art. 6º) , a implantação de infraestrutura de novos sistemas de transporte público coletivo urbano e de expansão e melhorias nos sistemas existentes que contemplem mecanismos de integração intermodal física e tarifária, prioritariamente os sistemas de transporte público coletivo de média e alta capacidade.

II.1.2. Recursos Não Onerosos – destinação direta de recursos do Orçamento Geral da União

Até o fim de 2019, as regras e fundamentos técnicos para Estados, Municípios e Distrito Federal terem acesso aos recursos do OGU – Orçamento Geral da União encontravam-se estabelecidas nos normativos relativos ao Programa 2048 – Mobilidade Urbana e Trânsito (código PPA 2016-2019, Lei 13.249/2016) .

O Programa 2048, a cargo da Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional e Urbano – SMDRU/MDR, e tendo por base as supracitadas diretrizes, estruturava-se para buscar dotar o país de infraestrutura de mobilidade urbana utilizando soluções adequadas e compatíveis com o porte e adensamento populacional, de modo a viabilizar a sustentabilidade dos deslocamentos urbanos. Declarava-se a busca por priorizar o transporte público coletivo sobre o transporte individual motorizado e o não motorizado sobre o motorizado.

 

Tabela 3 – Objetivos vinculados ao Programa 2048 – Mobilidade Urbana e Trânsito

Código Descrição Valor Total previsto no PPA 2016-2019 (mil R$)
574 Apoiar a implantação, expansão e requalificação dos sistemas de mobilidade urbana com soluções acessíveis, sustentáveis e compatíveis com as características locais e regionais, priorizando os modos de transporte público coletivo e os não motorizados e promovendo a integração modal, física e tarifária. 58.504.912,62
584 Implementar a Política Nacional de Mobilidade Urbana promovendo o fortalecimento institucional do setor e o planejamento integrado ao desenvolvimento urbano e territorial 7.109.960,46
591 Promover a Segurança e a Educação para o trânsito, por meio da implementação da Política Nacional de Trânsito – PNT. 367.600,34
Valor Global do Programa 65.982.473,42

Fonte: dados extraídos do PPA 2016-2019.

Ademais, o Programa 2048 – Mobilidade Urbana e Trânsito contemplava as seguintes ações:

Ação 10SS – Apoio a Sistemas de Transporte Público Coletivo Urbano;

Ação 10SR – Apoio à Elaboração de Planos e Projetos de Sistemas de Transporte Público Coletivo Urbano;

Ação 10ST – Apoio a Sistemas de Transporte Não-Motorizados;

Ação 2D47 – Apoio a Medidas de Moderação de Tráfego.

O Manual para Apresentação de Propostas do Programa 2048, em versão aprovada pela Portaria 156/2018-MDR, indicava que as ações nele constantes teriam como objetivo “promover a articulação das políticas de transporte, trânsito e acessibilidade universal a fim de proporcionar a qualificação do sistema de mobilidade urbana das cidades através do acesso amplo e democrático ao espaço, de forma segura, socialmente inclusiva e sustentável”.

Para tanto, o apoio devia se dar na elaboração de projetos e de PMUs e, também, na implementação de intervenções viárias que priorizassem e promovessem os sistemas de transportes públicos coletivo de passageiros, de transportes e circulação não motorizada (passeios, passarelas, ciclofaixas, ciclovias, travessias, sinalização, entre outros) , prevendo a integração entre as diversas modalidades de transportes e de circulação e a implantação do conceito de acessibilidade universal, para incluir na matriz da mobilidade urbana o deslocamento de pessoas com deficiência e com mobilidade reduzida.

Do exposto, frisa-se que a metodologia de enquadramento e seleção dos empreendimentos a serem custeados à conta do OGU encontrava-se estabelecida no Manual de Instruções para Contratação e Execução dos Programas e Ações do Ministério das Cidades (atual MDR) – MICE e no acima referido Manual para Apresentação de Propostas do Programa 2048.

Dos citados manuais, verifica-se que apenas o MICE tem sua aplicabilidade ainda válida no que concerne à metodologia encampada pela SMDRU/MDR.

II.1.3. Recursos Onerosos – Financiamento com recursos oriundos do FGTS

No tocante aos chamados recursos onerosos, a SMDRU/MDR atua na mobilidade urbana disponibilizando os recursos do FGTS para financiamento de empreendimentos selecionados por meio do Programa de Infraestrutura de Transporte e da Mobilidade Urbana – Pró-Transporte, reformulado pela Resolução 848, de 17 de maio de 2017, do Conselho Curador do FGTS, posteriormente regulamentada pela Instrução Normativa 27, de 11 de julho de 2017, do então Ministério das Cidades. As reformulações só têm eficácia para as seleções do programa posteriores a essa instrução normativa e para os contratos de financiamento anteriores a ela quando houver comum acordo entre os agentes financeiros e os mutuários.

De acordo com o item 2 do Anexo I da IN 27, o programa tem por objetivo a promoção da melhoria da mobilidade urbana, da acessibilidade universal, da qualidade de vida e do acesso aos serviços básicos e equipamentos sociais nas cidades brasileiras, por meio de investimentos em sistemas e outras infraestruturas de mobilidade urbana, compatíveis com as características locais e regionais, priorizando os modos de transporte público-coletivo e os não motorizados.

O programa está voltado para o financiamento tanto do setor público como do privado para a implantação e requalificação de sistemas, contribuindo para a promoção do desenvolvimento urbano, econômico e social, bem como para a preservação do meio ambiente, de maneira a garantir o retorno dos financiamentos concedidos e conferir maior alcance social às aplicações do FGTS.

O financiamento pode ser realizado por meio de diversos agentes financeiros credenciados pelo agente operador do FGTS, que é a Caixa Econômica Federal. Há uma exigência de contrapartida mínima de 5% do valor de investimento, o prazo de carência é de até 48 meses e a amortização em até 20 anos.

Conforme informações obtidas no portal da Caixa – Pró-Transporte, são encargos do programa:

a) juros mensais com a taxa nominal anual de 6%, sendo que, para as ações financiáveis do sistema de transporte sobre trilho, a taxa de juros é de 5,5% ao ano;

b) taxa de risco de crédito é definida conforme conceito de risco de crédito emitido pela Caixa para cada operação, limitada a 1% a.a., incidente sobre o saldo devedor do contrato;

c) remuneração da Caixa equivalente a até 2% a.a., incidente sobre o saldo devedor; e

d) tarifas operacionais e de análise.

Havia a previsão de que, a partir de dezembro de 2019, os municípios que não possuíssem Plano de Mobilidade Urbana (PMU) validado ficariam impedidos de obter recursos do Pró-Transporte, exceto para a elaboração do próprio plano. Tal prazo foi estendido para até 12 de abril de 2021, por meio da Medida Provisória n. 906, de 19/11/2019, convertida na Lei 14.000, de 19 de maio de 2020.

Foram incluídas, ademais, algumas possibilidades para recebimento de recursos no Pró-Transporte: desapropriações (até 15%: do valor total do contrato ou das desapropriações totais) ; planos de mobilidade urbana; estudos e projetos executivos; desenvolvimento institucional; transporte ativo; ampliação das modalidades apoiáveis ao Setor Privado.

Para o setor privado, a principal atuação é no ReFrota 17, que visa o financiamento de renovações de frotas de ônibus.

No Avançar Cidades, que se destina ao setor público, existe a divisão dos municípios propositores em dois grupos. O Grupo 1 é regido pela IN 28, de 11/7/2017, que trouxe os critérios de enquadramento e seleção e tem inscrições abertas desde 27/7/2017. Destina-se a municípios de até 250 mil habitantes, o que engloba 5.460 municípios, e pode financiar de R$ 500 mil a R$ 30 milhões. O Grupo 2, por sua vez, é regido pela IN 38, de 6/11/2017, e tem inscrições abertas desde 8/11/2017. Destina-se a municípios de mais de 250 mil habitantes, totalizando 110 municípios, e pode contemplar financiamentos de R$ 1 milhão a R$ 200 milhões.

A figura a seguir mostra o fluxo atual do processo de seleção do programa até a assinatura do contrato de financiamento.

Figura 1 – Fluxo do processo de seleção de empreendimentos

Fontes: IN 27; Apresentação de lançamento do Guia TPC pelo antigo MCidades

II.1.4. Programa de governo gerido atualmente – (PPA) 2020-2023

Consta do atual Plano Plurianual (PPA) 2020-2023, aprovado pela Lei Federal 13.971, de 27 de dezembro de 2019, o programa de governo 2219 – Mobilidade Urbana, sob a responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Regional – MDR.

A diretriz é a “ampliação do investimento privado em infraestrutura orientado pelo planejamento de longo prazo associada à redução da insegurança jurídica”.

O objetivo expresso é no sentido de aprimorar o planejamento, a gestão e a infraestrutura de mobilidade urbana em cidades e regiões, tendo como meta aumentar a taxa de entrega de infraestrutura de mobilidade urbana contratada com apoio financeiro da União de 20,31% para 39,03%.

Tabela 4 – Programa 2219 (PPA 2020-2023)

Esfera Valor 2020 (mil R$) Valor 2021-2023 (mil R$)
Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social 298.000 879.551
Despesas de Capital 298.000 879.551
Recursos Não Orçamentários 11.876.049 18.737.019
Crédito e Demais Fontes 10.961.645 15.569.299
Gastos Tributários 914.404 3.167.720
Total 12.174.049 19.616.570
Valor Global 31.790.619

Fonte: Lei 13.971/2019 (PPA 2020-2023)

II.1.5. Estudo dos dados orçamentários promovido pelo Inesc

O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) conduz o projeto MobCidades – Mobilidade, Orçamento e Direitos, em parceria com dez organizações em diferentes cidades integrantes da Rede Cidades por Territórios Justos, Democráticos e Sustentáveis.

A iniciativa visa fortalecer e fomentar a participação popular na gestão da mobilidade urbana, com foco na garantia do direito à cidade e ao transporte como direito social.

Iniciado em 2017, o MobCidades tem atuado na articulação e capacitação de organizações da sociedade civil para a popularização do conceito de direito à cidade e o monitoramento e atuação política na elaboração das leis orçamentárias. Além disso, os movimentos que o integram têm atuado no levantamento de dados sobre transparência e mobilidade nos municípios, na elaboração de orçamentos nacional e municipais temáticos da mobilidade urbana, na incidência para a regulamentação do transporte como direito social e na discussão da temática mobilidade e gênero.

Em análise do orçamento nacional da mobilidade urbana (documento “Orçamento Temático da Mobilidade Urbana – Nacional”, MobCidades) , o Inesc reuniu dados dos últimos três Planos Plurianuais – PPAs (2008/2011; 2012/2015; e 2016/2019) .

Verificou-se que, na execução do PPA 2008-2011, o valor autorizado (R$ 3,02 bilhões) foi muito superior ao efetivamente pago (2,75 milhões) , da ordem de 0,09% do autorizado, e cerca de quatro vezes maior quando se acrescentam os restos a pagar na análise (R$ 808 milhões) , referente a despesas empenhadas em anos anteriores (INESC, 2019, p. 9) .

No PPA 2012-2015, muito relacionado às obras de infraestrutura para a Copa do Mundo de 2014, o que direcionou maiores investimentos para as cidades sede, também se verificou baixa execução das ações. As suas quatro leis orçamentárias anuais apresentaram recursos autorizados ainda mais vultosos (R$ 14 bilhões) , ou cerca de cinco vezes maior que o PPA anterior. No entanto, quanto aos recursos efetivamente pagos (R$ 1,48 milhões) , observou-se que o comportamento se repetiu, apesar de neste caso o valor pago ser proporcionalmente maior, ou 10,6% do autorizado (INESC, 2019, p. 12) .

Com relação ao PPA em vigor até o final de 2019 (PPA 2016-2019) , o quadro muda bastante, considerando-se o fato de que, desde 2017, convive-se com a emenda constitucional que instituiu novo regime fiscal, impondo um teto para os gastos públicos com base no orçamento do ano anterior, que desde então podem ser reajustados apenas pela inflação. Houve, assim, um achatamento dos recursos destinados à mobilidade urbana com recursos autorizados da ordem de R$ 3 bilhões. No entanto, há um comportamento semelhante em valores absolutos com relação ao valor pago no PPA 2012-2015, estando este praticamente no mesmo montante (INESC, 2019, p. 14) .

De acordo com estudo, verificou-se que, entre os anos de 2008 e 2019, foram executados apenas 14% do que estava previsto nos três PPAs respectivos (valor que não passa dos 39% quando se consideram os restos a pagar na análise, referentes a despesas empenhadas em exercícios anteriores) .

Tabela 5 – OGU (Mobilidade Urbana) – PPAs 2008 a 2019

PPA AUTORIZADO (IPCA) PAGO (IPCA) PAGO + RP Pago (IPCA)
PPA 2008/2011 3.021.022.431,82 2.751.052,86 807.737.913,98
PPA 2012/2015 14.003.916.104,18 1.481.113.454,34 3.365.899.179,63
PPA 2016/2019 2.913.553.664,97 1.208.282.577,98 3.555.168.287,08
TOTAL 19.938.492.200,97 2.692.147.085,18 7.728.805.380,69
% 14% 39%

Fontes: Siga Brasil / MobCidades

A baixa execução orçamentária encontra-se ilustrada nos gráficos abaixo:

Figura 2 – Gráfico comparativo Valores Autorizados x Pagos

Fonte: Instituto de Estudos Socioeconômicos

II.2. Plano de mobilidade urbana (PMU)

O planejamento da rede de transporte urbano de um município se dá através da elaboração do plano de mobilidade urbana, um instrumento da política de desenvolvimento urbano integrado ao plano diretor do município.

O PMU indica as diretrizes, instrumentos, ações e projetos voltados a proporcionar o acesso amplo e democrático às oportunidades que a cidade oferece, através do planejamento da infraestrutura de mobilidade urbana, da logística de distribuição de bens e serviços, da construção e manutenção da infraestrutura viária e da integração entre modos e demais ações interligadas para a melhoria da acessibilidade e da qualidade de vida da população.

Como instrumento de planejamento, gestão e avaliação dos sistemas de mobilidade, o PMU deve contemplar: a identificação clara e transparente dos objetivos de curto, médio e longo prazos e dos meios financeiros e institucionais que assegurem a sua implantação e execução, bem como deve atender aos conteúdos obrigatórios estabelecidos na Lei 12.578/2012.

Sua elaboração é de responsabilidade local e deve ser feita com a participação popular, sendo recomendada a sua aprovação em formato de lei ou decreto municipal, de forma a dar-lhe legitimidade e perenidade diante das periódicas mudanças de governo.

A existência, suficiência e adequação de um PMU está intimamente relacionada à viabilidade dos empreendimentos a serem propostos e posteriormente executados.

A elaboração de um PMU demanda a realização prévia da etapa de diagnóstico da mobilidade urbana, quando se busca coletar, sistematizar e analisar um conjunto de dados específicos dos sistemas de mobilidade urbana, bem como informações relevantes sobre o contexto e a evolução socioeconômica da cidade, a legislação incidente etc.

Um diagnóstico bem elaborado é condição para o estabelecimento de um conjunto de ações regulatórias e projetos de transporte público e não motorizados que a cidade vai implementar para a solução dos problemas identificados.

Em consulta à base de dados da SMDRU/MDR¹, verifica-se que, dos 5.570 municípios brasileiros, dos quais 1.842 estão legalmente obrigados a elaborar um PMU, apenas 321 municípios possuem o referido plano, correspondendo a tão somente 6% do total de municípios.

Figura 3 – Estatística sobre os planos de mobilidade urbana dos Municípios

¹Fonte: https://bit.ly/3dvSjeM

Quando a análise se debruça sobre os municípios legalmente obrigados a elaborarem um plano de mobilidade (Lei 12.587/2.012, art. 24, §1º) , o percentual é de 16%, valor que pode ser considerado muito aquém do desejável, em virtude dos mais de oito anos transcorridos da promulgação da referida lei.

Em pesquisa mais focada desenvolvida pela SMDRU/MDR, realizou-se um levantamento junto a 3.476 municípios, mais o Distrito Federal, solicitando informações sobre a elaboração de seus respectivos planos de mobilidade urbana.

A iniciativa visava apoiar a implantação e monitoramento da evolução da Política Nacional de Mobilidade Urbana e, também, no intuito de dispor de informações para a formulação de políticas públicas para o setor.

Os municípios que compõe o escopo do levantamento são: municípios com mais de 20 mil habitantes (segundo estimativa do IBGE) ; municípios que fazem parte de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e regiões integradas de desenvolvimento econômico; municípios em área de interesse turístico; municípios em área de impacto ambiental; e municípios que participaram de alguma capacitação presencial da SMDRU/MDR.

Primeiramente, cumpre ressaltar que 2.315 (67%) dos municípios consultados responderam ao levantamento. Verificou-se que a taxa de respondentes cresce de acordo com o porte do município e é maior nas regiões Sul (76%) e Sudeste (77%) .

Em coerência com o levantamento conduzido anteriormente, a SMDRU/MDR identificou que 321 municípios (14% dos 2.315 respondentes) declararam possuir o PMU elaborado. Esses 321 municípios correspondem a 37% da população brasileira.

Nos municípios com mais de 250 mil habitantes, a taxa de quem declarou já ter elaborado seu plano de mobilidade é consideravelmente maior (46 municípios – 53% dos respondentes desse porte) . Só estes municípios representam 28% da população de todo o país.

Outro dado relevante indicado pela SMDRU/MDR é que, dos 321 municípios que declararam possuir o plano, 253 deles (79%) estão nas regiões Sul e Sudeste.

A pesquisa também mostra que 839 municípios (36% dos respondentes) declararam possuir PMU ou estar em processo de elaboração dele. O número indica, segundo a SMDRU/MDR, que uma parcela significativa dos municípios teria sido ao menos sensibilizada a elaborar seus respectivos planos. Esses municípios representam 58% da população de todo o país.

Figura 4 – Percentual de municípios que possuem plano de mobilidade urbana por porte de municípios

Fonte: SMDRU/MDR – pesquisa publicada em ago/16; atualização em dez/19 (https://bit.ly/2YBCAGX)

A preocupação com o planejamento na área de mobilidade urbana seria mais perceptível nos municípios com maior número de habitantes, onde os problemas nos deslocamentos cotidianos são mais impactantes.

O levantamento também verificou junto às prefeituras que 239 municípios (74% dos que declararam possuir PMU) informaram que o plano foi aprovado em lei ou em ato normativo. A SMDRU/MDR salientou a possibilidade de os municípios que declararam ter aprovado o plano em lei municipal aprovada pelo Legislativo tê-lo em decreto municipal e, até planos aprovados em lei podem não ter cumprido todo o conteúdo estabelecido no texto da Lei nº 12.587/2012, no entanto, não é detalhado no levantamento qual conteúdo da PNMU os planos podem ter deixado de cumprir.

II.3. Alguns números gerais sobre a mobilidade urbana no Brasil

Sobre a obtenção e divulgação de dados e estatísticas sobre a mobilidade urbana no Brasil, cumpre destacar o relevante papel desempenhado pelo Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP) .

Nesse contexto, o ITDP criou a plataforma MobiliDADOS, tendo como objetivo promover o uso de informações confiáveis nos processos de elaboração, monitoramento e avaliação de políticas de mobilidade e desenvolvimento urbano. Além de indicadores para capitais e regiões metropolitanas, a plataforma oferece acesso a todos os dados brutos utilizados e descreve as metodologias de apuração de cada indicador.

De acordo com a publicação MobiliDADOS em Foco – Boletim 5 – Estatísticas Nacionais e Políticas de Mobilidade Urbana (2019) do ITDP, os dados de tempo de deslocamento casa-trabalho levantados pelo IBGE em todo o território nacional mostram que a maior parte das pessoas que gastam mais de uma hora no deslocamento entre o domicílio e o local de trabalho vivem em regiões metropolitanas (ITDP, 2019, p. 4) .

As regiões metropolitanas concentram metade dos municípios, onde mais de 10% da população gasta mais de uma hora no trajeto casa-trabalho. Entre 2004 e 2015, verifica-se que este percentual cresceu de forma significativa em todas as regiões metropolitanas, exceção feita aos casos de Curitiba, Fortaleza e Belo Horizonte (ITDP, 2019, p. 4) .

Um dos principais motivos para os habitantes das regiões metropolitanas dedicarem longos tempos em deslocamentos é a necessidade de viagens intermunicipais. Nos municípios das regiões metropolitanas monitoradas pela MobiliDADOS, desconsiderando as capitais, 38% das pessoas ocupadas trabalham fora do seu município (ITDP, 2019, p. 4) .

Figura 5 – Percentual de pessoas que gastam mais de uma hora no trajeto casa-trabalho

Fonte: MobiliDADOS utilizando dados do Censo 2010. Boletim 4, p. 4

A coleta de informações por setor censitário permite, ainda, o aprofundamento em avaliações no nível intramunicipal como, por exemplo, a apuração do percentual de pessoas que vivem próximas da infraestrutura de transporte nas cidades e regiões metropolitanas e as desigualdades socioeconômicas nesses territórios (ITDP, 2019, p. 5) .

Destaca-se que, com apenas 30% da sua população próxima de uma estação de transporte de média e alta capacidade, a região metropolitana do Rio de Janeiro ainda é o melhor caso mapeado no Brasil (dados de 2018) (ITDP, 2019, p. 5) .

Com exceção de Salvador e Recife, em todas as outras regiões metropolitanas monitoradas, o percentual de domicílios com renda per capita acima de 3 salários mínimos próximos a uma estação de transporte de média e alta capacidade é duas vezes superior ao percentual de domicílios com renda per capita abaixo de meio salário mínimo. Este padrão de baixa cobertura e alta desigualdade se repete quando se analisa a proximidade em relação à rede cicloviária (ITDP, 2019, p. 5) .

Figura 6 – Infraestrutura de transporte de média e alta capacidade

Fonte: MobiliDADOS. Boletim 4, p. 5

O ITDP conclui, ademais, que, mesmo para quem vive próximo do transporte público mais qualificado, o seu uso não é necessariamente acessível. A Pesquisa de Orçamento Familiar 2017-2018 indicou que 18,1% das despesas de consumo das famílias são destinadas ao transporte. É a primeira vez que o percentual do orçamento destinado ao transporte, como a aquisição e manutenção de veículos e transporte coletivo, é maior que o percentual destinado à alimentação, que foi de 17,5% (ITDP, 2019, p. 7) .

II.4. O Transporte de Média e Alta Capacidade (TMA) nas cidades brasileiras

II.4.1. TMA: conceito e contextualização

De acordo com a publicação MobiliDADOS em Foco – Boletim 4 – O Transporte de Média e Alta Capacidade nas Cidades Brasileiras (2019) do ITDP, os transportes de média e alta capacidade ou TMAs são corredores cuja infraestrutura garante o transporte de grande quantidade de passageiros de forma ágil em áreas urbanas, a partir da prioridade de passagem nas vias (ITDP, 2019, p. 4) .

Os empreendimentos TMA devem atender a algumas especificações básicas, a exemplo daquelas estabelecidas no Padrão de Qualidade de BRT, desenvolvido pelo ITDP, para BRTs, VLTs e monotrilhos. Ainda, pode-se considerar transporte de média e/ou alta capacidade barcas, metrôs e trens que operem inteiramente dentro de uma área urbana contínua com espaçamentos entre estações menor do que cinco quilômetros (excluindo corpos hídricos) . Estes corredores devem atender um intervalo médio máximo de vinte minutos em ambas as direções entre 6h e 22h, além de prever a realização de cobrança tarifária fora das composições (ITDP, 2019, p. 4) .

Conforme o ITDP, não são considerados corredores de TMA: faixas dedicadas ou corredores de ônibus convencionais, veículos em tráfego misto e sistemas de transporte complementares motorizados, coletivos ou individuais, como vans ou táxis (ITDP, 2019, p. 4) .

Sistemas de transporte público de média e alta capacidade são importantes ativos das cidades. Esses corredores se destacam pois são capazes de absorver muitas viagens de forma mais rápida, confiável e prática para seus usuários se comparados aos sistemas de transporte coletivo convencionais (ITDP, 2019, p. 3) .

Por possibilitar o adensamento populacional e de atividades produtivas em seu entorno, esses corredores representam também os potenciais eixos estruturantes para o desenvolvimento urbano de uma cidade ou região metropolitana (ITDP, 2019, p. 3) .

Nas últimas décadas, os investimentos nos sistemas de transporte não foram suficientes para acompanhar o aumento populacional e o espraiamento nas cidades brasileiras. Apesar de investimentos federais com foco em megaeventos, especialmente entre os anos 2010 e 2016, o aumento da infraestrutura representa ainda um acréscimo pequeno e insuficiente se comparado às necessidades para deslocamento da população (ITDP, 2019, p. 3) .

Nesse contexto, grande parcela da população urbana ainda vive longe das áreas atendidas por esses sistemas, principalmente as populações de baixa renda. A baixa capilaridade e integração da rede de transporte público dificulta o acesso às oportunidades, obrigando grande parte da população a enfrentar longos deslocamentos diários para acessar locais de trabalho, serviços e lazer (ITDP, 2019, p. 3) .

Com o objetivo de contribuir com o monitoramento dos sistemas de transporte de média e alta capacidade, o ITDP Brasil mantém um mapeamento de todos os corredores em operação, construção ou planejamento nas cidades brasileiras. O mapeamento é utilizado para estimar a cobertura da população total e suas desagregações por faixa de renda e gênero na plataforma MobiliDADOS, podendo, assim, indicar um conjunto de ações necessárias para aproveitar o potencial da infraestrutura de transporte (ITDP, 2019, p. 3) .

Verifica-se que, atualmente, cerca de 1.100 quilômetros de corredores de transporte de média e alta capacidade em operação passam por 55 cidades do país. O monitoramento de corredores de TMAs realizado pelo ITDP indica que, após décadas de crescimento lento, a extensão de corredores passou por um período de aumento significativo a partir dos anos 2000, não sendo, contudo, suficiente para atender à crescente demanda (ITDP, 2019, p. 4) .

Figura 7 – Transporte de Média e Alta Capacidade (TMA) no Brasil

Fonte: Mapa de TMAs no Brasil. MobiliDADOS. Boletim 4, p. 4

II.4.2. TMA: baixa cobertura de residentes e ritmo insuficiente de investimentos

De forma geral, as redes de média e alta capacidade possuem baixa cobertura da população nas cidades brasileiras. Como já mencionado, a melhor situação encontrada é a da região metropolitana do Rio de Janeiro, com apenas 30% da sua população próxima de uma estação. Não obstante o bom desempenho relativo, a região vem enfrentando situação preocupante, com o fechamento de 22 estações de BRT em 2018 resultante de problemas de evasão de tarifa e de segurança pública. Diante disso, o cenário que se observa atualmente é de redução do percentual de pessoas próximas de estações de transporte na região, colocando em risco um legado importante de investimentos em transporte nos últimos anos (ITDP, 2019, p. 5) .

Os dados consolidados pelo ITDP indicam que, após um período de expansão da infraestrutura de transporte em função da preparação do país para grandes eventos (Copa do Mundo de 2014 e Jogos Olímpicos de 2016) , o ritmo de investimentos desacelerou. Com isso, o percentual de pessoas próximas do transporte de média e alta capacidade voltou a crescer somente em regiões metropolitanas em que melhorias operacionais foram promovidas em estações existentes ou em que obras atrasadas foram inauguradas. A melhoria da operação em sistemas existentes, como a que foi realizada em Fortaleza, aumenta as opções que os usuários têm para utilizar o sistema ao oferecer maior diversidade de horários ou maior frequência do serviço. Dessa forma, o transporte passa a ser mais atrativo (ITDP, 2019, p. 5) .

Figura 8 – TMA: cobertura de residentes no Brasil

Fonte: MobiliDADOS. Boletim 4, p. 5

Conforme já mencionado, em regra, o percentual de domicílios com renda per capita acima de 3 salários mínimos próximos a uma estação de transporte de média e alta capacidade é duas vezes superior ao percentual de domicílios com renda per capita abaixo de meio salário mínimo (ITDP, 2019, p. 6) .

O transporte público coletivo é utilizado para acessar serviços e oportunidades diversas nas cidades. Quando as estações estão localizadas em áreas com altos índices de oportunidades de emprego e serviços, elas se tornam mais atrativas e viáveis economicamente. Na plataforma MobiliDADOS pode-se analisar o percentual de empregos e de estabelecimentos de saúde próximos das estações, avaliando, assim, a localização dos corredores de transportes em relação às principais oportunidades estabelecidas nas cidades (ITDP, 2019, p. 8) .

Figura 9 – Empregos próximos a TMAs

 

 

Fonte: IPEA (2017) apud ITDP. Boletim 4, p. 8

 

Figura 10 – Estabelecimentos de Saúde a TMAs

 

 

Fonte: ITDP (2018) . Boletim 4, p. 9

II.5. Estudos de viabilidade e sua interdependência com os planos de mobilidade urbana

II.5.1. Estudos de Viabilidade

Em auxílio às autoridades municipais quanto à elaboração do PMU, em 2015, o então Ministério das Cidades publicou, por meio da Semob (atual SMDRU) , o Caderno de Referência para Elaboração de Plano de Mobilidade Urbana (PlanMob) , com o objetivo de orientar gestores e lideranças locais sobre diversos aspectos que devem ser considerados para a elaboração destes planos. Ressalte-se que o citado caderno faz referência à análise de viabilidade do projeto.

Cumpre destacar, ademais, que foi publicada pela SMDRU, em 2019, a “Cartilha de apoio à elaboração de Planos de Mobilidade Urbana para municípios com até 100 mil habitantes”, contendo metodologia simplificada.

Segundo consta no PlanMob, a análise de viabilidade das alternativas tem pelo menos dois objetivos diferenciados: (i) proporcionar elementos para que a sociedade e o poder público escolham a melhor alternativa e (ii) atender os requisitos dos agentes de financiamento, a exemplo do BNDES, BID, Bird, para a obtenção dos recursos necessários para empreender as ações propostas no PMU.

Quanto às análises de viabilidade econômica, consta no PlanMob a orientação no sentido de que os projetos “precisam ser comprovados como viáveis simultaneamente sob três enfoques: econômico, social e ambiental” (PlanMob, 2015, p. 160-161) . Esses enfoques sintetizam a perspectiva sustentável que se espera para os planos de mobilidade urbana. Nessa ótica, quatro dimensões devem ser incorporadas aos projetos: (i) avaliação técnica; (ii) avaliação socioeconômica; (iii) avaliação financeira; e (iv) avaliação ambiental. A visão do todo, sob o olhar de várias perspectivas, ou seja, uma visão sistêmica entre essas dimensões é que irá proporcionar a efetiva viabilidade do projeto.

Figura 11 – Critério para Avaliações de Projetos em Mobilidade Urbana

Fonte: PlanMob e “Metodologia para priorização de projetos de infraestrutura em mobilidade urbana com base na configuração urbana e no escalonamento multidimensional” – Tese de Doutorado, UnB; Adriano de Carvalho Paranaíba, 2017)

Ainda, o referido caderno destaca que, “uma vez identificadas as alternativas viáveis, elas devem ser hierarquizadas. Para isso, não é suficiente, muitas vezes, comparar os resultados das avaliações socioeconômicas, havendo necessidade de análises adicionais nas dimensões técnica e ambiental”.

Nesse contexto, cabe destacar exame empreendido por Adriano Paranaíba (2017) em sua tese de doutorado pela Universidade de Brasília, acerca de metodologia para priorização de projetos de infraestrutura em mobilidade urbana:

Contudo, mesmo existindo uma proposta de construção sistêmica entre as dimensões [técnica, socioeconômica, financeira e ambiental], ocorre que as avaliações atuais são feitas sem uma integração de informações, tal qual um check-list para que o projeto atenda às exigências de requisitos para a captação de recursos de agentes de financiamento.

(…)

Estes apontamentos remetem à construção de um cenário que emoldura uma situação precária na tomada de decisão: (i) propostas deficitárias no tocante à viabilidade econômico-financeira dos projetos por parte dos municípios proponentes junto à Semob; e (ii) inexistência de um método claro por parte da Semob na seleção das propostas (grifos acrescidos) . (PARANAÍBA, 2017, p. 18-19)

Segundo o autor, isso expõe, também, a necessidade de incorporação de novos conceitos que complementem a capacidade atual das análises econômico-financeiras. Indica que tais métodos devem considerar a análise de como a cidade disponibiliza o espaço para a mobilidade urbana, indicando como será a sustentabilidade financeira do projeto e, assim, poderão contribuir de forma a aumentar o espectro da avaliação e possibilitar uma sistematização mais equitativa da seleção entre diversos projetos (PARANAÍBA, 2017) .

Acerca das quatro dimensões supracitadas que devem ser incorporadas aos projetos, dimensões essas integrantes do conceito geral de viabilidade, primeiramente o estudo de viabilidade técnica proporciona a definição da exequibilidade do empreendimento. Ele faz a consideração de alternativas de tipos/sistemas de transporte mais adequados diante das condições presentes.

Na avaliação financeira, procura-se identificar se o projeto é autossustentável financeiramente. Na avaliação socioeconômica, de acordo com Paranaíba (2017, 41, apud DALBEM, et al. 2010, p. 90) , o foco é definir se o projeto gera benefícios líquidos para a sociedade, aqui entendidos como os benefícios incrementais causados pelo projeto. Dessa forma, em projeto que capture demanda já atendida por outros meios, deve ser considerado apenas o seu benefício adicional para a sociedade e não a demanda total atendida.

Já o estudo de viabilidade ambiental refere-se ao conhecimento dos impactos ambientais que envolvem um empreendimento. Trata-se de um levantamento das particularidades ambientais de uma área onde se pretende implantar. Tem como objetivo apresentar, analisar e definir as melhores opções de locação para um empreendimento, permitindo que seja selecionada aquela que melhor atende às expectativas econômicas e legais e que proporcione a melhor preservação do meio ambiente.

II.5.2. A interdependência entre planos de mobilidade urbana e os estudos de viabilidade de empreendimentos de transporte público coletivo

Acerca do processo de planejamento de transportes, entende-se que um plano pode ser de longo, médio ou curto prazo, sua duração depende dos recursos disponíveis e dos objetivos que se deseja alcançar e, muitas vezes, da urgência do problema que se deseja resolver.

Buscando por referência publicação da professora Vânia Barcellos Gouvêa Campos, mestre em engenharia de transporte pelo Instituto Militar de Engenharia (Planejamento de Transportes: conceitos e modelos de análise; editora Interciência, 2013) , de uma forma geral, o planejamento da mobilidade urbana compreende as seguintes etapas:

1- Definição dos objetivos e prazos;

2- Diagnóstico dos sistemas de transportes;

3- Coleta de dados;

4- Escolha dos modelos a serem utilizados para avaliação da demanda futura;

5- Alternativas de oferta de transporte;

6- Avaliação das alternativas (custos e impactos) ;

7- Escolha da alternativa;

8- Desenvolvimento do plano de transporte acompanhado de um programa de financiamento;

9- Implementação das alternativas de acordo com um cronograma de desembolso de recursos;

10- Atualização dos procedimentos.

Figura 12 – Fluxograma básico de planejamento de transportes

Fonte: Planejamento de Transportes: conceitos e modelos de análise – Vânia Barcellos Gouvêa Campos (2013)

Nesse contexto, tem-se que as fases de definição dos objetivos e prazos; diagnóstico dos sistemas de transportes; coleta de dados; e escolha dos modelos na avaliação da demanda futura, devem estar contempladas na elaboração do PMU, servindo de base, portanto, para os estudos de viabilidade de empreendimentos específicos.

II.6. Empreendimentos de TMA auditados pelo TCU

II.6.1. Implantação do corredor de transporte BRT (bus rapid transit) e o sistema inteligente de transporte (SIT) na região sul do Município de Palmas/TO (BRT Sul)

A fiscalização por esta Corte de Contas foi realizada no período entre 27/6/2016 e 29/7/2016 e constatou, entre outros, o seguinte indício de irregularidade: estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental (EVTEA) deficiente (TC Processo 018.777/2016-3) .

Quanto à referida deficiência do EVTEA, foram encontradas irregularidades no estudo de demanda, no estudo comparativo de soluções e no estudo de viabilidade econômica. Detectaram-se indícios de inconsistências no estudo de demanda pelos serviços de transporte do BRT, ensejando resultado aparentemente maior do que o real. Além disso, tendo como referência o Manual de BRT disponibilizado pelo Ministério das Cidades, a metodologia para análise de demanda não foi considerada suficiente para embasar a proposta técnica adotada. Ainda, verificou-se que os estudos relativos à comparação de soluções alternativas e à viabilidade econômica do empreendimento não foram suficientemente detalhados.

Diante das conclusões alcançadas pela equipe de auditoria, deliberou o Plenário do TCU nos seguintes termos:

Acórdão 460/2017-TCU-Plenário

9.1. comunicar à Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização do Congresso Nacional que subsistem os indícios de irregularidades graves do tipo IG-P, nos termos do art. 117, § 1º, inciso IV, da então vigente Lei 13.242/2015 (LDO/2016) , sobre o Edital RDC Eletrônico 1/2015 da Prefeitura de Palmas/TO, no âmbito do Termo de Compromisso 0444.024-63/2014, no que concerne aos serviços de regularização ambiental, elaboração de projetos básico e executivo e execução das obras de implantação do corredor de transporte BRT e do sistema inteligente de transporte na região sul de Palmas/TO (BRT Sul de Palmas/TO) , com potencial dano ao erário no valor de R$ 227.580.000,00, especialmente pela necessidade de a Prefeitura Municipal de Palmas/TO adotar a seguinte medida corretiva:

9.1.1. elaborar estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental para a implantação do BRT, na cidade, com a aprovação pelo Ministério das Cidades e pela Caixa Econômica Federal, devendo contemplar análises técnicas e econômicas adequadas e suficientes sobre todo o empreendimento, além de quantificar a demanda por transporte na região a partir da escolha da melhor solução técnica para o atendimento dessa demanda e a quantificação das despesas de operação do empreendimento, em plena consonância com os dados utilizados na referida análise;

(…)

9.3. determinar, com fundamento no art. 250, inciso II, do Regimento Interno do TCU, que, caso pretenda lançar novo edital pelo emprego de recursos federais com idêntico ou semelhante objeto ao do RDC Eletrônico 1/2015, a Prefeitura de Palmas/TO elabore e encaminhe os estudos de viabilidade técnico-econômico-ambiental do empreendimento para a análise do Ministério das Cidades e da Caixa Econômica Federal, com a antecedência mínima de 120 dias da data estimada para a publicação do instrumento convocatório, apresentando sobretudo o competente e atualizado estudo de demanda por transporte público na cidade de Palmas/TO, com a modelagem adequada e suficiente para aferir se há necessidade de expansão da capacidade do sistema de transporte público da cidade, além de, obrigatoriamente, avaliar possíveis alternativas menos onerosas que possam atender à demanda estimada, a exemplo da melhor gestão ou da distribuição de linhas de ônibus, da racionalização de trajetos, da integração física e tarifária, das mudanças urbanísticas que favoreçam o transporte não motorizado, entre outras opções, indicando, inclusive, os dados utilizados para a referida análise; (grifos acrescidos) .

II.6.2. Corredores de Transporte Público Fluvial em Recife/PE

Em auditoria realizada em 2016 pelo TCU (Fiscalização n. 103/2016; TC Processo 008.664/2016-1) no Ministério das Cidades, na Secretaria de Cidades do Estado de Pernambuco (Secid) e na Caixa Econômica Federal (Caixa) , no âmbito do Fiscobras 2016, tendo como objeto as obras de implantação dos Corredores de Transporte Público Fluvial da cidade de Recife/PE, selecionadas pela Portaria MCidades 185, de 24/4/2012, cujo Termo de Compromisso 0413.177-60/2013/MCidades/CAIXA foi firmado em 18/11/2013, um dos achados de auditoria referiu-se à gestão irregular do empreendimento, com a consequente paralisação das obras, tendo como uma das causas principais a falta de comprovação de viabilidade econômica do empreendimento.

O estudo de viabilidade do transporte fluvial como parte integrante do Sistema de Transporte Público de Passageiros da Região Metropolitana do Recife – STPP/RMR, confeccionado em maio de 2011, evidenciava que, historicamente:

(…) o projeto tornava-se inviável, pois o transporte público teria que viabilizar todos os projetos de recuperação da infraestrutura física de saneamento, macrodrenagem, acessos e mobilidade necessários para dar ao rio a condição ambiental necessária. (TC Processo 008.664/2016-1; peça 56, p. 15) .

Nas premissas utilizadas na análise de viabilidade econômica, considerou-se, como investimento inicial, apenas a aquisição das embarcações e do centro de controle e, consequentemente, a razão custo/benefício foi de 1,08 e a taxa interna de retorno de 16%.

Dessa forma, os investimentos de infraestrutura relativos à dragagem do rio, sinalização náutica, construção dos píeres, das estações e do centro de manutenção foram considerados como “fundo perdido”.

Em outras palavras, o custo global inicial de implantação do empreendimento, no valor de R$ 225.638.822,65, conforme Ofício 674/SEEMOB/SECID, foi desconsiderado na análise de viabilidade econômica. A alegação invocada para isso é a de que este raciocínio já é utilizado no sistema de ônibus, onde o poder público seria o responsável pelo investimento nas vias, na sinalização viária e nos terminais.

Vale dizer, não foi comprovada a viabilidade econômica para desembolso de recursos públicos da ordem de R$ 225.638.822,65 com o objetivo de transportar aproximadamente 10.400 passageiros por dia no Corredor Oeste e 3.000 passageiros por dia no Norte.

Ademais registrou-se que, do ponto de vista social, uma linha de ônibus sem preferência na via pode ter capacidade de transportar quase 18.000 passageiros/hora em dois sentidos, segundo a literatura especializada (cf. NÉSPOLI, Luiz Carlos Mantovani, PINTO, Valeska Peres, VASCONCELLOS, Eduardo Alcântara, ANTP – Gestão da Mobilidade Urbana 2012/2013, Parte II, pág. 84) .

Isso significa que o empreendimento “Corredores de Transporte Público Fluvial da cidade de Recife/PE” possui alto custo de implantação com relativa baixa capacidade de transporte de passageiros, em face de outros sistemas de menor custo (linha de ônibus sem faixa exclusiva) .

Naquele caso concreto, registrou a equipe que o Acórdão 3624/2011-TCU-Segunda Câmara define como irregular a contratação de serviços sem prévios estudos de viabilidade técnica e econômica para justificar a economicidade da contratação.

Outros arestos do TCU também trazem entendimentos no sentido de que iniciar a execução de empreendimentos baseados em informações incapazes de demonstrar sua viabilidade pode configurar atuação desidiosa do gestor, podendo acarretar sua responsabilização (cf. Acórdãos 678/2015, 3.291/2014 e 1.568/2008, todos do Plenário desta Corte) .

A conclusão então alcançada foi de que o estudo, embora tenha sido confeccionado, não demonstrava a viabilidade econômica do empreendimento.

II.6.3. Veículo Leve Sobre Trilhos (VLT) de Cuiabá/Várzea Grande-MT

Em auditoria realizada no ano de 2018 (Fiscalização 133/2018; TC Processo 012.387/2018-5) , o TCU buscou verificar a regularidade dos procedimentos de concessão de financiamentos ao estado de Mato Grosso, relacionados à obra do Veículo Leve Sobre Trilhos (VLT) de Cuiabá/Várzea Grande-MT, em especial, o atendimento das condicionantes para a liberação dos recursos.

No relatório da equipe de auditoria foi dado destaque a trabalhos correlatos realizados pela Controladoria Geral da União – CGU. Em particular, citou-se o Relatório de Fiscalização de Ação de Controle 20134767, por meio do qual a CGU aponta deficiência na atuação dos Gestores do Ministério das Cidades ao aprovar projeto de Mobilidade Urbana no âmbito do programa Pró-Transporte, no que diz respeito à análise da viabilidade econômico-financeira e tarifária do empreendimento.

A CGU informou que o Plano de Mobilidade e Transporte da Região Metropolitana do Vale do Rio Cuiabá previa, em 2011, a implantação de dois sistemas BRTs com viabilidade econômica. Este plano apresentava comparação entre o custo operacional do BRT e do VLT. O custo operacional comparado das duas soluções tecnológicas apontava um custo mensal do VLT de R$ 6.996.198,64 e de R$ 3.514.586,55 para o BRT, ou seja, um custo praticamente duas vezes maior.

O Ministério das Cidades, entretanto, realizou análise na Nota Técnica n. 123/2011/DEMOB/SEMOB/MCIDADES, de 8/9/2011, baseada em informações da então Agência Executora de Projetos da Copa do Mundo – AGECOPA. Por sua relevância, transcreve-se abaixo a análise do Ministério das Cidades:

1. Custo operacional BRT vs VLT: Embora não haja uma abordagem direta à tarifa, são apresentados os custos operacionais de BRT e VLT, com apresentação simplificada das variáveis, parâmetros e valores considerados, no qual o estudo conclui o seguinte:

– Custo operacional mensal do BRT: R$ 3.532.726,00

– Custo por passageiro do BRT: R$ l ,823

– Custo operacional mensal do VLT: R$ 2.282.551,00

– Custo por passageiro do VLT: R$ 0,848

Após realizar uma simplificada comparação das variáveis, parâmetros e valores considerados nos estudos, apresentam-se as seguintes ponderações:

– O custo operacional do BRT inclui a depreciação dos veículos. O VLT não inclui o valor a ser pago mensalmente ao sistema de leasing previsto (conforme já observado anteriormente) ;

– No cálculo do VLT constam apenas as variáveis e alguns parâmetros. Não constam os valores considerados, e está menos detalhado do que os custos do BRT. Portanto, não há como saber o valor específico de itens que compõem os custos como o consumo de energia elétrica e salário dos condutores das composições.

– Alguns parâmetros utilizados no cálculo do custo operacional do BRT estão superdimensionados em relação aos dados de material literário que esta Semob possui, tais como: o fator de utilização de motoristas e do setor de manutenção, e o consumo de lubrificantes.

– Foram identificadas algumas incoerências no que se refere ao dimensionamento da equipe de funcionários, considerando atividades e quantidade de estações semelhantes:

¿ Agentes operacionais e de segurança BRT: 155

¿ Agentes operacionais e de segurança VLT: 79

¿ Equipe de limpeza BRT: 28

¿ Equipe de limpeza VLT: 19

Nestas condições, com estudos mais detalhados do VLT, poderiam ser esclarecidas as diferenças reais entre os dois sistemas.

2. Não foram identificados no material enviado quaisquer necessidades de subsídio público na operação/manutenção do sistema, apenas o fato da participação do Estado na implementação da infraestrutura. Assim, como não há menção de tarifário a ser utilizado no sistema, não há como analisar este aspecto.

(…)

24. Ainda de acordo com os dados deste estudo, o BRT terá menor custo de implantação e o VLT menor custo de operação. No entanto, há necessidade de maior detalhamento para que possa ser realizada comparação.

(…)

26. No entanto, o estudo indica fatores mais favoráveis à implantação do VLT, tais como: menor impacto social (área a ser desapropriada) , menor impacto ambiental local (poluição do ar e sonora) e propiciar maior integração física e segurança por ter menor efeito barreira.

CONSIDERAÇÕES FINAIS E SUGESTÕES DE ENCAMINHAMENTOS

(…)

a) Há probabilidade de aumento no custo total de implementação do VLT nos dois eixos de transporte;

(…)

c) Há poucas empresas no mundo que detêm a tecnologia de VLT, causando possíveis dificuldades na licitação, operação e manutenção do sistema;

d) Considerando os dados apresentados sobre valor da tarifa (R$ 0,80) , deverá ser cobrado estudo mais detalhado, tendo em vista que o valor da tarifa para BRT seria de R$1,39;

e) A Modelagem Operacional do sistema de VLT deverá contemplar também a Gestão Operacional, definindo a participação do Governo do Estado do Mato Grosso e das Prefeituras de Cuiabá e de Várzea Grande; portanto esta questão deverá ser aprofundada e cobrada em monitoramento; e

Considerando tratar-se do Programa Pró-Transporte, para viabilizar novo contrato de financiamento, haverá necessidade de publicação de nova seleção.

Dessa forma, a CGU concluiu que os estudos econômico-financeiros apresentados na fase de seleção da proposta possuíam inconsistências e não traziam uma abordagem direta à tarifa. Assim, não foi apresentado estudo de viabilidade econômico-financeira e tarifária do VLT de modo que contemplasse todas as variáveis.

A CGU informou, ademais, que, em 21/5/2014, o Governo do Estado de Mato Grosso apresentou Relatório Final da Rede Integrada de Transporte Coletivo e o Modelo de Gestão/Concessão do Sistema Integrado de Transporte.

Esse relatório continha estudos da rede integrada, estudos de custos de operação do VLT e uma avaliação global dos efeitos operacionais e econômicos da implantação da rede integrada de transporte coletivo da Região Metropolitana do Vale do Rio Cuiabá, contando com o VLT como eixo estruturador. Nesse relatório, o custo mensal estimado do VLT era R$ 6.155,242,06, e o valor da tarifa, em dezembro de 2012, seria R$ 3,89. Além disso, concluiu-se que a operação do VLT seria deficitária, criando a necessidade de que sua exploração e prestação de serviço fosse em rede, e não como uma operação separada. Assim, a CGU emitiu a seguinte recomendação ao Ministério das Cidades:

Como a operação do VLT ficou demonstrada como deficitária e sem comprovação de viabilidade econômico-financeira e tarifária, recomenda-se aos gestores demonstrar quais as medidas saneadoras serão adotadas para solucionar tal situação; principalmente, deve ser informada a fonte e o volume de recursos (tais como possíveis subsídios) que deverão ser aplicados na operação do VLT para torná-lo viável na esfera econômico-financeira e tarifária.

A obra do VLT de Cuiabá/MT não recebeu aportes do OGU. Entretanto, o empreendimento conta com vultosos financiamentos contratados pelo Estado de Mato Grosso junto à Caixa Econômica Federal, com recursos do FGTS e do BNDES (CPAC) .

Conforme a planilha representativa da carteira da SMDRU/MDR e o Diário Oficial do Estado do Mato Grosso, o empreendimento está orçado em R$ 1,58 bilhão, discriminado na tabela abaixo:

Tabela 6 – Composição do valor previsto para a implementação do VLT de Cuiabá

Fonte Valor previsto Valor liberado dos financiamentos junto aos bancos federais
Programa Pró-Transporte – Caixa – FGTS (contrato 0364021-34) 423.700.000,00  

297.335.005,96

Programa de Financiamento das Contrapartidas do PAC – CPAC – BNDES (contrato 0364186-21) 727.920.000,00  

660.880.604,12

Contrapartida Financeira do Estado do MT 68.619.866,70
Contrapartida não financeira (desapropriações) 100.000.000,00
Contrapartida proveniente de desoneração tributária 257.377.410,45
Total 1.577.617.277,15 958.215.610,08

Fontes: Planilha da carteira da SMDRU/MDR, Diário Oficial do Estado do Mato Grosso e Sistema de Acompanhamento de Obras da Caixa

De acordo com o Sistema de Acompanhamento de Obras da Caixa, dos R$ 423.700.000,00 de financiamento do Programa Pró-Transporte e dos R$ 727.920.000,00 de financiamento do CPAC, já foram liberados, respectivamente, R$ 297.335.005,96 e 660.880.604,12, perfazendo o total liberado de R$ 958.215.610,08, cerca de 83% do valor previsto de financiamento e 61% do valor total da obra.

Desde dezembro de 2014 a obra encontra-se paralisada, sendo alvo de ações judiciais e operação da Polícia Federal ante denúncias de ilícitos.

III. ALTO RISCO DE CONTRATAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS DE TRANSPORTE PÚBLICO DE MÉDIA E ALTA CAPACIDADE SEM VIABILIDADE TÉCNICA, ECONÔMICA E AMBIENTAL

III.1 Resumo das situações encontradas pela auditoria

Verificou-se que o Ministério do Desenvolvimento Regional não realiza, direta ou indiretamente, de forma sistemática, a avaliação de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade nem possui normativos e manuais que regulem as rotinas e procedimentos voltados para a apresentação desses estudos pelos estados e municípios, o que configura alto risco de aplicar recursos federais em empreendimentos sem viabilidade com a ineficiente alocação de recursos públicos, impactando a efetividade dos serviços de mobilidade urbana nas cidades e a melhoria da qualidade de vida da população.

III.2 As normas, os acórdãos do TCU e os benchmarks que são referências para os EVTEAs

Conforme preconizado pelo Manual de Auditoria Operacional do TCU, ainda na fase de planejamento a equipe elencou um conjunto de referências a serem usadas para avaliar o objeto de auditoria, de acordo com os princípios de economicidade, eficiência, eficácia e efetividade.

Primeiramente, destaca-se como critério basilar para justificar a realização de EVTEAs de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade o princípio da eficiência na administração pública, esculpido no art. 37 da CF.

Como balizadores das análises empreendidas destacam-se também os princípios, diretrizes e objetivos estabelecidos na PNMU, art. 5º ao 7º da Lei 12.587/2012.

Dentre os princípios, citam-se, por exemplo: a acessibilidade universal; desenvolvimento sustentável das cidades, nas dimensões socioeconômicas e ambientais; a equidade; a eficiência, eficácia e efetividade na prestação dos serviços; a justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do uso dos diferentes modos e serviços.

Acerca das diretrizes que orientam a PNMU, observa-se, por exemplo: a mitigação dos custos ambientais, sociais e econômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas na cidade; o incentivo ao desenvolvimento científico-tecnológico e ao uso de energias renováveis e menos poluentes; a garantia de sustentabilidade econômica das redes de transporte público coletivo de passageiros, de modo a preservar a continuidade, a universalidade e a modicidade tarifária do serviço.

Podem também ser ressaltados alguns dos objetivos estabelecidos na PNMU: reduzir as desigualdades e promover a inclusão social; promover o acesso aos serviços básicos e equipamentos sociais; proporcionar melhoria nas condições urbanas da população no que se refere à acessibilidade e à mobilidade; promover o desenvolvimento sustentável com a mitigação dos custos ambientais e socioeconômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas nas cidades.

O mesmo normativo legal, em seu art. 16, estabelece atribuições da União, com destaque às transcritas abaixo:

Art. 16. São atribuições da União:

I – prestar assistência técnica e financeira aos Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos desta Lei;

II – contribuir para a capacitação continuada de pessoas e para o desenvolvimento das instituições vinculadas à Política Nacional de Mobilidade Urbana nos Estados, Municípios e Distrito Federal, nos termos desta Lei;

(…)

IV – fomentar a implantação de projetos de transporte público coletivo de grande e média capacidade nas aglomerações urbanas e nas regiões metropolitanas;

(…)

VI – fomentar o desenvolvimento tecnológico e científico visando ao atendimento dos princípios e diretrizes desta Lei; e

(…)

§ 1º A União apoiará e estimulará ações coordenadas e integradas entre Municípios e Estados em áreas conurbadas, aglomerações urbanas e regiões metropolitanas destinadas a políticas comuns de mobilidade urbana, inclusive nas cidades definidas como cidades gêmeas localizadas em regiões de fronteira com outros países, observado o art. 178 da Constituição Federal.

(…) (grifos acrescidos)

Da leitura dos dispositivos da PNMU apresentados, destaca-se que a União deve fomentar a implantação de empreendimentos TMA e, também, o atendimento aos princípios e diretrizes previstos na lei, sendo um dos princípios o desenvolvimento sustentável das cidades, nas dimensões socioeconômicas e ambientais e, uma das diretrizes, a garantia de sustentabilidade econômica das redes de transporte público coletivo de passageiros, de modo a preservar a continuidade, a universalidade e a modicidade tarifária do serviço, conforme art. 5º, inciso II, c/c art. 6º, inciso VIII e art. 16, incisos IV e VI da Lei 12.587/2012. Por sua vez, o desenvolvimento sustentável das cidades (Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 11) , nessas dimensões, pressupõe que os empreendimentos de transporte público sejam viáveis.

Ademais, em razão do princípio da eficiência na administração pública, o termo fomentar deve ser entendido da maneira mais ampla, no sentido técnico e financeiro, inclusive para, ao financiar os estudos e projetos propostos pelos estados e municípios, a União possa dar a esses recursos públicos o melhor uso possível, gerando eficiência no gasto público e incremento na qualidade dos serviços públicos prestados.

Importante também observar o papel da União no apoio às iniciativas dos estados e dos municípios voltadas à governança interfederativa nas regiões metropolitanas ou em aglomerações urbanas, conforme arts. 13 e 14 da Lei 13.089, de 12 de janeiro de 2015 que institui o Estatuto da Metrópole. Esses dispositivos estão alinhados com o §1º do art. 16 da PNMU quando estabelece que a União apoiará e estimulará ações coordenadas e integradas entre os entes subnacionais nas áreas conurbadas, aglomerações urbanas e regiões metropolitanas destinadas a políticas comuns de mobilidade urbana.

Quanto à previsão legal acerca dos estudos de viabilidade, o ordenamento jurídico brasileiro estabelece uma série de normativos, a exemplo do art. 6º, inciso IX, c/c art. 116 da Lei 8.666, de 21 de junho de 1993; art. 2º, inciso IV, da Lei 12.462, de 4 de agosto de 2011; e art. 42, inciso VIII, da Lei 13.303, de 30 de junho de 2016, obrigando a elaboração de estudos técnicos preliminares que assegurem a viabilidade técnica, econômico-financeira e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, possibilitando a avaliação do custo do empreendimento e a definição dos métodos e do prazo de execução.

Observa-se ainda que os dispositivos citados das Leis 8.666/1993 e 13.303/2016 estabelecem que o projeto básico é o conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar a obra ou serviço ou o complexo de obras ou serviços objeto da licitação.

Por sua vez, o art. 116 da Lei 8.666/1993 estabelece que as disposições da Lei de Licitações e Contratos aplicam-se, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração.

Além dessas leis, considera-se também aduzir que o art. 1º, § 1º, inciso XXVII da Portaria Interministerial 424/MP/MF/CGU, de 30 de dezembro de 2016, que dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse, estabelece o mesmo teor das leis citadas quando define o projeto básico.

Não obstante o art. 2º da Portaria Interministerial 424/2016 estabelecer que as exigências dessa portaria não se aplicam às transferências obrigatórias para execução de ações no âmbito do PAC, regulamentadas pela Lei nº 11.578, de 26 de novembro de 2007, que, desde a sua edição, se tornou a regra para a contratação de empreendimentos de transporte público no âmbito da SMDRU/MDR – frisa-se que a essência dos dispositivos da portaria é verificar a comprovação da boa e regular aplicação dos recursos públicos e, ademais, a Lei 11.578/2007 não dispensa o MDR de exigir dos proponentes a elaboração dos EVTEAs.

Nessa linha, transcreve-se trecho do voto que conduziu o Acórdão 2537/2017-TCU-Plenário, em sede de pedido de reexame interposto pelo município de Palmas/TO contra o Acórdão 460/2017-TCU-Plenário, por meio do qual o Tribunal apreciou relatório de auditoria na implantação de BRT naquele município.

Portanto, o fato de a Lei 11.578/2007 dispor sobre os requisitos relativos às transferências de recursos para empreendimentos do PAC não elimina o necessário cumprimento de regramentos da legislação ordinária, que prevê a obrigatoriedade da elaboração de estudos de viabilidade técnica-econômica-ambiental. (grifos acrescidos)

Além disso, o presente trabalho é voltado para a avaliação dos EVTEAs dos futuros contratos que eventualmente a União vier assinar, portanto, essa avaliação pela União, deve ser suficiente a fim de reduzir o risco sobre a contratação do empreendimento, sobre os recursos públicos empregados e, também, sobre um serviço de transporte público ineficiente. Sobre a suficiência da avaliação, ressalta-se o previsto no art. 19 da Portaria Interministerial 424/2016, que trata do plano de trabalho, transcrito abaixo:

Art. 19. O plano de trabalho, que será avaliado pelo concedente, conterá, no mínimo:

I – justificativa para a celebração do instrumento;

II – descrição completa do objeto a ser executado;

III – descrição das metas a serem atingidas;

IV – definição das etapas ou fases da execução;

V – compatibilidade de custos com o objeto a ser executado;

VI – cronograma de execução do objeto e cronograma de desembolso; e

VII – plano de aplicação dos recursos a serem desembolsados pelo concedente e da contrapartida financeira do proponente, se for o caso. (grifo acrescido)

Por sua vez, o art. 20 da mesma portaria estabelece que o plano de trabalho será analisado quanto à sua viabilidade e adequação aos objetivos do programa. Considera-se que a análise de viabilidade citada no art. 20 da Portaria Interministerial 424/2016 deve ser interpretada em conjunto com os estudos técnicos preliminares do projeto básico – estabelecidos no art. 6º, inciso IX da Lei 8.666/1993, no art. 2º, inciso IV, da Lei 12.462/2011 e no art. 42, inciso VIII, da Lei 13.303/2016 – que assegurem a viabilidade técnica, econômico-financeira e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento.

Destaca-se também que o art. 21 da citada portaria estabelece que o projeto básico deve ser apresentado antes da celebração do instrumento de transferência de recursos da União, facultando ao concedente exigi-lo depois, desde que antes da liberação da primeira parcela dos recursos.

Ademais, sobre a necessidade de exigir e avaliar a adequação dos EVTEAs, antes da celebração de instrumentos de transferências de recursos federais, fundamentado no art. 20 da Portaria Interministerial 424/2016, que revogou a Portaria Interministerial nº 507, de 24 de novembro de 2011, o TCU se pronunciou a respeito, conforme decisão transcrita abaixo:

Acórdão 2416/2012-TCU-Plenário

9.3. determinar ao Ministério da Integração Nacional que se abstenha de celebrar convênios sem que exista estudo de viabilidade adequado do empreendimento, em atenção ao disposto no art. 26 da Portaria Interministerial nº 507, de 24 de novembro de 2011, e ao art. 6º, inciso IX, c/c art. 116 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993 (grifo acrescido) ;

Cabe observar que a redação do art. 26 da Portaria Interministerial nº 507/2011, utilizado à época como critério normativo no item 9.3 do Acórdão 2416/2012-TCU-Plenário, está reproduzida nos mesmos termos do artigo 20 da Portaria Interministerial 424/2016, atualmente vigente.

Ademais, é vasta a jurisprudência do TCU no sentido da obrigatoriedade de elaboração e aprovação de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental (EVTEA) , suficientes e adequados, previamente ao investimento público em empreendimentos e obras em geral e, em particular, para sistemas de mobilidade urbana. Nessa linha são os Acórdãos 2.674/2009 (item 9.3.1) , 2.510/2009, 2.425/2009 (item 9.3.1.1) , 1.837/2009, 2.582/2010 (item 9.1.2) , 1.373/2011 (item 9.1.3) e 2.835/2015 (itens 9.1 e 9.2) , todos do Plenário do TCU.

Acerca de caso emblemático tratado em fiscalização desta Corte de Contas (BRT Palmas/TO) , cabe citar mandamento contido no decisum abaixo transcrito:

Acórdão 460/2017-TCU-Plenário (determinação)

9.1.1. elaborar estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental para a implantação (…) , com a aprovação pelo Ministério das Cidades e pela Caixa Econômica Federal, devendo contemplar análises técnicas e econômicas adequadas e suficientes sobre todo o empreendimento, além de quantificar a demanda por transporte na região a partir da escolha da melhor solução técnica para o atendimento dessa demanda e a quantificação das despesas de operação do empreendimento, em plena consonância com os dados utilizados na referida análise (grifos acrescidos) ;

Assim, a partir desse arcabouço de normas constitucionais, legais e infralegais, juntamente com as decisões do TCU no mesmo sentido, verifica-se, a partir de uma visão sistêmica, que é possível afirmar a obrigação da União, representada pelo MDR e pela Caixa, para exigir e avaliar os EVTEAs dos projetos de mobilidade urbana por ela financiados, seja com OGU ou com outras linhas de financiamento, especialmente os de média e alta capacidade, utilizando critérios mínimos suficientes e com nível de precisão adequado, em razão da complexidade técnica dos projetos de TMA, dos riscos envolvidos (econômicos e ambientais) , da sua relevância social e econômica e também de sua alta materialidade, alinhando os projetos à PNMU e aos planos municipais (mobilidade urbana, diretores e os de desenvolvimento urbano integrado) , considerando a viabilidade por todo ciclo de vida, desde a concepção, construção até a operação do empreendimento.

Já quanto às publicações e guias referenciais de EVTEAs considerados pela equipe, buscou-se obter, após ampla pesquisa, uma expectativa razoável e fundamentada do que “deveriam ser” as melhores práticas e benchmarks com os quais a situação encontrada pudesse ser comparada. Adotou-se, portanto, como fontes de informação e referências técnico-normativas acerca de estudos de viabilidade os documentos abaixo relacionados:

Guia TPC – Orientações para seleção de tecnologias e implementação de projetos de transporte público coletivo – KFW-BNDES-MCIDADES;

Caderno Técnico de Estudos de Viabilidade (Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos – ANPTrilhos, em parceria com o MDR) ;

The World Bank Group – Transport Sector Board – Aprimoramento do marco de avaliação de investimentos em infraestrutura de transportes rodoviários;

Manual de apresentação de estudos de viabilidade de projetos de grande vulto (Ministério do Planejamento, julho/2009) ;

Manual de Elaboração dos Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental – VALEC;

Manual de Procedimentos de Análise de EVTEA de Arrendamento Portuários – Antaq;

EVTEA de Empreendimento Ferroviário – DNIT;

Manual de Evaluación Económica de Proyectos de Transporte – BID;

Metodologia de Estruturação de Projetos de Infraestrutura – EPL.

Considerando essa pesquisa, na seção IV deste relatório, serão apresentados, em linhas gerais, os elementos entendidos como necessários de serem abordados em uma estrutura básica a fim de se obter um estudo de viabilidade em grau suficiente e adequado.

Ainda, foram considerados, como fontes de informação, os documentos exigidos no Anexo II da Portaria 262/2013, do então Ministério das Cidades, no que diz respeito aos EVTEs dos projetos de Parceria Público-Privada contemplados com o repasse de recursos do OGU para propostas selecionadas no âmbito do PAC 2 – Mobilidade Grandes Cidades.

Por fim, ressalta-se que, em função da ausência de normas e manuais de procedimentos voltados à apresentação e à avaliação dos EVTEAs no âmbito do MDR, a equipe buscou orientação, também, no Referencial para Avaliação de Governança em Políticas Públicas do TCU, merecendo destaque o componente institucionalização, sobre o qual o referencial afirma “que uma política pública esteja jurídica e oficialmente formalizada, com o estabelecimento de normas, padrões e procedimentos que definam claramente as arenas decisórias, a divisão de competências e as atribuições dos atores envolvidos.” (grifos acrescidos)

III.3 SMDRU/MDR e Caixa não possuem normas e procedimentos de avaliação de EVTEAs

Com base nas entrevistas dos gestores responsáveis pela seleção de empreendimentos de mobilidade urbana para o recebimento de recursos federais, seja por meio do OGU ou do FGTS, constatou-se não haver, no âmbito da Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional e Urbano do Ministério do Desenvolvimento Regional – SMDRU/MDR, normas, manuais ou procedimentos sistemáticos que visassem à avaliação de estudos de viabilidade de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade.

Os gestores informaram que os empreendimentos financiados com FGTS, possuem critérios definidos de enquadramento, a exemplo da compatibilidade da proposta com o PMU ou com instrumento de planejamento equivalente que justifique os investimentos para municípios com população superior a 20 mil habitantes; da observação do percentual de contrapartida mínimo; e da situação de regularidade do proponente perante o FGTS. Os gestores afirmaram ainda que a SMDRU/MDR aplica esses critérios na operação de crédito. Tais normativos são as IN’s n. 27/2017 (Pró-Transporte) , n. 28/2017 (Avançar Cidades – Grupo 1) e n. 16/2018 (Avançar Cidades – Grupo 2) , no entanto, na análise destas regras não foram encontrados parâmetros para a avaliação de EVTEA equivalentes à estrutura básica apresentada na seção IV deste relatório.

Quanto à avaliação da Caixa, foi destacado que essa tarefa visa somente à viabilidade financeira dos projetos, ou seja, a compatibilidade de custos, orçamento e da contrapartida financeira, posição que foi confirmada em conversa com integrantes da área de avaliação de projetos da Caixa.

Critérios de enquadramento similares aos estabelecidos para o FGTS compuseram a Portaria de Chamamento 65/2011, que tratou da última seleção para o PAC Mobilidade Grandes Cidades. No entanto, ela se aplicou a uma seleção em um período específico de tempo e, portanto, não há normativos mais perenes sobre esses aspectos na SMDRU/MDR, havendo a necessidade de que novas seleções que porventura venham a ser realizadas tragam a edição de normativos específicos para elas, o que mantém o risco de que aspectos de viabilidade dos empreendimentos não sejam considerados, que haja uma maior sujeição a pressões, sem seguir critérios técnicos, e que se continue permitindo o início de empreendimentos que não tenham adequado nível de planejamento comprovado e avaliado, o que pode incorrer na ineficácia de gastos públicos e na baixa efetividade da política.

III.4 Nos processos do MDR, não existem avaliações de EVTEAs

Foi desempenhada pela equipe de fiscalização uma verificação do conteúdo dos processos administrativos de seleção de empreendimentos de transportes de média e alta capacidade da SMDRU/MDR. Por meio dessa verificação, pôde se confirmar que não são realizadas avaliações de estudos de viabilidade ao longo do processo de seleção e contratação dos empreendimentos no âmbito da secretaria, seja para empreendimentos financiados por meio do OGU ou do FGTS.

Foram verificados processos administrativos relativos aos dez instrumentos de repasse ou de financiamento de transportes de média e alta capacidade de maior valor de repasse de recursos geridos pelo poder público federal (OGU e FGTS) , de acordo com listagem de empreendimentos da carteira fornecida pela própria SMDRU/MDR. Os dados desses instrumentos de repasse estão relacionados na tabela 16 do Apêndice A relativos aos seguintes empreendimentos ou trechos de empreendimento:

1) BRT Transbrasil

2) Monotrilho – Trecho 1 da Linha 17 – Ouro, SP

3) Sistema Metroviário de Salvador e Lauro de Freitas – Linha 2 OGU

4) Implantação da Linha Leste do Metrô de Fortaleza – Etapa de Financiamento

5) Sistema Metroviário de Salvador e Lauro de Freitas – Linha 1, Tramo 3

6) Implantação da Linha Leste do Metrô de Fortaleza – Etapa de OGU

7) Expansão e Modernização do Metrô do DF

8) BRT Transcarioca – Lote 1 (O processo de seleção também contemplou o Lote 2)

9) Sistema Metroviário de Salvador e Lauro de Freitas – Linha 2, Financiamento

10) Sistema de Transporte de Passageiros BRT – Eixo Sul, DF

Ao longo dessa verificação, foram identificados documentos com expectativas de demanda e custos, como no caso do Processo 80000.018697/2011-75 – SEI/MCidades, referente à seleção do BRT Transbrasil no Rio de Janeiro. Nesse caso, em considerações sobre viabilidade técnico-econômica, existe apenas uma comparação de que o investimento seria da ordem de US$/Km 10-20 milhões contra um investimento de US$/Km 100-200 milhões, numa suposta comparação de modais para a qual o documento não explicita qual é o referencial. Em documento de subsídio para enquadramento da proposta, consta que o município teria apresentado estudo de viabilidade técnico, econômico, tarifário e operacional, que todavia não pôde ser encontrado no processo.

No processo de monitoramento do mesmo empreendimento, 80000.026233/2013-02 – SEI/MCidades, verifica-se que há uma análise de viabilidade por parte da Caixa, mas que se resume ao componente técnico e à precificação do objeto. Registra-se que esse escopo reduzido de análise foi verificado também nos processos administrativos dos demais empreendimentos. Ou seja, não foram abordadas nessa análise da Caixa questões relacionadas aos componentes econômicos e ambientais do projeto.

Especificamente no processo de monitoramento da Linha 2 do Sistema Metroviário de Salvador e Lauro de Freitas, OGU (80000.006365/2014-91 – SEI/MCidades) , foi juntado um EVTE do empreendimento datado de julho/2013, não havendo, no entanto, avaliação das suas premissas, das alternativas de solução e da viabilidade econômico-financeira e ambiental do empreendimento. Verificou-se apenas a tradicional análise de engenharia feita pela Gigov da Caixa. Este foi um dos únicos empreendimentos em que se pôde observar a presença do EVTE no seu processo administrativo.

Credita-se a existência de EVTE para este empreendimento ao fato de se tratar de uma PPP estadual, situação para a qual se tem estabelecida a competência primária de avaliação do EVTE por parte do órgão concedente, no caso o Estado da Bahia. Nessa situação, em linha com os Acórdãos 2.906/2015 e 1.665/2016, ambos do Plenário, cabe ao poder público federal se certificar de que há estudos de viabilidade elaborados pelos respectivos poderes concedentes, ratificados por suas agências reguladoras, onde houver, e, preferencialmente, certificados pelos respectivos órgãos de auditoria interna e tribunais de contas. Cabem aos órgãos federais decidirem, nesse caso, sobre a viabilidade da cooperação, que se distingue da manifestação sobre a viabilidade do empreendimento.

No caso específico do Metrô de Fortaleza/CE, importante observar alguns pontos destacados no “Relatório-Síntese da Missão Semob, BIRD, BNDES e Caixa” constante do processo administrativo de monitoramento do empreendimento. No cenário em que se buscava um realinhamento para implementação e financiamento da Linha Leste daquele metrô, foram registradas no relatório as seguintes perspectivas com os dados disponíveis: alto risco de descontinuidade entre a obra pública e a PPP, em função da aparente baixa viabilidade da PPP, cuja avaliação mais acurada dependeria de estudo de demanda atualizado, tarifa técnica compatível com o OPEX, viabilidade econômico-financeira da PPP, capacidade de subsídio à tarifa técnica estabelecida etc.

O estado do Ceará vinha observando um desinteresse privado na PPP de operação da linha do metrô em função da sua aparente inviabilidade econômica. Trata-se de um empreendimento valorado em cerca de R$ 2,25 bilhões na data-base 01/2013 apenas para as obras civis, dos quais R$ 1 bilhão seria proveniente do OGU e R$ 1 bilhão, de financiamento do FGTS; correspondendo, portanto, ao compromisso financeiro da União de R$ 2 bilhões (TC Processo 009.221/2016-6) . O empreendimento fora selecionado em 2012, contratado e iniciado em 2013 e apenas em 2017 teve uma visão federal, por meio da missão (grupo de trabalho criado) destinada a enxergar a viabilidade e a forma de operação do empreendimento. É importante destacar que havia um EVTE anexado ao processo administrativo de monitoramento de implantação da obra (anexo 1 do processo 80000.026243/2013-30 – SEI/MCidades) , mas que não foi objeto de avaliação em momento algum por parte da SMDRU/MDR.

Dessa forma, diante do cenário provável identificado de baixa viabilidade da PPP, corre-se sério risco de comprometer enormes volumes de recursos públicos, federais e estaduais, além de elevados esforços, para entregar obras que ao fim não teriam o interesse privado na operação da PPP (modelo pensado pelo estado do Ceará) . Ou que de outra forma ficariam nas mãos do estado para operação, o que comprometeria o seu orçamento de uma forma não prevista, com elevados riscos de se chegar ou à paralisação do empreendimento ou a uma operação forçada sem o planejamento que seria necessário, com grandes possibilidades de impacto na qualidade e no custo do serviço.

Todo esse cenário poderia ter sido mais bem saneado e talvez até evitado se houvesse uma consideração adequada da consecução e da operação do empreendimento, por meio de uma avaliação mínima de um documento de Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA) .

Ressalva-se, contudo, que não está sendo demandado que o MDR faça diretamente essa avaliação, porém, que o órgão assuma a responsabilidade pelo estabelecimento de critérios mínimos e da respectiva avaliação dos EVTEAs, ainda que externa ao ministério, da suficiência e da adequação dos EVTEAs – alinhando-os à Política Nacional de Mobilidade Urbana, aos planos de mobilidade urbana, aos planos diretores urbanos e aos planos de desenvolvimento urbano integrado, considerando a viabilidade durante todo o ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a operação dos empreendimentos – acompanhada da devida manifestação conclusiva, sendo realizada, por exemplo, por meio de conselho de projetos, externos ao MDR, formado por especialistas no assunto, ou por meio de cooperação com outras instituições que exercem essa atividade, a exemplo das citadas na seção IV deste relatório.

Nesse sentido, relevante destacar a existência do conselho de projetos em outros modelos de avaliação de projetos internacionalmente reconhecidos, a exemplo do Business Case do Reino Unido, especificamente na publicação Infrastructure Business Case: International Guidance, p. 72. Ou seja, esse benchmark nos traz a indicação de uma boa prática que pode ser utilizada. A título exemplificativo, tendo essa referência como base teórica, o conselho de projetos seria responsável técnico pela avaliação dos estudos de viabilidade, podendo contar com outros especialistas, quando apropriado, por exemplo, para fornecer asseguração sobre o EVTEA, antes de ser submetido aos gestores do MDR.

III.5 O histórico dos processos de controle externo confirma a inexistência da avaliação de EVTEAs

Como resultado da pesquisa realizada em processos de controle externo anteriores a esta auditoria operacional, tendo como foco a atuação da SMDRU/MDR acerca da realização de avaliação de estudos de viabilidade, foi possível compilar achados de auditoria, ou irregularidades apontadas nos processos, relativos a estudos de viabilidade, conforme apresenta-se à tabela 14, no Apêndice A do presente relatório.

Da amostra de doze processos de controle externo que possuíam como objeto transporte público de média e alta capacidade, selecionados com base em critérios de materialidade e relevância, verificou-se que em onze (92% da amostra) foram constatadas irregularidades relacionadas à inconsistência e/ou falta de avaliação prévia do EVTEA no processo de seleção e contratação dos empreendimentos.

Com efeito, nas ocasiões em que a SMDRU/MDR foi instada a se pronunciar acerca das irregularidades nos EVTEAs, foram reportadas as seguintes fragilidades:

deficiência na estrutura do órgão de modo a permitir avaliação adequada de EVTEAs, em função do caráter multidisciplinar, havendo a necessidade de apoio de outras instituições;

avaliação no âmbito do ministério limitada à capacidade da União em repassar os recursos do OGU, considerando o cenário de restrição orçamentária e financeira e, conjuntamente, os compromissos assumidos e já¿ em execução;

ausência de normativo regulamentando o processo de avaliação e as responsabilidades acerca da avaliação dos EVTEAs nos processos de seleção/contratação de empreendimentos de mobilidade urbana.

III.6 Status da carteira em face da inexistência da avaliação dos EVTEAs

Diante do histórico no âmbito do MDR de selecionar empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade sem avaliação de sua viabilidade técnica, econômica e ambiental, a equipe de fiscalização levantou junto à SMDRU/MDR o atual status de sua carteira.

Verifica-se o total de 48 contratos de transporte público de média e alta capacidade, sendo: 32 BRTs, oito metrôs, dois monotrilhos, um trem urbano e cinco VLTs/Bondes, os quais totalizam a previsão de recursos federais de R$ 15,34 bilhões, além de outros R$ 9,32 bilhões em contrapartida.

Tabela 7 – Composição por modais da carteira de empreendimentos de transporte de média e alta capacidade da SMDRU/MDR

Modal Quantidade de contratos Valor apoio federal por modal (em R$ bilhões) Valor de contrapartida por modal (em R$ bilhões)
BRT 32 6,26 2,16
Metrô 8 5,37 1,48
Monotrilho 2 1,48 2,48
Trem Urbano 1 0,5 0,43
VLT/bondes 5 1,72 2,77
Total 48 15,34 9,32

Fonte: Planilha da carteira de empreendimentos da SMDRU/MDR

Desse total de contratos, apenas doze constam que as obras foram concluídas; 23 estão em execução, incluindo uma obra que estava paralisada e foi retomada; quatro obras não foram iniciadas e nove empreendimentos estão com suas obras paralisadas.

Tabela 8 – Situação dos empreendimentos de transporte de média e alta capacidade da carteira da SMDRU/MDR

Situação da obra Quantidade de contratos Valor apoio federal por situação da obra (em R$ bilhões) Valor de contrapartida por situação da obra (em R$ bilhões)
Concluída 12 2,94 0,65
Em execução 23 8,98 6,12
Não iniciada 4 1,48 0,28
Paralisadas 9 1,93 2,27
Total 48 15,34 9,32

Fonte: Planilha da carteira de empreendimentos da SMDRU/MDR

Sobre os nove empreendimentos que tiveram sua execução paralisada, o valor total previsto para aportes com recursos federais perfaz R$ 1,93 bilhão, além de mais R$ 2,27 bilhões em contrapartida, conforme tabela abaixo:

Tabela 9 – Transporte de média e alta capacidade com obras paralisadas

Modal Empreendimento UF Fonte Valor recursos federais (em R$ milhões) Valor contrapartida (em R$ milhões) Valor total previsto (em R$ milhões)
BRT Sistema de Transporte de Passageiros Eixo Sul DF FIN 562 200 761
VLT Cuiabá/Várzea Grande MT FIN 1152 426 1.578
VLT Implantação de linha de VLT Baixada Santista SP FIN 400 736 1.136
BRT Sistema de Transporte Rápido por Ônibus para a RMR PE OGU 189 73 262
BRT Norte/Sul-Igarassu /Tacaruna/Centro PE FIN 162 36 198
BRT Vetores Oeste, Leste e Noroeste SP FIN 107 29 135
BRT Norte/Sul GO OGU 70 9 79
BRT AV. Paulino Rocha CE FIN 20 32 52
BRT João Pessoa e Terminal Azenha RS FIN 2 3 5
Total 1.934 2.270 4.204

Fonte: Planilha da carteira de empreendimentos da SMDRU/MDR

Para esses empreendimentos paralisados, o tempo médio decorrido, desde a assinatura do contrato da União com o ente subnacional, é de 87 meses, configurando-se para a população localizada nessas cidades, a maioria em médias e grandes cidades, capitais e regiões metropolitanas, uma falta do serviço demasiada. Ressalta-se que sete dessas obras são de BRT’s, as quais possuem menor complexidade para implementação que os demais modais, o que denota problemas relacionados não apenas à sua execução.

Tabela 10 – Tempo de contrato dos empreendimentos de TMA capacidade cujas obras estão paralisadas

Modal Empreendimento Assinatura do contrato com a União Tempo desde a assinatura (em meses)
BRT Sistema de Transporte de Passageiros Eixo Sul 28/12/2012 91
VLT Cuiabá/Várzea Grande 18/06/2012 98
VLT Implantação de linha de VLT Baixada Santista 12/12/2013 80
BRT Sistema de Transporte Rápido por Ônibus para a RMR 21/03/2014 77
BRT Norte/Sul – Igarassu/Tacaruna/Centro 26/12/2011 104
BRT Vetores Oeste, Leste e Noroeste 09/06/2014 74
BRT Norte/Sul 22/08/2014 71
BRT AV. Paulino Rocha 29/12/2011 104
BRT João Pessoa e Terminal Azenha 28/03/2013 88
Tempo médio de contrato das obras paralisadas (em meses) 87

Fonte: Planilha da carteira de empreendimentos da SMDRU/MDR

Em relação aos 23 empreendimentos em execução, verifica-se que o tempo médio desde o início da obra até a data atual é de: 63 meses para os contratos de BRT’s, 44 meses para os contratos de metrôs, 108 meses para o monotrilho, 81 meses para o de trem urbano e 73 meses para os VLTs/Bondes.

Tabela 11 – Tempo médio de contrato dos empreendimentos de TMA por modalidade

Modal Quantidade de contratos em execução Tempo médio de contrato desde a assinatura (em meses)
BRT 14 63
Metrô 4 44
Monotrilho 1 108
Trem Urbano 1 81
VLT/Bonde 3 73

Fonte: Planilha da carteira de empreendimentos da SMDRU/MDR

A equipe de auditoria também verificou, com base nos dados da planilha da carteira de empreendimentos da SMDRU/MDR e dos seus processos SEI, que alguns dos contratos em execução extrapolaram o prazo inicial previsto para conclusão da obra (Apêndice A) .

Para o cálculo do atraso na entrega dos empreendimentos, a equipe de auditoria considerou a data atual em relação à prevista inicialmente para conclusão das obras. Para os quatro empreendimentos de alta materialidade selecionados para essa verificação (BRT Transbrasil, Monotrilho-Trecho 1 da Linha 17 Ouro Aeroporto de Congonhas, Linha Leste do Metrô de Fortaleza e Expansão e Modernização do Metrô do DF) , percebe-se considerável atraso na entrega do bem público quando comparado com o prazo planejado.

Nessa linha, observou-se que o Monotrilho-Trecho 1 da Linha 17 Ouro do Aeroporto de Congonhas, que deveria ter sido concluído em 25/8/2014, está com 71 meses de atraso em relação ao prazo inicial previsto para conclusão da obra. A obra tinha sua previsão de conclusão em 37 (trinta e sete) meses contados da datada emissão da Ordem de Serviço – OS 1, ocorrida em 11/8/2011. O valor do financiamento com recursos do FGTS para a obra é de R$ 1,08 bilhão, além de contrapartida de R$ 2,48 bilhões.

Por sua vez, o BRT Transbrasil está atualmente com 51 meses de atraso, tendo em vista que a obra deveria ter sido concluída, de acordo com o prazo inicial, em 26/4/2016, conforme contrato de financiamento assinado em 26/4/2013 (conforme verificação do sistema de acompanhamento de obras da Caixa presente no processo de monitoramento SEI 80000.026233/2013-02) , que tinha o prazo de 36 meses de execução conforme análise de enquadramento presente no processo de seleção SEI 80000.018697/2011-75. O valor previsto para aporte é de R$ 1,09 bilhão de financiamento com recursos do FGTS, além de uma contrapartida de R$ 203 milhões.

As obras de expansão e modernização do Metrô do DF estão com 38 meses de atraso, pois a data prevista inicialmente para o término das obras era 20/5/2017, conforme Síntese do Projeto Aprovado do processo SEI 80000.005771/2014-36. A assinatura do contrato ocorreu em 5/6/2014 com o prazo de execução de 36 meses. Observa-se que, de acordo com a planilha fornecida pela SMDRU, o atual prazo para conclusão da obra é 4/2/2023, ou seja, da data inicialmente estimada para conclusão, o atraso total poderá chegar a 70 meses (mais de 5 anos) . A obra possui valor previsto de R$ 630 milhões de recursos federais, além de R$ 125 milhões de contrapartida.

Linha Leste do Metrô de Fortaleza, que deveria ter sido concluída em 21/11/2018, está com 20 meses de atraso em relação ao prazo inicial previsto. De acordo com a resposta do Governo do Estado do Ceará à equipe de auditoria no TC Processo 008.305/2015-3, o prazo de execução era de 60 meses, contados a partir da data de recebimento da ordem de serviço (22/11/2013) . Conforme a planilha fornecida pela SMDRU, o atual prazo para conclusão da obra é 30/12/21; sendo, portanto, que o atraso total para a entrega da obra à sociedade poderá chegar a 38 meses. O valor previsto de recursos federais para o empreendimento é de R$ 660 milhões oriundos do OGU, R$ 1 bilhão de financiamento do BNDES e mais R$ 13 milhões de contrapartida.

O cenário da carteira da SMDRU/MDR apresentado acima reflete uma estrutura deficiente no órgão federal para analisar a viabilidade dos empreendimentos em relação ao prazo de entrega conforme planejado. A ausência de avaliação de forma conclusiva sobre os estudos de viabilidade de grandes projetos de transporte público é condição, embora não completamente determinante, para a ocorrência dos diversos problemas enfrentados pela sociedade brasileira nesse setor de infraestrutura, tais como obras atrasadas, paralisadas ou, no caso daquelas finalizadas, sem atender a demanda projetada.

Como já descrito, verificou-se que a SMDRU falha ao não exigir e avaliar os estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental que deveriam acompanhar as propostas de projetos apresentados pelos estados e municípios em seus pleitos junto à União, de forma que tais estudos abordassem todo o ciclo de vida dos empreendimentos (concepção, construção e operação) .

III.7 Principais causas identificadas

Conforme descrito na seção III.5, nas ocasiões em que a SMDRU/MDR foi instada a se pronunciar nos processos de controle externo analisados sobre as irregularidades nos EVTEAs, a secretaria informou a deficiência técnica na estrutura do órgão de modo a permitir avaliação adequada de EVTEAs, em função do caráter multidisciplinar, havendo a necessidade de apoio de outras instituições. A título exemplificativo, relevante destacar o posicionamento da área técnica do ministério no DESPACHO Nº 597/2018/DEMOB/SEMOB no BRT de Palmas/TO (TC Processo 018.777/2016-3, peça 246, p. 28) :

Em atendimento ao DESPACHO Nº 472/2018/SEMOB (1198154) encaminho a Nota Informativa nº 38/2018/GEMOB 1/DEMOB/SEMOB (1201154) com as informações da situação atual do empreendimento BRT de Palmas com intuito de subsidiar a tomada de decisão. Reitero que este Departamento não dispõe de equipe técnica qualificada para análise do EVTEA e enfatizo a importância de formalizar parcerias com outros órgãos do Governo Federal (grifos acrescidos) .

A Caixa, da mesma forma, além da deficiência técnica em seus quadros, entende que a legislação e o seu contrato de prestação de serviço com o Ministério do Desenvolvimento Regional não lhe atribuem essa atividade, corroborando o entendimento obtido na análise dos processos administrativos de seleção dos empreendimentos. Sobre isso, transcreve-se trecho da Gerência de Padronização e Normas Técnicas de Governo da Caixa, no âmbito do mesmo processo do BRT Palmas (TC Processo 018.777/2016-3, peça 246, p. 21) :

Portanto, salvo melhor juízo da SUTRE e embora não haja portaria especifica do MCidades que promova entendimento sobre EVTEA para operações que não as de PPP, entendemos que o contrato de prestação de serviços firmado entre gestor e Caixa para processos OGU não obriga a que esta analise documentos financeiros do EVTEA, mesmo porque as unidades regionais não tem pessoal com tal qualificação (grifos acrescidos) .

O posicionamento do MDR e da Caixa quanto à deficiência em sua estrutura para avaliar estudos de viabilidade é corroborado pela ausência sistemática de avaliação dos EVTEAs em relação aos outros empreendimentos da carteira da secretaria, relatado nas seções III.4 e tabela 16 (processos do MDR) e III.5 e tabela 14 (processos do TCU) .

Esse posicionamento por parte de ambas as instituições se configurou como causa para que não houvesse o estabelecimento de controles (normas e manual de procedimentos) bem como das avaliações dos EVTEAs de empreendimentos de mobilidade urbana de empreendimentos TMA que recebem recursos federais.

Ademais, de acordo com a auditoria realizada em 2015, Acórdão 2430/2015-TCU-Plenário, para avaliar a governança da Política Nacional de Mobilidade Urbana, verificou-se que a PNMU possuía um baixo índice de governança, quanto à institucionalização de normas e procedimentos para a execução da política. Esse nível reduzido de institucionalização de normas, conforme verificado no presente trabalho, também se apresenta em relação aos critérios mínimos de avaliação de EVTEAs e de manifestação conclusiva dos empreendimentos de transporte de média e alta capacidade.

Ao longo da seleção dos empreendimentos, há a exigência de apresentação da população atingida e de informações técnicas do empreendimento. No entanto, conforme registrado em entrevista com gestores da SMDRU/MDR, não existe a exigência ou a apresentação de como o empreendimento será operado ou uma previsão de custos e receitas que o empreendimento deve auferir ao longo de sua operação, além de outros aspectos que se traduzem numa visão do modelo de negócio do empreendimento.

Adicionalmente, busca-se uma visão em conjunto com a prestação do serviço público por meio desses empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade, que é o seu objetivo final. De forma distinta, pode-se concretizar um empreendimento que o ente subnacional não tenha condições de operar ou manter de forma satisfatória ou que seja abandonado por gestões futuras ou mesmo pela população se não tiver a sua relevância comprovada. Em todos esses cenários, haveria o desperdício e a baixa eficácia do gasto público.

Ainda, já foi destacado um esforço cooperativo insuficiente entre as esferas de governo para a execução da PNMU, conforme apontado no voto condutor do Acórdão 2430/2015-TCU-Plenário. Tal nível reduzido de cooperação contribui negativamente para uma evolução dos níveis de planejamento dos empreendimentos de mobilidade, representando ainda um reduzido apoio, no geral, à capacitação dos entes subnacionais e um baixo incentivo para a prévia realização de estudos de viabilidade previamente às tentativas de contratação dos empreendimentos de mobilidade urbana, especialmente para aqueles custeados com OGU.

O TCU já manifestou o entendimento em acórdãos passados sobre a necessidade da existência e consideração do EVTEA para a execução de obras públicas de mobilidade urbana, como pode se ver nos Acórdãos 1.837/2009, 2.425/2009 (item 9.3.1.1) , 2.510/2009, 2.674/2009 (item 9.3.1) , 1.373/2011 (item 9.1.3) , 2.416/2012 (item 9.3) , 460/2017 (item 9.1.1) , todos do Plenário do TCU. Dessa forma, a inobservância e, em última instância, o descumprimento a essa jurisprudência do TCU, também podem ser listados como causa para a persistência da situação em que os EVTEAs não são exigidos e avaliados.

III.8 Efeitos indesejados nesse cenário

Primeiramente, vale destacar como efeito indesejado da situação encontrada o alto risco, em virtude da alta probabilidade e alto impacto, de o MDR estar financiando empreendimentos que: i) não estão alinhados com os planos municipais (de mobilidade urbana e diretores) e os de desenvolvimento urbano integrado; ii) não apresentam a melhor solução em termos de custo/benefício; iii) não estão maduros; ou iv) , no pior cenário, não são viáveis do ponto de vista técnico, econômico ou ambiental. Em todos os casos, a materialização desses riscos importa em alocação ineficiente e mau uso dos escassos recursos públicos.

Ademais, tal materialização representa, em diferentes níveis, a falta de melhoria das condições de mobilidade nas cidades que a aplicação de tais recursos poderia proporcionar à população.

Em diversos julgados do TCU, verifica-se a importância dos EVTEAs para obras públicas. Cita-se, por exemplo, o voto indutor do Acórdão 1884/2016-TCU-Plenário, no âmbito do TC Processo 023.215/2015-1, que avaliou irregularidades referentes a uma portaria do Diretor-Geral do DNIT, que havia dispensado a realização de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental (EVTEA) nas contratações de obras de infraestrutura de transportes, sob a gestão da autarquia.

Sem dúvida, a combinação da ausência de estudos de viabilidade com a má qualidade de projetos em obras rodoviárias é danosa aos investimentos na área, além de abrir margem para aplicação de recursos em projetos com finalidade política, sem qualquer fundamento técnico, econômico ou ambiental, razão pela qual acolho, na essência, a proposta da unidade técnica no sentido de que este Tribunal deve indicar ao DNIT a necessidade de adoção de providência para a retirada do ordenamento jurídico da Portaria do Diretor-Geral nº 1.562, de 26/12/2008.

Em voto que conduziu o Acórdão 1837/2009-TCU-Plenário, foram destacados os efeitos da ausência de EVTEAs:

(…) falta de planejamento das obras públicas, a qual deveria abranger desde os estudos de viabilidade técnico-econômico, social e de sustentabilidade ambiental da obra, (…)

De fato, sempre que não se adotam essas medidas preventivas mínimas, (…) não satisfazem plenamente ao interesse público, seja do ponto de vista da relação custo/benefício do empreendimento, seja do ponto de vista da sustentabilidade do projeto, em seu conceito mais amplo.

Essa ausência de avaliação de EVTEAs colabora também para uma má implementação e aperfeiçoamento da Política Nacional de Mobilidade Urbana, à medida em que não se registra nem se avalia a qualidade dos projetos apresentados sob a perspectiva da viabilidade do empreendimento, consequentemente, perde-se a oportunidade de aprendizado para melhor induzir essa política pública, sob o contínuo risco de financiar empreendimentos inviáveis sem que o estado ou município tenha capacidade de operá-lo devido a limitações de natureza operacional e financeira, por exemplo, por causa de uma demanda não bem justificada inicialmente.

Adicionalmente, não se permite afirmar se as propostas apresentadas consideram todo o ciclo de vida do empreendimento, desde a concepção, passando pela construção até a sua operação, bem como se estão alinhados à Política Nacional de Mobilidade Urbana, aos planos de mobilidade urbana, planos diretores urbanos e, nos casos das regiões metropolitanas, aos planos de desenvolvimento urbano integrado.

A ausência de EVTEA e respectiva avaliação não permite avaliar os benefícios sociais e econômicos advindos dos investimentos propostos bem como impossibilita cotejar adequadamente as soluções alternativas para o empreendimento.

Além disso, a inexistência de avaliação dos EVTEAs impede saber se os benefícios estimados superam os custos com os projetos e execução das obras previstas, considerando todo o ciclo de vida do empreendimento. Dessa forma, devem ser avaliados indicadores de viabilidade, tais como a taxa interna de retorno, o valor presente líquido, acompanhada com a respectiva análise de sensibilidade e de riscos.

Ademais a falta de avaliação conclusiva dos EVTEAs em empreendimentos de mobilidade urbana aumenta o risco de atrasos e paralisações, não proporcionando o acesso universal à cidade, de forma inclusiva, segura, resiliente e sustentável nas aglomerações urbanas e nas regiões metropolitanas (ODS 11) .

III.9 Boas iniciativas, mas ainda incipientes e sem resultados medidos

Conforme análise da IN nº 16 do Ministério das Cidades, de 10 de julho de 2018, foi identificado que, no âmbito do Programa Avançar Cidades (modalidade de financiamento com recursos do FGTS) , há a previsão de financiar a elaboração de estudos para implantação e concepção de empreendimentos de mobilidade urbana, de forma isolada do empreendimento e previamente à liberação dos recursos para obras, tais como: estudos de demanda de passageiros, plano operacional de transporte, estudos de tráfego, estudo de origem/destino e estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental.

Destaca-se, porém, que não foi observado um plano sistemático de fomento para o desenvolvimento dos EVTEAs de projetos de transporte público de média e alta capacidade, por meio de apoio técnico ou financiamento, para os empreendimentos que são objeto de solicitações de recursos federais.

Além disso, o Programa Avançar Cidades funciona atualmente por meio do sistema chamado Selemob, no qual, de acordo com os gestores da SMDRU/MDR, há um fluxo contínuo na fase de seleção de empreendimentos permanentemente aberta antes da contratação para permitir o aperfeiçoamento das propostas e projetos conforme as regras atuais do MDR e da Caixa. Porém, a SMDRU/MDR não apresentou os resultados medidos advindos da implementação desse sistema.

Acerca do Selemob, considera-se que, a partir do estabelecimento dos critérios mínimos de avaliação e de manifestação conclusiva de EVTEAs, propostos na presente auditoria, esse sistema poderá ser uma ferramenta para a avaliação da maturidade dos projetos apresentados bem como para dar transparência a esse processo.

Portanto, observa-se que, não obstante o objetivo almejado pelas boas práticas no âmbito do Programa Avançar Cidades, verifica-se não haver, em parte por causa da incipiência dessas ações, resultados medidos e consolidados.

III.10 Conclusão e proposições

Pode-se afirmar que, em razão das entrevistas realizadas com gestores do ministério e da Caixa, da amostra de processos SEI do MDR selecionada pela equipe de auditoria, do histórico contido nos processos de controles externo afetos aos empreendimentos de TMA, a União, por meio da SMDRU/MDR, de forma sistemática, não buscou avaliar, direta ou indiretamente, a viabilidade dos projetos propostos por estados e municípios, abordando a concepção, a construção e a operação do empreendimento, seja com OGU seja com outras linhas de financiamento (FGTS e BNDES) , visando alinhar esses projetos com a PNMU, com os planos municipais (de mobilidade urbana e diretores) e com os de desenvolvimento urbano integrado.

Nesse ponto, faz-se necessário ressaltar a vultosa materialidade desses empreendimentos – alguns bilionários, como o caso do metrô de Fortaleza/CE -, que demandam da administração pública o mais alto rigor em sua concepção e análise, dado o princípio da eficiência insculpido na Constituição Federal de 1988 ao qual está submetida. Isso significa que, em um ambiente de recursos escassos – notadamente agravado pelo déficit fiscal por qual passa o país há anos – a aplicação dos recursos públicos precisa ser feita com base na avaliação dos melhores resultados a serem entregues para a sociedade ao menor custo, e isso só pode ser feito a partir de um profundo processo de planejamento, pelo qual passa a elaboração de um robusto EVTEA.

Ressalva-se, contudo, que não está sendo demandado que o MDR faça diretamente essa avaliação, porém, que o órgão assuma a responsabilidade pelo estabelecimento de critérios mínimos e da respectiva avaliação dos EVTEAs, ainda que externa ao ministério, da suficiência e da adequação dos EVTEAs – alinhando-os à Política Nacional de Mobilidade Urbana, aos planos de mobilidade urbana, aos planos diretores urbanos e aos planos de desenvolvimento urbano integrado, considerando a viabilidade durante todo o ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a operação dos empreendimentos – acompanhada da devida manifestação conclusiva, sendo realizada, por exemplo, por meio de conselho de projetos, externos ao MDR, formado por especialistas no assunto, ou por meio de cooperação com outras instituições que exercem essa atividade, a exemplo das citadas na seção IV deste relatório.

Ante o exposto, será proposto determinar ao Ministério do Desenvolvimento Regional que estabeleça critérios mínimos para utilizá-los na avaliação e manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade a serem contratados nos instrumentos de repasse federais bem como nos de financiamento, alinhando-os à Política Nacional de Mobilidade Urbana e aos planos de mobilidade urbana, aos planos diretores urbanos e aos planos de desenvolvimento urbano integrado, considerando a viabilidade durante todo o ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a operação dos empreendimentos.

Propõe-se ainda determinar ao Ministério do Desenvolvimento Regional que se abstenha de celebrar instrumentos de transferências de recursos federais bem como de financiamento cujos projetos não contenham avaliação do EVTEA acompanhado de manifestação conclusiva sobre sua suficiência e adequação, de acordo com os critérios mínimos que o órgão venha a estabelecer.

Será proposto recomendar ao Ministério do Desenvolvimento Regional que, ao estabelecer os critérios mínimos de avaliação e de manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade, considere: i) utilizar a estrutura básica apresentada na seção IV deste relatório de auditoria, feita com base em técnicas de comparação com referenciais; ii) a necessidade de participação externa ao ministério para realizar essa atividade; iii) a elaboração de normas e manual de procedimentos.

Propõe-se também recomendar ao Ministério do Desenvolvimento Regional que, ao avaliar e emitir manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade, após o estabelecimento dos critérios mínimos, considere a necessidade de participação externa ao ministério para realizar essa atividade.

Considerando as dificuldades técnicas apresentadas e a notória crise financeira pela qual enfrentam diversos municípios, será proposto recomendar que o Ministério do Desenvolvimento Regional considere incluir em seu plano estratégico instrumentos que estruturem um plano sistemático de fomento para o desenvolvimento dos EVTEAs de projetos de transporte público de média e alta capacidade, por meio de apoio técnico ou financiamento, para os empreendimentos que são objeto de solicitações de recursos federais, seja com recursos do tesouro federal ou com recursos de financiamento.

III.11 Benefícios esperados decorrentes da implementação das proposições

Entre os benefícios diretos esperados com o estabelecimento de critérios mínimos de avaliação e de manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação de EVTEA de empreendimentos TMA, no âmbito da Administração Pública Federal, juntamente com os demais atores envolvidos, podem ser citados:

suficiência e adequação da avaliação, de forma a cobrir os pontos relevantes envolvidos no EVTEA (aspectos técnicos, econômicos, financeiros, ambientais e de gestão de riscos) ;

aperfeiçoamento do processo decisório acerca da seleção do investimento financeiro, sendo possível identificar, mensurar e analisar os aspectos preponderantes do empreendimento, confrontando custos, receitas e benefícios a fim de se obter a melhor solução para um cenário pretendido;

maior celeridade aos processos, decorrente da pronta identificação de questões omissas, faltantes, pendentes ou incompletas e da tomada imediata de providências para correção;

padronização da avaliação e das conclusões, de forma que as manifestações técnicas resultantes da avaliação sejam consistentes e unívocas;

atrair investimentos das mais diversas fontes: pública, privada, nacional e internacional, a partir da melhoria e ampliação do ambiente de negócios tornando mais claro quais são os riscos e oportunidades do empreendimento proposto.

Em consequência, como benefício decorrente de avaliações de EVTEAs apropriadas, espera-se a contratação de empreendimentos de mobilidade urbana com comprovada viabilidade econômica, financeira, ambiental e social e compatíveis com a PNMU, com os planos de mobilidade, os planos diretores e os planos de desenvolvimento urbano integrado.

Como benefício advindo da abstenção de celebrar contratos de repasse federais bem como de financiamento cujos projetos não contenham avaliação do EVTEA, devidamente acompanhado de manifestação conclusiva sobre a sua suficiência e adequação, de acordo com os critérios mínimos que o órgão venha a estabelecer, espera-se evitar a dispersão e o desperdício dos recursos públicos e dar oportunidade ao incremento da eficiência do investimento e ao aprimoramento da ação de governo, de modo a maximizar os benefícios oriundos dos bens e serviços oferecidos pelo Estado, em prol da sociedade, especialmente i) a diminuição do tempo gasto no deslocamento entre o domicílio e o local de trabalho; ii) o aumento do percentual da população que fica próximo a uma estação de transporte público; e iii) a qualidade do serviço prestado.

Em relação à proposição de recomendar ao MDR que avalie a necessidade da participação externa ao ministério, a exemplo de conselho de projetos, formado por especialistas no assunto, ou da cooperação com outras instituições que exercem essa atividade, o benefício esperado é incrementar a independência e a qualidade da manifestação conclusiva, de caráter técnico, acerca dos EVTEAs apresentados pelos governos estaduais e municipais e, assim, melhorar a percepção acerca da qualidade dos projetos, de forma a aprimorar o ambiente de investimentos em infraestrutura de transporte público de média e alta capacidade.

Em relação ao benefício esperado da proposição de recomendar ao MDR considerar a formulação de normativos e manuais de procedimentos voltados para a apresentação e avaliação dos EVTEAs de empreendimentos TMA, podem ser citados:

mitigar o risco de ocorrer irregularidades relacionadas à insuficiência e inadequação dos EVTEAs apresentados no âmbito de processos de seleção e contratação dos empreendimentos;

maior celeridade aos processos, decorrente da pronta identificação de questões omissas, faltantes, pendentes ou incompletas e da tomada imediata de providências para correção;

estabelecimento de roteiro padronizado de avaliação, de forma que as manifestações técnicas resultantes da avaliação sejam consistentes e unívocas;

promover maior segurança jurídica aos stakeholders e aprimorar o ambiente de investimentos no setor de transporte público de média e alta capacidade.

Como benefício decorrente da proposição de recomendar ao MDR considerar incluir em seu plano estratégico os instrumentos que estruturem um plano sistemático de fomento técnico e financeiro para o desenvolvimento dos EVTEAs de TMA, para empreendimentos que são objeto de solicitações de recursos federais, seja com recursos do tesouro federal ou com recursos de financiamento, espera-se:

a contratação de empreendimentos de mobilidade urbana fundamentada em estudos aptos a comprovarem a viabilidade técnica, econômica, ambiental e social, compatíveis com a PNMU, com os planos de mobilidade, os planos diretores e os planos de desenvolvimento urbano integrado; e

gerar efeito multiplicador na atração de investimentos das mais diversas fontes: pública, privada, nacional e internacional, a partir do aumento da percepção da qualidade dos EVTEAs que acompanham os projetos, repercutindo no aumento do interesse dos diversos financiadores em infraestrutura de transporte público de média e alta capacidade.

V. ESTRUTURA BÁSICA DE ESTUDO DE VIABILIDADE TÉCNICA, ECONÔMICA E AMBIENTAL (EVTEA) PARA SISTEMAS DE MOBILIDADE URBANA

Considerando que o presente trabalho buscou, na origem, verificar em que medida os procedimentos de análise acerca da viabilidade técnica, econômica e ambiental, para a seleção de empreendimentos de TMA, no âmbito da SMDRU/MDR, estariam aderentes a referenciais de validade reconhecida, adotou-se, após ampla pesquisa, como fontes de informação e referências técnico-normativas acerca de Estudos de Viabilidade os documentos abaixo relacionados:

Guia TPC – Orientações para seleção de tecnologias e implementação de projetos de transporte público coletivo – KFW-BNDES-MCIDADES, 2017;

Caderno Técnico de Estudos de Viabilidade (Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos – ANPTrilhos, em parceria com o MDR) ;

The World Bank Group – Transport Sector Board – Aprimoramento do marco de avaliação de investimentos em infraestrutura de transportes rodoviários;

Manual de apresentação de estudos de viabilidade de projetos de grande vulto (Ministério do Planejamento; julho/2009) ;

Manual de Elaboração dos Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental – VALEC;

Manual de Procedimentos de Análise de EVTEA de Arrendamento Portuários – Antaq;

EVTEA de Empreendimento Ferroviário – DNIT;

Manual de Evaluación Económica de Proyectos de Transporte – BID;

Metodologia de Estruturação de Projetos de Infraestrutura – EPL.

Com base nos guias referenciais elencados, buscou-se verificar, em linhas gerais, os elementos entendidos como necessários de serem abordados em uma estrutura básica a fim de se obter um estudo de viabilidade em grau suficiente e adequado. Como resultado da citada revisão bibliográfica, apresenta-se abaixo os macrotópicos consolidados de um EVTEA padrão:

Figura 13 – Estrutura consolidada de EVTEA

IV.1. Avaliação Fundamental

A avaliação fundamental contempla um diagnóstico da rede de transportes local. Ou seja, a caracterização e avaliação do sistema de transporte de passageiros disponível, identificando fluxos de deslocamentos, potenciais de demanda, comparação com serviços similares existentes e/ou previstos bem como estrutura e conectividade da rede viária.

Para tanto, devem ser consideradas as orientações do PMU e/ou demais estudos ligados ao planejamento de expansão da rede de transporte e conexões entre modos.

Importa, ademais, a avaliação de eventual sinergia ou antagonismo com outros projetos e empreendimentos.

IV.1.1. Área de Influência

Nesta etapa se faz necessária a identificação, delimitação e caracterização da área de influência, entendida como o espaço geográfico cujas interações sociais e econômicas podem ser afetadas pela nova infraestrutura de transporte proposta.

A área de influência será¿ composta, portanto, pelas unidades geográficas (bairros, regiões e/ou municípios) que podem sofrer impacto econômico (setor produtivo) , logístico (atração de fluxos de transporte) ou social em decorrência da construção do novo sistema de transportes.

IV.1.2. Estudo de Demanda

Refere-se à prospecção da atual demanda por transporte na área de abrangência, servindo como base para simulações de receita na avaliação de viabilidade econômico-financeira do empreendimento.

Sobre a importância dos estudos para a previsão de demanda, no Caderno Técnico da ANPTrilhos encontra-se a seguinte afirmação:

Uma vez que os recursos econômicos e financeiros em países como o Brasil são extremamente limitados, o esforço requerido durante a etapa de planejamento almejando uma correta previsão da demanda por transporte, em nível estratégico, pode ser o fiel da balança para que se obtenha a mais correta alocação de recursos para a concepção do sistema. (Caderno Técnico de Estudos de Viabilidade – ANPTrilhos; p. 35) .

O referido documento elenca que, para a avaliação da demanda, devem-se elaborar, também, pesquisa Origem/Destino e estudos de propensão à transferência do modo de transporte. A determinação do potencial de propensão à mudança de modo deve se dar sob a ótica de variáveis, tais como: tarifa, tempo de viagem e conforto.

No Manual do Ministério do Planejamento (julho/2009) , consta a indicação de que o cálculo da oferta e da demanda relacionadas ao serviço de transportes deve englobar tanto o momento atual quanto uma projeção de futuro. O horizonte temporal a ser considerado para a projeção deve ser, no mínimo, igual a dez anos e, no máximo, igual a¿ vida útil estimada para o empreendimento.

Ademais, deve-se explicitar os parâmetros e premissas usadas na definição das taxas de projeção da demanda futura, sendo que, na projeção em comento, devem ser consideradas as hipóteses “sem projeto” e “com projeto”:

Para a hipótese “sem projeto”, trata-se de apresentar o cenário inercial, ou seja, a situação que perduraria caso o projeto não fosse realizado. Para a hipótese “com projeto”, trata-se de estimar, inclusive, o volume de usuários do produto do projeto” (Manual de apresentação de estudos de viabilidade de projetos de grande vulto, p. 12 – Ministério do Planejamento; julho/2009) .

IV.2. Estudos Técnicos e de Engenharia

Primeiramente, importa frisar que, da revisão bibliográfica realizada, verifica-se forte integração e interdependência entre os estudos técnicos e de engenharia e os estudos operacionais, não havendo, portanto, uma segmentação rígida acerca desses quesitos em muitos dos guias referenciais.

Consolidando o conteúdo contemplado nas seções referentes a estudos técnicos e de engenharia apresentadas nos diversos documentos consultados, sem que se tenha por finalidade apresentar um rol exaustivo, pode-se apresentar as seguintes ações:

Coleta e compilação de dados e documentos (topográficos; geotécnicos; climáticos e fluviométricos) ;

Definição dos parâmetros de projeto;

Estudos preliminares de engenharia (cartografia, topografia, geologia, hidrologia) ;

Definição das diretrizes técnicas, identificação e estudo das alternativas de traçado;

Detalhamento e estimativa de custos das alternativas; e

Caracterização de edificações, obras civis, sistemas de rede, sinalização e sistemas tarifários.

IV.3. Estudos Operacionais

Segundo o manual da VALEC, os Estudos Operacionais subsidiam a definição das características geométricas básicas do sistema de transporte, estabelecem as características, especificações e dimensionamento do material rodante e equipamentos necessários para atender as demandas previstas, definem as características da operação estabelecendo plano de via com capacidade suficiente para atender a programação e os sistemas necessários para o controle do tráfego com segurança.

Aprofundando o tema, no Caderno Técnico da ANPTrilhos verifica-se a indicação pela necessidade de elaboração de um Plano Operacional, contemplando:

identificação e definição de padrões de serviço: intervalo entre veículos, tempo de viagem comercialmente competitivo em relação aos demais modos, velocidade média, capacidade de transporte, nível de lotação e integração tarifária;

identificação da concorrência entre modos e proposta de otimização como premissa para definir a viabilidade financeira do negócio;

caracterização e dimensionamento da frota por tipo de serviço e o seu desempenho operacional (aceleração, desaceleração, rampa máxima, raio de curva etc.) ;

avaliação de alternativas de sinalização e fornecimento de energia para atender os padrões de serviços pré-determinados (estudo das tecnologias disponíveis) ;

identificação do potencial mercadológico e exploração comercial a fim de incrementar receitas não tarifárias;

identificação dos padrões de operação e manutenção;

definição dos critérios da segurança operacional; e

definição do potencial mercadológico.

Por fim, entende-se que, tendo como objetivo subsidiar a Avaliação Econômico-Financeira, ainda nesta etapa determinam-se os custos e despesas operacionais, bem como os investimentos para a implantação e manutenção da operação do sistema de transportes e a avaliação das receitas operacionais para cada alternativa.

IV.4. Avaliação Econômico-Financeira

Em síntese, quando se trata de um EVTEA de empreendimentos de qualquer natureza, a avaliação financeira (ou estudo de viabilidade econômico-financeira de projetos) esta¿ voltada para o fluxo financeiro, distinguindo-se o capital próprio e de terceiros, a fim de determinar a capacidade financeira do projeto e o retorno do capital investido.

Seguindo abordagem mais abrangente, quando a avaliação envolve a participação de entes públicos, esta deve ser conduzida de forma a demonstrar as despesas e receitas financeiras derivadas do projeto e que afetam, direta e indiretamente, o setor público.

Em linhas gerais, entende-se que, para que seja possível concluir-se pela viabilidade financeira, ou não, de um empreendimento de mobilidade urbana, a avaliação perpassa pela definição e estudo dos elementos indicados na Figura 14.

Mais especificamente, o Caderno Técnico de Estudos de Viabilidade (ANPTrilhos) propõe o seguinte conteúdo para uma avaliação financeira voltada à empreendimentos de mobilidade urbana:

identificação e estimativa de receitas operacionais (tarifárias e integradas) com base em estudo de demanda e cenários de extensão da linha;

identificação e estimativa de receitas não operacionais (empreendimentos mercadológicos coligados e exploração comercial dos espaços) ;

definição e destinação das receitas não operacionais, considerando a condicionante da modicidade tarifária;

definição do critério da partilha da tarifa das integrações;

definição da tarifa pública e da tarifa de remuneração do operador, contratado e/ou concessionário; e

definição dos indicadores: Taxa Mínima de Atratividade (TMA) , Taxa Interna de Retorno do Projeto e do Acionista (TIR) , Valor Presente Líquido (VPL) , payback simples e descontado, taxa de cobertura.

Figura 14 – Componentes de uma Avaliação Econômico-Financeira

Fonte: Manual de apresentação de estudos de viabilidade de projetos de grande vulto (Ministério do Planejamento) .

IV.5. Estudos Ambientais

Neste tópico a intenção recai em se avaliar a sustentabilidade ambiental, dada pela contribuição do projeto em assegurar o uso dos recursos naturais a gerações futuras. Para tanto são identificados, quantificados e valorados os impactos ambientais de cada uma das alternativas de projeto, a fim de que seja eleita aquela que maximize benefícios com o menor custo ambiental possível.

No tocante a¿ avaliação dos elementos que devem ser apresentados no EVTEA acerca dos quesitos ambientais, o principal objetivo e¿ verificar se a totalidade do projeto foi contemplada nos encaminhamentos aos órgãos ambientais competentes, de modo a haver mitigação a eventuais passivos ambientais identificados mediante inclusão no estudo de viabilidade dos custos associados.

O estudo ambiental deve contemplar, portanto, a indicação dos eventuais danos ambientais causados pela implantação do projeto e pela operação do empreendimento, acompanhados das respectivas medidas de mitigação: cálculo do “passivo ambiental líquido”.

Vale mencionar alguns aspectos ambientais, de caráter geral, a serem contemplados no EVTEA e observados na avaliação, caso a caso:

modificações substanciais no uso e na ocupação do solo da região de interesse;

necessidade de desmatamento;

emissões de poluentes no ar (motores, geradores e outros) ;

barulho derivado das operações;

poeira e/ou sujeira derivada das operações;

impacto visual;

recepção de lixo;

movimentação de cargas perigosas;

impactos logísticos significativos na área de influência, etc.

IV.6. Estudos Socioeconômicos

Conforme estabelecido no Manual da VALEC, os estudos em questão têm como objetivo fornecer aos gestores dos recursos públicos, por meio de uma avaliação socioeconômica e de indicadores de viabilidade socioeconômica do projeto analisado, elementos para priorização da alocação dos recursos em infraestrutura de transportes.

Envolve um processo de conhecimento, avaliação e interpretação da situação social na respectiva área de influência do projeto no que diz respeito à necessidade de transporte.

E¿ imprescindível caracterizar os aspectos socioeconômicos da área afetada pelo empreendimento, evitando a sobreposição de temas já¿ identificados em outros estudos do próprio EVTEA. Sugere-se que sejam identificados e avaliados os indicadores de desenvolvimento econômico e social da população, bem como expostos índices já¿ estabelecidos para uma apreciação socioeconômica da região. São exemplos de indicadores: dados sobre emprego, educação, Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) , entre outros.

Deve-se, portanto, dar destaque à importância social do empreendimento em análise, evidenciando os benefícios e as melhorias atribuídas a¿ alternativa logística considerada.

A abordagem socioeconômica na avaliação de projetos, de modo geral, resume-se em eleger a melhor alternativa de execução, visando otimizar esforços ao incluir, entre os objetivos básicos, além de crescimento econômico e da sustentabilidade ambiental, a equidade social.

Tabela 12 – Abordagem socioeconômica de projetos: crescimento x equidade

CRESCIMENTO ECONO¿MICO EQUIDADE SOCIAL
Oriundo da contribuição do projeto para o aumento de riqueza do país, sendo medida pelo valor presente líquido do fluxo de caixa gerado pelo projeto. Decorrente do potencial do projeto para redução das desigualdades espaciais (territoriais) e interpessoais da renda, sendo medido por um estudo de impacto distributivo.

Tem-se que o valor de mercado de um determinado bem ou serviço não reflete o seu valor econômico devido à existência de falhas de mercado. Com o intuito de atenuar essas distorções dos valores de mercado emprega-se, como numerário alternativo, os chamados preços sombra: (i) preços de eficiência; e (ii) preços sociais.

Preços de eficiência ou econômicos são aqueles resultantes do equilíbrio entre oferta e demanda, num mercado cujas imperfeiçoes estão ausentes ou foram corrigidas. Por exemplo, se o subsídio ao consumo e¿ o único instituto que distorce o preço de mercado de um bem, então o preço de eficiência desse bem resultaria pela supressão desse subsídio.

Preço social, por outro lado, e¿ o numerário obtido pela adição ao preço econômico de um projeto do seu impacto distributivo sobre a população afetada. Ou seja, como o valor atribuído a um benefício de um projeto e¿ relativo ao poder aquisitivo do beneficiário, podemos atribuir pesos diferentes aos custos e benefícios incorridos e gerados pelo projeto de acordo com o nível de renda da população afetada por esse projeto.

Tem-se, dessa forma, que a avaliação socioeconômica reside na avaliação econômica em conjunto com a avaliação de impacto.

IV.7. Avaliação de Risco

Conforme definição proposta pela Empresa de Planejamento e Logística (EPL) em seu documento “Metodologia de Estruturação de Projetos de Infraestrutura”, elaborado com a participação da KPMG, a avaliação de risco possui como objetivo estabelecer um plano de gerenciamento de riscos, de modo que sejam adotadas, desde o início do planejamento e da implementação do projeto, práticas coerentes, com o intuito de impedir que a execução do projeto ou de seus objetivos sejam prejudicados pela materialização de eventos incertos

Compreende a avaliação de sensibilidade do projeto no caso de aumentos nos custos ou redução dos benefícios (efeitos de variações nos parâmetros-chave) .

Esta etapa envolve, portanto, a discussão de possíveis pontos críticos do projeto e a descrição de ferramentas de monitoramento e avaliação.

Figura 15 – Componentes da Avaliação de Risco

Fonte: Manual de apresentação de estudos de viabilidade de projetos de grande vulto (Ministério do Planejamento)

Importa salientar que diversos dos guias referenciais utilizados propõe a elaboração de uma Matriz de Riscos, também conhecida como Matriz de Probabilidade e Impacto, sendo esta uma ferramenta de gerenciamento de riscos que permite de forma visual identificar quais são os riscos que devem receber mais atenção, tratando-se, portanto, de uma ferramenta de priorização de ações

Figura 16 – Exemplo de uma Matriz de Riscos

Fonte: Imagem obtida em pesquisa (googleusercontent.com)

O Guia TPC, em seu Anexo 3 – Orientações para o Projeto Funcional (p. 252-254) , apresenta os riscos mais frequentes associados à construção e implantação de sistemas de transporte público coletivo, acompanhados das respectivas formas de mitigação:

insuficiência de recursos públicos;

atraso nos processos administrativos;

surgimento de ocorrência de solo de baixa qualidade de suporte, matacões e outras;

surgimento de interferências com redes subterrâneas não identificadas;

capacidade de realização do executor;

atraso na liberação de recursos de financiamento;

atraso na obtenção de licenças;

dificuldades de integração com outros Sistemas de TPC;

dificuldade de realização dos processos de delegação dos serviços a operadores privados; e

demanda e receita tarifária abaixo do previsto.

Notadamente, a elaboração de um EVTEA suficiente e adequado, associada à sua posterior avaliação, possibilitariam a mitigação significativa de boa parte dos problemas relacionados.

IV.8. Principios económicos en la evaluación de proyectos e lecciones aprendidas

Importante mencionar os princípios econômicos aplicados na avaliação de projetos de infraestrutura bem como as lições aprendidas internacionalmente a partir do Manual de Evaluación Económica de Proyectos de Transporte – BID no uso análise custo-benefício (ACB) por agências nacionais e supranacionais. Entre 12 lições aprendidas que foram citadas, ressalta-se o risco histórico e sistemático na subestimação dos custos e na superestimação na demanda em transporte, o que destaca a importância da avaliação suficiente e adequada das premissas, das alternativas de solução e da viabilidade do empreendimento.

V. COMENTÁRIOS DOS GESTORES

Com o objetivo de possibilitar aos gestores se manifestarem sobre as questões analisadas, a versão preliminar deste relatório (peça 19) foi remetida ao MDR por meio do Ofício 38216/2020-TCU/Seproc (peça 22) , com achado, conclusões e propostas de encaminhamento, em cumprimento ao disposto nos parágrafos 144 a 148 das Normas de Auditoria do Tribunal de Contas da União (NATs) , aprovadas pela Portaria TCU 280/2010 e alterada pela Portaria TCU 168/2011 e nos parágrafos 148, 174 e 185-189 do Manual de Auditoria de Natureza Operacional, aprovado pela Portaria TCU 144/2000 e revisado pela Portaria Segecex 4/2010. Diante disso, o órgão solicitou prorrogação de prazo para manifestação (peças 23 e 25) , a qual foi concedida (peça 26) , e os comentários do gestor foram encaminhados ao TCU por meio do Ofício nº 507/2020/AECI/Gabinete SE-MDR, acompanhado da Nota Técnica nº 127/2020/CGAEM/DEMOB/SMDRU-MDR (peça 27) .

A referida nota técnica, nos itens 4.5.1 e 4.5.2 (peça 27, p. 7-8) , ao observar que a proposta de determinação específica que a análise do EVTEA deve ser feita antes do ato de celebração do instrumento de transferência, aponta que não há especificação do momento dessa análise, se deverá ocorrer de forma concomitante ou posterior ao enquadramento e seleção da proposta. Quanto a esse apontamento, a equipe de auditoria entende que a escolha do momento para a avaliação do EVTEA dos projetos financiados com OGU ou com recursos onerosos deve ser feita pelos gestores do MDR, dentro do seu espaço de discricionariedade avaliando a melhor oportunidade para fazê-la, porém, ressalta-se, desde que seja feita antes da celebração do instrumento de transferência de recursos federais.

Sobre a necessidade de exigir e avaliar a adequação dos EVTEAs, antes da celebração de instrumentos de transferências de recursos federais, fundamentado no art. 20 da Portaria Interministerial 424/2016, que revogou a Portaria Interministerial nº 507, de 24 de novembro de 2011, o qual estabelece que o plano de trabalho será analisado quanto à sua viabilidade e adequação aos objetivos do programa, o TCU se pronunciou a respeito, conforme decisão transcrita abaixo:

Acórdão 2416/2012-TCU-Plenário

9.3. determinar ao Ministério da Integração Nacional que se abstenha de celebrar convênios sem que exista estudo de viabilidade adequado do empreendimento, em atenção ao disposto no art. 26 da Portaria Interministerial nº 507, de 24 de novembro de 2011, e ao art. 6º, inciso IX, c/c art. 116 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993 (grifo acrescido) ;

Adicionalmente, considera-se que a análise de viabilidade citada no art. 20 da Portaria Interministerial 424/2016 deve ser interpretada em conjunto com os estudos técnicos preliminares do projeto básico – estabelecidos no art. 6º, inciso IX c/c art. 116 da Lei 8.666/1993, no art. 2º, inciso IV, da Lei 12.462/2011 e no art. 42, inciso VIII, da Lei 13.303/2016 – que assegurem a viabilidade técnica, econômico-financeira e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento.

Observa-se também que a redação do art. 26 da Portaria Interministerial nº 507/2011, utilizado à época como critério normativo no item 9.3 do Acórdão 2416/2012-TCU-Plenário, está reproduzida nos mesmos termos do artigo 20 da Portaria Interministerial 424/2016, atualmente vigente.

Em relação à solicitação de esclarecimentos quanto a tipologia de intervenções que devem se aplicar a análise do EVTEA (peça 27, p. 7 e 9) , a equipe de auditoria observa que a proposta de encaminhamento não faz distinção se a intervenção se trata de implantação, expansão ou reforma, cabendo ao MDR ponderar o impacto do projeto no sistema de transporte público do proponente em associação com o custo-benefício da profundidade e extensão da avaliação do EVTEA.

Cabe ressaltar que a proposta de determinação ao MDR está alinhada ao art. 5º da Resolução-TCU 315, de 22 de abril de 2020, que dispõe sobre a elaboração de deliberações que contemplem medidas a serem tomadas pelas unidades jurisdicionadas no âmbito do TCU, estabelecendo que:

As determinações devem indicar a ação ou a abstenção necessárias e suficientes para alcance da finalidade do controle, sem adentrar em nível de detalhamento que restrinja a discricionariedade do gestor quanto à escolha dos meios para correção da situação irregular, salvo se o caso exigir providência específica para o exato cumprimento da lei. (grifo nosso)

Quanto à dúvida apresentada pelo MDR (peça 27, p. 8-9) em relação à recomendação de participação externa na atividade de avaliar e emitir manifestação conclusiva sobre o EVTEA, a equipe de auditoria considera que o MDR deve ter por objetivo desenvolver critérios de avaliação e manifestação conclusiva próprios, levando-se em conta as particularidades e características de contratação de empreendimentos com recursos do OGU ou de financiamento oneroso com recursos do FGTS. Observa-se que o relatório de auditoria trouxe na seção V uma estrutura básica de avaliação de EVTEA feita com base em técnica de comparação com referenciais de instituições que realizam essa atividade, indicando ser possível a participação daquelas instituições para colaborarem com o desenvolvimento dessa atividade, não se limitando, porém, a elas.

Na hipótese de o MDR utilizar a experiência da participação externa, acerca da dúvida levantada (peça 27, p.8) sobre a forma de decisão de um colegiado para avaliação dos EVTEAs, se de caráter deliberativo ou consultivo, a equipe de auditoria esclarece que esta deve ser uma escolha do órgão, porém, ao final do processo, e antes da contratação, o MDR deve se responsabilizar para que a avaliação e a manifestação conclusiva sejam feitas respaldadas em critérios técnicos.

Com relação à recomendação ao MDR de incluir em seu plano estratégico instrumentos que estruturem um plano sistemático de fomento, por meio de apoio técnico e/ou financiamento, para o desenvolvimento dos EVTEAs de projetos de TMA, o órgão afirma que o instrumento foi instituído no Plano Estratégico Institucional (PEI) 2019-2023 “com previsão de investimento para elaboração de Planos de Mobilidade Urbana e apoio a projetos de transporte público coletivo, que inclui elaboração de EVTEAs e projetos executivos”.

Da leitura do referido plano estratégico, conforme publicação no site do órgão em 2/9/2020, no endereço eletrônico https://www.gov.br/mdr/pt-br/acesso-a-informacao/institucional/planejamento-estrategico-institucional, a equipe de auditoria não observou, especificamente, a previsão sistemática de fomento a EVTEAs de projetos de transporte de média e alta capacidade. Conforme observado ao longo deste relatório, chama-se a atenção para a alta materialidade, relevância e risco que estão associados os projetos de TMA. Dessa forma, considera-se de sensível importância que o plano sistemático de fomento aos EVTEAs de TMA, que são objeto de solicitação de recursos do tesouro federal ou de financiamento oneroso, esteja destacado de forma específica no plano estratégico do MDR.

Por fim, foi incorporada a sugestão do MDR (peça 27, p. 8-9) de enviar as propostas de encaminhamento ao Conselho Curador do FGTS e a Caixa Econômica Federal, em razão de sua participação no processo de operações de crédito no âmbito do Programa Pró-Transporte, como Agente Operador do FGTS, ressaltando, todavia, a responsabilidade primária do MDR em relação às propostas de encaminhamento constantes deste relatório.

VI. CONCLUSÃO

A presente auditoria teve por objetivo verificar em que medida as análises acerca da viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade são suficientes e aderentes aos princípios e diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, bem como a referenciais que abordam o tema, possibilitando a contratação, a entrega e a operação de empreendimentos viáveis do ponto de vista técnico, econômico e ambiental.

Para alcançar o objetivo, foram elaboradas as seguintes questões de auditoria:

Questão 1 – As análises acerca dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade verificam a aderência dos projetos aos planos de mobilidade urbana, planos diretores urbanos e, nos casos das regiões metropolitanas, aos planos de desenvolvimento urbano integrado?

Questão 2 – As análises acerca dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade consideram todo o seu ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a sua operação?

Verificou-se que o Ministério do Desenvolvimento Regional não realiza, direta ou indiretamente, de forma sistemática, a avaliação de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade nem possui normativos e manuais que regulem as rotinas e procedimentos voltados para a apresentação desses estudos pelos estados e municípios, o que configura alto risco de aplicar recursos federais em empreendimentos sem viabilidade com a ineficiente alocação de recursos públicos, impactando a efetividade dos serviços de mobilidade urbana nas cidades e a melhoria da qualidade de vida da população.

A partir de entrevistas aos gestores responsáveis pela seleção de empreendimentos de mobilidade urbana para o recebimento de recursos federais, seja por meio do OGU ou do FGTS, constatou-se não haver no âmbito do MDR e na Caixa normas, manuais ou procedimentos sistemáticos que visassem à avaliação de estudos de viabilidade de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade.

A verificação dos processos administrativos de empreendimentos de TMA da SMDRU/MDR confirmou que não são realizadas avaliações de estudos de viabilidade ao longo dos processos de seleção e contratação dos empreendimentos no âmbito da secretaria, seja para empreendimentos financiados por meio do OGU ou do FGTS. Nos empreendimentos objeto de financiamento pelo FGTS, verificou-se que a Caixa realiza uma análise de viabilidade da proposta; a qual se resume, no entanto, à viabilidade técnica de engenharia, à precificação do objeto e à condição de pagamento do ente subnacional, não se confundindo com uma avaliação de EVTEA.

Em um dos únicos casos em que o EVTEA esteve presente, foi apenas considerado como referência de cronograma e orçamento, sem qualquer avaliação de suas premissas, de alternativas de solução e quanto à viabilidade econômico-financeira e ambiental do empreendimento, a exemplo do que foi visto no processo de monitoramento da Linha 2 do Sistema Metroviário de Salvador e Lauro de Freitas, etapa de OGU. A existência do EVTE, no entanto, é creditada ao fato de se tratar de um empreendimento que foi objeto de PPP estadual, cuja competência para avaliação cabe aos órgãos estaduais, conforme jurisprudência deste TCU, sem relação, portanto, com o processo de avaliação que deveria ser promovido pelos órgãos federais no caso de obras públicas custeadas com recursos de transferências voluntárias ou financiamento oneroso.

O cenário de riscos incorridos devido à ausência de avaliação de EVTEA pôde ser bem visto no exemplo da Linha Leste do Metrô de Fortaleza e do VLT de Cuiabá, dentre outros citados neste relatório. Diante do cenário provável identificado de baixa viabilidade da PPP, há alto risco de comprometer enormes volumes de recursos públicos, federais e estaduais, além de elevados esforços, para entregar obras que ao fim não teriam o interesse privado na operação da PPP (modelo pensado pelo estado do Ceará) . Ou, de outra forma, que ficariam nas mãos do estado para operação, o que comprometeria o seu orçamento de uma forma não prevista, com elevados riscos de se chegar à paralisação do empreendimento ou a uma operação forçada sem o planejamento que seria necessário, com grandes possibilidades de impacto na qualidade e no custo do serviço. Todo esse cenário poderia ter sido mais bem saneado e talvez até evitado se houvesse uma consideração adequada da consecução e da operação do empreendimento, por meio de uma avaliação do EVTEA.

Como resultado da pesquisa realizada em processos de controle externo anteriores a esta auditoria operacional, tendo como foco a atuação da SMDRU acerca da realização de avaliações de estudos de viabilidade, verificou-se que, na amostra de doze processos de controle externo que possuíam como objeto transporte público de média e alta capacidade, selecionados com base em critérios de materialidade e relevância, em 92% dos casos foram constatadas irregularidades relacionadas à inconsistência e/ou falta de avaliação prévia do EVTEA no processo de seleção e contratação dos empreendimentos.

A partir da planilha representativa da carteira da SMDRU/MDR verificou-se que, de um total de 48 contratos de transporte público de média e alta capacidade, nove estão com suas obras paralisadas, representando um total de 1,93 bilhão de reais de recursos federais mais 2,27 bilhões de reais em contrapartida. Esses empreendimentos paralisados possuem um tempo médio de contrato (União e ente subnacional) de 87 meses, configurando-se para a população localizada nessas cidades, a maioria em médias e grandes cidades, capitais e regiões metropolitanas, uma falta do serviço demasiada, se considerar que sete dessas obras são de BRT’s, tipo de obra de menor complexidade para implementação em comparação aos demais modais de média e alta capacidade sob trilhos.

A equipe de auditoria também verificou, com base nos dados da planilha da carteira de empreendimentos da SMDRU/MDR bem como a análise dos processos SEI fornecidos pela secretaria, que alguns dos contratos em execução extrapolaram demasiadamente o prazo inicial planejado para entrega do bem público à sociedade.

Tabela 13 – Valor dos empreendimentos em atraso em relação ao prazo inicialmente planejado

Empreendimento Atraso na entrega do empreendimento em relação ao planejado (em meses) Valor dos recursos federais – OGU e Financiamento
Monotrilho-Trecho 1 da Linha 17 Ouro do Aeroporto de Congonhas 71 R$ 1,08 bilhão
BRT Transbrasil 51 R$ 1,09 bilhão
Metrô-DF 38, pode chegar a 70 R$ 630 milhões
Linha Leste do Metrô de Fortaleza 20, pode chegar a 38 R$ 1,66 bilhão
Valor total de recursos federais 4,46 bilhões de reais

Fonte: Planilha da carteira de empreendimentos da SMDRU/MDR

O cenário da carteira da SMDRU/MDR apresentado, reflete uma estrutura deficiente no órgão federal para analisar e avaliar a viabilidade dos empreendimentos abordando todo o ciclo de vida do empreendimento (concepção, construção e operação) . A ausência de avaliação de forma conclusiva sobre os estudos de viabilidade de grandes projetos de transporte público é condição, embora não completamente determinante, para a ocorrência dos diversos problemas enfrentados pela sociedade brasileira no setor de infraestrutura, tais como obras atrasadas, paralisadas ou, no caso daquelas finalizadas, sem atender a demanda projetada.

Pode-se afirmar que, em razão das entrevistas realizadas com gestores do ministério e da Caixa, da amostra de processos SEI selecionada pela equipe de auditoria, do histórico contido nos processos de controles externo afetos aos empreendimentos de TMA, a União, por meio da SMDRU/MDR, de forma sistemática, não buscou avaliar a viabilidade dos projetos propostos por estados e municípios, abordando a concepção, a construção e a operação do empreendimento, seja com OGU seja com outras linhas de financiamento (FGTS e BNDES) , bem como não se viu a exigência e avaliação acerca do alinhamento desses projetos com a PNMU, com os planos municipais (de mobilidade urbana e diretores) e com os de desenvolvimento urbano integrado.

Como efeitos decorrentes da situação encontrada podem ser citados o alto risco, em virtude da alta probabilidade e alto impacto, de o MDR estar financiando projetos que: não seguem critérios técnicos, sujeitos a pressões para seleção e contratação de empreendimentos de TMA; ii) não estejam alinhados com os planos municipais (de mobilidade urbana e diretores) e de desenvolvimento urbano integrado; iii) não apresentam a melhor solução em termos de custo/benefício; iv) não possuem a devida maturidade necessária; v) não foram cotejados adequadamente com soluções alternativas; vi) não são viáveis do ponto de vista técnico, econômico ou ambiental, considerando todo o ciclo de vida (concepção, construção e operação) ; e vii) possam incorrer em atrasos e paralisações.

Além disso, pode ocorrer uma má implementação e aperfeiçoamento da Política Nacional de Mobilidade Urbana, à medida em que não se registra nem se avalia a qualidade dos projetos apresentados, perdendo-se a oportunidade de aprendizado para melhor induzir essa política pública, sob o contínuo risco de financiar empreendimentos inviáveis sem que o estado ou município tenha capacidade de operá-lo devido a limitações de natureza operacional e financeira, por exemplo.

Em todos os casos, a materialização desses riscos importa em alocação ineficiente e mau uso dos escassos recursos públicos e baixa efetividade da política, representando, em diferentes níveis, a falta de melhoria das condições de mobilidade nas cidades que a aplicação de tais recursos poderia proporcionar à população, impedindo o acesso universal à cidade, de forma inclusiva, segura, resiliente e sustentável.

Acerca das referências utilizadas nesta auditoria, em relação aos dispositivos da PNMU apresentados na seção III.2, destaca-se que a União deve fomentar a implantação de empreendimentos TMA e, também, atender aos princípios e diretrizes previstos na Lei 12.587/2012, sendo um dos princípios o desenvolvimento sustentável das cidades, nas dimensões socioeconômicas e ambientais e, uma das diretrizes, a garantia de sustentabilidade econômica das redes de transporte público coletivo de passageiros, de modo a preservar a continuidade, a universalidade e a modicidade tarifária do serviço. Por sua vez, o desenvolvimento sustentável das cidades (Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 11) , nessas dimensões, pressupõe que os empreendimentos de transporte público sejam viáveis.

Ademais, em razão do princípio da eficiência na administração pública, o termo fomentar deve ser entendido da maneira mais ampla, no sentido técnico e financeiro, inclusive para, ao financiar os estudos e projetos propostos pelos estados e municípios, a União possa dar a esses recursos públicos o melhor uso possível, gerando eficiência no gasto público e incremento na qualidade dos serviços públicos prestados.

A partir do arcabouço de normas constitucionais, legais e infralegais, juntamente com as decisões do TCU desenvolvido na seção III.2, verifica-se, a partir de uma visão sistêmica, que é possível afirmar a obrigação da União, representada pelo MDR e pela Caixa, para exigir e avaliar os EVTEAs dos projetos de mobilidade urbana por ela financiados, seja com OGU ou com outras linhas de financiamento, especialmente os de média e alta capacidade, utilizando critérios mínimos suficientes e com nível de precisão adequado, em razão da complexidade técnica dos projetos de TMA, dos riscos envolvidos (econômicos e ambientais) , da sua relevância social e econômica e também de sua alta materialidade, alinhando os projetos à PNMU e aos planos municipais (de mobilidade urbana e diretores) aos de desenvolvimento urbano integrado, considerando a viabilidade por todo ciclo de vida, desde a concepção, construção até a operação do empreendimento.

As principais causas identificadas para a ocorrência das situações encontradas podem ser citadas: i) deficiência na estrutura do órgão de modo a permitir avaliação adequada de EVTEAs, em função do caráter multidisciplinar, havendo a necessidade de apoio de outras instituições; ii) a Caixa, da mesma forma, além da deficiência técnica, entende que a legislação e o seu contrato de prestação de serviço com o MDR não lhe atribuem essa atividade; iii) baixo índice de governança, quanto à institucionalização de normas e procedimentos para a execução da política. Esse nível reduzido de institucionalização de normas, conforme verificado nesta auditoria, também se apresenta em relação aos critérios mínimos de avaliação de EVTEAs e de manifestação conclusiva dos empreendimentos de transporte de média e alta capacidade.

Ressalva-se, contudo, que não está sendo demandado que o MDR faça diretamente essa avaliação, porém, que o órgão assuma a responsabilidade pelo estabelecimento de critérios mínimos e da respectiva avaliação dos EVTEAs, ainda que externa ao ministério, da suficiência e da adequação dos EVTEAs – alinhando-os à Política Nacional de Mobilidade Urbana, aos planos de mobilidade urbana, aos planos diretores urbanos e aos planos de desenvolvimento urbano integrado, considerando a viabilidade durante todo o ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a operação dos empreendimentos – acompanhada da devida manifestação conclusiva, sendo realizada, por exemplo, por meio de conselho de projetos, externos ao MDR, formado por especialistas no assunto, ou por meio de cooperação com outras instituições que exercem essa atividade, a exemplo das citadas na seção IV deste relatório.

Nesse sentido, relevante destacar a existência do conselho de projetos em outros modelos de avaliação de projetos internacionalmente reconhecidos, a exemplo do Business Case do Reino Unido, especificamente na publicação Infrastructure Business Case: International Guidance, p. 72. Ou seja, esse benchmark nos traz a indicação de uma boa prática que pode ser utilizada. A título exemplificativo, tendo essa referência como base teórica, o conselho de projetos seria responsável técnico pela avaliação dos estudos de viabilidade, podendo contar com outros especialistas, quando apropriado, por exemplo, para fornecer asseguração sobre o EVTEA, antes de ser submetido aos gestores do MDR.

Em complemento, esta auditoria buscou apresentar na seção V, em linhas gerais e com base nos guias referenciais pesquisados, os elementos entendidos como necessários de serem abordados em uma estrutura básica a fim de se obter um estudo de viabilidade em grau suficiente e adequado. A estrutura básica de um EVTEA para sistemas de mobilidade urbana deve conter: avaliação fundamental, área de influência, estudo de demanda, estudos técnicos e de engenharia, estudos operacionais, avaliação econômico-financeira, estudos ambientais, estudos socioeconômicos e avaliação de risco.

Ante o exposto, será proposto determinar ao Ministério do Desenvolvimento Regional que estabeleça critérios mínimos para utilizá-los na avaliação e manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade a serem contratados nos instrumentos de repasse federais bem como nos de financiamento, alinhando-os à Política Nacional de Mobilidade Urbana e aos planos de mobilidade urbana, aos planos diretores urbanos e aos planos de desenvolvimento urbano integrado, considerando a viabilidade durante todo o ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a operação dos empreendimentos.

Propõe-se ainda determinar ao Ministério do Desenvolvimento Regional que se abstenha de celebrar instrumentos de transferências de recursos federais bem como de financiamento cujos projetos não contenham avaliação do EVTEA acompanhado de manifestação conclusiva sobre sua suficiência e adequação, de acordo com os critérios mínimos que o órgão venha a estabelecer.

Será proposto recomendar ao Ministério do Desenvolvimento Regional que, ao estabelecer os critérios mínimos de avaliação e de manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade, considere: i) utilizar a estrutura básica apresentada na seção IV deste relatório de auditoria, feita com base em técnicas de comparação com referenciais; ii) a necessidade de participação externa ao ministério para realizar essa atividade; iii) a elaboração de normas e manual de procedimentos.

Propõe-se também recomendar ao Ministério do Desenvolvimento Regional que, ao avaliar e emitir manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade, após o estabelecimento dos critérios mínimos, considere a necessidade de participação externa ao ministério para realizar essa atividade.

Considerando as dificuldades técnicas apresentadas e a notória crise financeira que enfrentam diversos municípios, será proposto recomendar que o Ministério do Desenvolvimento Regional considere incluir em seu plano estratégico instrumentos que estruturem um plano sistemático de fomento para o desenvolvimento dos EVTEAs de projetos de transporte público de média e alta capacidade, por meio de apoio técnico ou financiamento, para os empreendimentos que são objeto de solicitações de recursos federais, seja com recursos do tesouro federal ou com recursos de financiamento.

Entre os benefícios diretos esperados com o estabelecimento de critérios mínimos de avaliação e de manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação de EVTEAs de empreendimentos TMA, no âmbito da Administração Pública Federal, juntamente com os demais atores envolvidos, podem ser citados:

suficiência e adequação da avaliação, de forma a cobrir os pontos relevantes envolvidos no EVTEA (aspectos técnicos, econômicos, financeiros, ambientais e de gestão de riscos) ;

aperfeiçoamento do processo decisório acerca da seleção do investimento financeiro, sendo possível identificar, mensurar e analisar os aspectos preponderantes do empreendimento, confrontando custos, receitas e benefícios a fim de se obter a melhor solução para um cenário pretendido;

maior celeridade aos processos, decorrente da pronta identificação de questões omissas, faltantes, pendentes ou incompletas e da tomada imediata de providências para correção;

padronização da avaliação e das conclusões, de forma que as manifestações técnicas resultantes da avaliação sejam consistentes e unívocas;

atrair investimentos das mais diversas fontes: pública, privada, nacional e internacional, a partir da melhoria e ampliação do ambiente de negócios tornando mais claro quais são os riscos e oportunidades do empreendimento proposto.

Em consequência, como benefício decorrente de avaliações de EVTEAs apropriadas, espera-se a contratação de empreendimentos de mobilidade urbana com comprovada viabilidade econômica, financeira, ambiental e social e compatíveis com a PNMU, com os planos de mobilidade, os planos diretores e os planos de desenvolvimento urbano integrado.

Como benefício advindo da abstenção de celebrar contratos de repasse federais bem como de financiamento cujos projetos não contenham avaliação do EVTEA, devidamente acompanhado de manifestação conclusiva sobre a sua suficiência e adequação, de acordo com os critérios mínimos que o órgão venha a estabelecer, espera-se evitar a dispersão e o desperdício dos recursos públicos e dar oportunidade ao incremento da eficiência do investimento e ao aprimoramento da ação de governo, de modo a maximizar os benefícios oriundos dos bens e serviços oferecidos pelo Estado, em prol da sociedade, especialmente i) a diminuição do tempo gasto no deslocamento entre o domicílio e o local de trabalho; ii) o aumento do percentual da população que fica próximo a uma estação de transporte público; e iii) a qualidade do serviço prestado.

Em relação à proposição de recomendar ao MDR que avalie a necessidade da participação externa ao ministério, a exemplo de conselho de projetos, formado por especialistas no assunto, ou da cooperação com outras instituições que exercem essa atividade, o benefício esperado é incrementar a independência e a qualidade da manifestação conclusiva, de caráter técnico, acerca dos EVTEAs apresentados pelos governos estaduais e municipais e, assim, melhorar a percepção acerca da qualidade dos projetos, de forma a aprimorar o ambiente de investimentos em infraestrutura de transporte público de média e alta capacidade.

Em relação ao benefício esperado da proposição de recomendar ao MDR considerar a formulação de normativos e manuais de procedimentos voltados para a apresentação e avaliação dos EVTEAs de empreendimentos TMA, podem ser citados:

mitigar o risco de ocorrer irregularidades relacionadas à insuficiência e inadequação dos EVTEAs apresentados no âmbito de processos de seleção e contratação dos empreendimentos;

maior celeridade aos processos, decorrente da pronta identificação de questões omissas, faltantes, pendentes ou incompletas e da tomada imediata de providências para correção;

estabelecimento de roteiro padronizado de avaliação, de forma que as manifestações técnicas resultantes da avaliação sejam consistentes e unívocas;

promover maior segurança jurídica aos stakeholders e aprimorar o ambiente de investimentos no setor de transporte público de média e alta capacidade.

Como benefício decorrente da proposição de recomendar ao MDR considerar incluir em seu plano estratégico os instrumentos que estruturem um plano sistemático de fomento técnico e financeiro para o desenvolvimento dos EVTEAs de TMA, para empreendimentos que são objeto de solicitações de recursos federais, seja com recursos do tesouro federal ou com recursos de financiamento, espera-se:

a contratação de empreendimentos de mobilidade urbana fundamentada em estudos aptos a comprovarem a viabilidade técnica, econômica, ambiental e social, compatíveis com a PNMU, com os planos de mobilidade, os planos diretores e os planos de desenvolvimento urbano integrado; e

gerar efeito multiplicador na atração de investimentos das mais diversas fontes: pública, privada, nacional e internacional, a partir do aumento da percepção da qualidade dos EVTEAs que acompanham os projetos, repercutindo no aumento do interesse dos diversos financiadores em infraestrutura de transporte público de média e alta capacidade.

VII. PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

Ante o exposto, submete-se o presente relatório à consideração superior com as seguintes propostas:

Determinar ao Ministério do Desenvolvimento Regional, com fundamento no art. 43, inciso I da Lei 8.443/1992, c/c art. 250, inciso II do Regimento Interno do Tribunal de Contas da União; art. 2º, inciso I, e art. 4º, inciso II da Resolução-TCU 315, de 2020, consoante o disposto no art. 6º, inciso IX, c/c art. 116 da Lei 8.666/1993; arts. 19, 20 e 21 da Portaria Interministerial 424/2016; art. 5º, inciso II, e art. 6º, inciso VIII, da Lei 12.587/2012, que:

a.1) no prazo de 150 dias, estabeleça critérios mínimos para utilizá-los na avaliação e manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade a serem contratados nos instrumentos de repasse federais bem como nos de financiamento, alinhando-os à Política Nacional de Mobilidade Urbana e aos planos de mobilidade urbana, aos planos diretores urbanos e aos planos de desenvolvimento urbano integrado, considerando a viabilidade durante todo o ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a operação dos empreendimentos;

a.2) abstenha-se de celebrar instrumentos de transferências de recursos federais bem como de financiamento cujos projetos não contenham avaliação do EVTEA acompanhado de manifestação conclusiva sobre sua suficiência e adequação, de acordo com os critérios mínimos que o órgão venha a estabelecer.

Recomendar ao Ministério do Desenvolvimento Regional, com fundamento no art. 43, inciso I, da Lei 8.443/1992, c/c art. 250, inciso III do Regimento Interno do Tribunal de Contas da União; art. 2º, inciso III, e art. 11 da Resolução-TCU 315, de 2020, consoante o disposto no art. 5º, inciso II, c/c art. 6º, inciso VIII, e art. 16, incisos IV e VI da Lei 12.587/2012; e levando em consideração os benchmarks apresentados neste relatório, que:

b.1) ao estabelecer os critérios mínimos de avaliação e de manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade, considere:

b.1.1) utilizar a estrutura básica apresentada na seção IV deste relatório de auditoria, feita com base em técnicas de comparação com referenciais;

b.1.2) a necessidade de participação externa ao MDR para realizar essa atividade;

b.1.3) a elaboração de normas e manual de procedimentos.

b.2) ao avaliar e emitir manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade, após o estabelecimento dos critérios mínimos, considere a necessidade de participação externa ao MDR para realizar essa atividade.

b.3) avalie incluir em seu plano estratégico instrumentos que estruturem um plano sistemático de fomento, por meio de apoio técnico e/ou financiamento, para o desenvolvimento dos EVTEAs de projetos de transporte público de média e alta capacidade que são objeto de solicitações de recursos federais, seja com recursos do tesouro federal ou com recursos de financiamento.

Informar a Caixa Econômica Federal e ao Conselho Curador do FGTS acerca do acórdão que vier a ser proferido, destacando que o relatório e o voto que fundamentam a deliberação ora encaminhada podem ser acessados por meio do endereço eletrônico http://www.tcu.gov.br/acordaos.

Nos termos do art. 8º c/c art. 17, § 2º, da Resolução-TCU 315, de 2020, fazer constar, na ata da sessão em que estes autos forem apreciados, comunicação do relator ao colegiado no sentido de monitorar as recomendações contidas nos itens “b.1”, “b.2” e “b.3.

2. O Secretario de Fiscalização de Infraestrutura Urbana manifestou sua anuência às propostas da equipe de auditoria, com a seguinte ressalva (peça 35) :

Trata-se de Auditoria Operacional realizada em empreendimentos de transporte de média e alta capacidade (TMA) financiados com recursos federais. Desde logo, manifesto-me de acordo com a profícua análise técnica efetuada pela equipe de fiscalização. Registro também minha concordância com a conclusão oferecida e com a proposta de encaminhamento, a qual tem alto potencial transformador no tocante à efetividade e eficiência na aplicação de recursos públicos federais na temática mobilidade urbana. Registro, apenas de forma complementar, pequena exposição de motivos quanto aos fundamentos da determinação ora proposta.

Conforme consta do Relatório de Fiscalização, diante do alto risco de o Ministério do Desenvolvimento Regional celebrar instrumentos de repasse de recursos para TMAs sem viabilidade técnica, econômica e ambiental, a equipe de fiscalização trouxe, dentre outras propostas, a seguinte:

Determinar ao Ministério do Desenvolvimento Regional, com fundamento no art. 43, inciso I da Lei 8.443/1992, c/c art. 250, inciso II do Regimento Interno do Tribunal de Contas da União; art. 2º, inciso I, e art. 4º, inciso II da Resolução-TCU 315, de 2020, consoante o disposto no art. 6º, inciso IX, c/c art. 116 da Lei 8.666/1993; arts. 19 e 20 da Portaria Interministerial 424/2016; art. 5º, inciso II, e art. 6º, inciso VIII, da Lei 12.587/2012, que:

a.1) no prazo de 150 dias, estabeleça critérios mínimos para utilizá-los na avaliação e manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade a serem contratados nos instrumentos de repasse federais bem como nos de financiamento, alinhando-os à Política Nacional de Mobilidade Urbana e aos planos de mobilidade urbana, aos planos diretores urbanos e aos planos de desenvolvimento urbano integrado, considerando a viabilidade durante todo o ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a operação dos empreendimentos;

a.2) abstenha-se de celebrar contratos de repasse federais bem como de financiamento cujos projetos não contenham avaliação do EVTEA acompanhado de manifestação conclusiva sobre sua suficiência e adequação, de acordo com os critérios mínimos que o órgão venha a estabelecer.

No tocante ao subitem a.1, a interpretação sistemática e teleológica da Lei 12.587/2012 (Lei da Política Nacional de Mobilidade Urbana) , da Lei 8.666/1993 (Lei geral de licitações e contratos) e da Portaria Interministerial 424/2016 (Regulamento das transferências voluntárias) indicam a necessidade de o órgão concedente promover a avaliação e manifestação conclusiva quanto à suficiência e adequação dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental dos TMAs que são objeto de solicitação de financiamento com recursos federais. Não se pode aventar que a União, a qual tem a atribuição de prestar assistência técnica e financeira aos demais entes, bem como fomentar a implantação de projetos de TMAs (art. 16 da Lei 12.587/2012) , aporte vultosos recursos públicos em empreendimentos que não possuem viabilidade e/ou que não se mostram como a melhor solução dentre as alternativas possíveis, em consonância com princípio da eficiência insculpido no art. 37 da Constituição Federal.

No tocante ao subitem a.2, a proposta de determinação de realização da avaliação dos estudos de viabilidade por parte do órgão concedente, de forma direta ou indireta, anteriormente à celebração do instrumento de transferência de recursos, foi objeto de dúvida formulada na etapa de comentário dos gestores.

Embora a Lei 8.666/1993 traga em seu art. 6º que os estudos preliminares compõem o projeto básico, não há dispositivo que indique que, no âmbito das transferências voluntárias, a análise de tais documentos por parte do concedente deva ser feita em etapa conjunta. Pelo contrário, a Portaria 424/2016 estabelece que, enquanto a etapa de avaliação da viabilidade deve ser feita anteriormente à celebração do instrumento, a do projeto básico pode ser realizada posteriormente, conforme abaixo:

Art. 19. O plano de trabalho, que será avaliado pelo concedente, conterá, no mínimo:

II – descrição completa do objeto a ser executado;

III – descrição das metas a serem atingidas;

IV – definição das etapas ou fases da execução;

V – compatibilidade de custos com o objeto a ser executado;

VI- cronograma de execução do objeto e cronograma dedesembolso;

(…)

Art. 20. O plano de trabalho será analisado quanto à sua viabilidade e adequação aos objetivos do programa e, no caso das entidades privadas sem fins lucrativos, será avaliada sua qualificação técnica e capacidade operacional para gestão do instrumento, de acordo com critérios estabelecidos pelo órgão ou entidade repassador de recursos.

Art. 21. Nos instrumentos, o projeto básico acompanhado de Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, ou o termo de referência, deverão ser apresentados antes da celebração, sendo facultado ao concedente exigi-los depois, desde que antes da liberação da primeira parcela dos recursos.

Art. 23. Sem prejuízo do disposto no art. 22 desta Portaria, são condições para a celebração de instrumentos:

II – Plano de Trabalho aprovado;

(grifos acrescidos)

A leitura conjunta de tais dispositivos mostra que o plano de trabalho, cuja aprovação é condição para celebração do instrumento de transferência, carece da análise quanto à sua viabilidade. Conquanto não esteja formalmente expresso que os estudos preliminares devem compor o plano de trabalho, pode-se afirmar que são estes que subsidiam a possibilidade de descrever o objeto, descrever as metas, definir etapas, estimar custos e estabelecer um cronograma, os quais devem compor o Plano de Trabalho, conforme preceitua o art. 19, incisos II a VI, da Portaria 424/2016.

Além disso, não há como realizar a análise da viabilidade indicada no art. 20, no caso de empreendimentos vultosos como os TMAs, se não for por meio de EVTEAs, que possibilitem avaliar, dentre outras questões, o problema a ser resolvido, a avaliação das alternativas em termos de custos e benefícios e a apresentação da solução adotada.

Nesse sentido, vale citar a recente Instrução Normativa n. 40/2020 do Ministério da Economia, que dispõe sobre a elaboração dos Estudos Técnicos Preliminares (ETP) no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional. O citado normativo traz o seguinte disposto em seu art. 1º, parágrafo único, e art. 5:

Art. 1º – …

Parágrafo único. Para os efeitos desta Instrução Normativa, considera-se ETP o documento constitutivo da primeira etapa do planejamento de uma contratação que caracteriza determinada necessidade, descreve as análises realizadas em termos de requisitos, alternativas, escolhas, resultados pretendidos e demais características, dando base ao anteprojeto, ao termo de referência ou ao projeto básico, caso se conclua pela viabilidade da contratação.

Art. 5º Os ETP deverão evidenciar o problema a ser resolvido e a melhor solução dentre as possíveis, de modo a permitir a avaliação da viabilidade técnica, socioeconômica e ambiental da contratação. (grifo acrescido)

Embora a citada Instrução Normativa não tenha contemplado as transferências voluntárias, pode-se afirmar que os conceitos nela abrangidos são aplicáveis a qualquer tipo de contratação de serviços e obras públicas. Destarte, não se mostra razoável que a União, na aplicação de altos investimentos de recursos federais, atente-se para a viabilidade técnica, econômica e ambiental dos empreendimentos contratados pela Administração Direta, mas abra mão quando se tratar de transferências voluntárias.

Por fim, vale ressaltar, conforme já registrado no relatório de fiscalização, que esta Corte já trouxe entendimento alinhado à tese aqui defendida, por meio do julgamento do Acórdão 2.416/2012-TCU-Plenário.

Pelo exposto, submeto os autos à consideração do Exmo. Ministro Relator Vital do Rêgo, manifestando minha concordância com a proposta de encaminhamento oferecida pela equipe de fiscalização, que contou com a anuência dos Supervisores, ressalvando apenas que a proposta de determinação constante do subitem a.2 refere-se apenas a projetos de TMAs, os quais foram objeto de análise no curso da presente auditoria.

É o relatório.

Voto

 

Cuidam os autos de relatório de auditoria de natureza operacional realizada na Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional e Urbano do Ministério do Desenvolvimento Regional (SMDRU/MDR) . O trabalho teve como objetivo verificar em que medida as análises acerca da viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade são suficientes e aderentes aos princípios e diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, bem como aos referenciais que abordam o tema, possibilitando a contratação, a entrega e a operação de empreendimentos viáveis do ponto de vista técnico, econômico e ambiental.

Os transportes públicos de média e alta capacidade (TMA) incluem veículos leves sobre trilhos (VLT) , monotrilhos e Bus Rapid Transit (BRT) , além de barcas, metrôs e trens que operem inteiramente dentro de uma área urbana contínua com espaçamentos entre estações menor do que cinco quilômetros (excluindo corpos hídricos) , sendo que todos eles devem prever a realização de cobrança tarifária fora das composições (Fonte: Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento – ITDP) .

Os TMA, assim como os demais serviços de transporte público coletivo, devem ser priorizados sobre o transporte individual motorizado, de acordo com as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei 12.587/2012, art. 6º, inciso II) . Para tanto, como tais serviços requerem investimentos significativos em infraestrutura, o Governo Federal, por meio do atual Ministério do Desenvolvimento Regional, busca apoiar os demais entes federados, seja pela destinação direta de recursos do Orçamento Geral da União (OGU) , seja por financiamento com recursos oriundos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) .

Atualmente, a carteira administrada pela SMDRU/MDR apresenta um valor total de R$ 15,34 bilhões, entre previsões de aportes diretos (OGU) e de financiamentos (FGTS) . Dessa forma, a realização desta auditoria se justificou pela materialidade das contratações de transportes públicos de média e alta capacidade, além da relevância da matéria e do risco envolvido.

Quanto à relevância, destacam-se os significativos impactos dos serviços de transportes públicos na economia das cidades e na qualidade de vida da população em geral. No tocante ao risco, tem-se a complexidade das contratações dos empreendimentos dessa tipologia, decorrente das exigências técnicas, econômicas e ambientais envolvidas.

Justamente em razão dessa complexidade, os municípios brasileiros, em sua maioria, encontram dificuldades para implementar suas redes de transporte público de média e alta capacidade em escala e ritmo suficientes para acompanhar o crescimento da população urbana e o desenvolvimento econômico das cidades. As próprias fiscalizações já realizadas no âmbito deste Tribunal sobre o tema, conforme detalharei à frente, indicam que as contratações de TMA ocorrem, usualmente, sem os devidos estudos técnicos e econômicos. O resultado se verifica por empreendimentos com problemas operacionais e de custeio e, consequentemente, desperdício de dinheiro público.

Ciente, portanto, da importância dos transportes públicos de média e alta capacidade e dos problemas corriqueiramente encontrados nessas contratações, autorizei a presente fiscalização, no âmbito do TC Processo 033.818/2018-5. A auditoria foi conduzida pela Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Urbana (SeinfraUrbana) , com o apoio da Secretaria de Métodos e Suporte ao Controle Externo (Semec) , entre 19/8/2019 e 3/7/2020.

Em síntese, a equipe realizou pesquisas na legislação, jurisprudência e bibliografia relativas ao setor e entrevistou os gestores da atual Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional e Urbano. Na sequência, analisou os procedimentos adotados nos processos administrativos de seleção de empreendimentos de transporte de média e alta capacidade realizados no âmbito daquela pasta e avaliou a situação dos principais deles.

Por último, foram realizados painéis com convidados externos, sendo eles do próprio Ministério do Desenvolvimento Regional, da Caixa Econômica Federal, da Controladoria-Geral da União, do Ministério da Economia (Secretaria Especial de Desburocratização) , da Presidência da República (Secretária Especial de Assuntos Federativos) e da Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados.

II – Fragilidade identificada

Após a condução dos trabalhos de auditoria, a SeinfraUrbana concluiu que o Ministério do Desenvolvimento Regional não realiza, direta ou indiretamente, de forma sistemática, a avaliação de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade financiados pela pasta, nem possui normativos e manuais que regulem as rotinas e procedimentos voltados para a apresentação desses estudos pelos estados e municípios.

A constatação foi a mesma tanto para os empreendimentos arcados com recursos do OGU, quanto para aqueles financiados por meio do FGTS. No caso desses últimos, verificou-se que a Caixa Econômica Federal realiza uma análise de viabilidade da proposta, a qual se resume, no entanto, à viabilidade técnica de engenharia, à precificação do objeto e à condição de pagamento do ente subnacional. A análise não se confunde, portanto, com uma avaliação de EVTEA.

Em resumo, a conclusão da SeinfraUrbana baseia-se em três dos procedimentos de auditoria realizados: nas entrevistas com gestores do MDR e da Caixa; na análise dos processos administrativos de seleção de empreendimentos conduzidos pelo ministério; e no levantamento do histórico dos processos de controle externo afetos aos empreendimentos de TMA já apreciados nesta Corte de Contas.

De acordo com as entrevistas realizadas no âmbito da Caixa, a avaliação realizada pela entidade está restrita à viabilidade financeira dos projetos, ou seja, à compatibilidade de custos, orçamento e da contrapartida financeira. Para o banco, a legislação vigente e o seu contrato de prestação de serviço firmado com o MDR não lhe atribuem a responsabilidade de avaliação de EVTEA.

Os gestores do Ministério, por sua vez, esclareceram que os empreendimentos financiados com recursos do FGTS estão sujeitos aos critérios de enquadramento nos programas, a exemplo: da compatibilidade da proposta com o Plano de Mobilidade Urbana ou com o instrumento de planejamento equivalente; da observação do percentual de contrapartida mínimo; e da situação de regularidade do proponente perante o fundo. Essa análise, contudo, não corresponde a uma avaliação de EVTEA propriamente dita.

Tais informações coincidem com o resultado do levantamento realizado pela SeinfraUrbana nos processos administrativos de seleção de empreendimentos de TMA do Ministério. A unidade técnica analisou os dez processos da pasta com os maiores valores de repasse de recursos (OGU e FGTS) , quais sejam:

BRT Transbrasil

Monotrilho – Trecho 1 da Linha 17 – Ouro, SP

Sistema Metroviário de Salvador e Lauro de Freitas – Linha 2 OGU

Implantação da Linha Leste do Metrô de Fortaleza – Etapa de Financiamento

Sistema Metroviário de Salvador e Lauro de Freitas – Linha 1, Tramo 3

Implantação da Linha Leste do Metrô de Fortaleza – Etapa de OGU

Expansão e Modernização do Metrô do DF

BRT Transcarioca – Lote 1 (O processo de seleção também contemplou o Lote 2)

Sistema Metroviário de Salvador e Lauro de Freitas – Linha 2, Financiamento

Sistema de Transporte de Passageiros BRT – Eixo Sul, DF

A partir dessa verificação, a SeinfraUrbana confirmou que as avaliações de estudos de viabilidade não são realizadas corriqueiramente ao longo do processo de seleção e contratação dos empreendimentos no âmbito da SMDRU, seja para empreendimentos financiados por meio do OGU ou do FGTS.

Essa ausência de avaliação de EVTEA já era até mesmo esperada diante dos resultados das auditorias realizadas nos últimos anos pelo TCU. Na amostra selecionada pela equipe de auditoria com base em critérios de materialidade e relevância, dos doze processos de controle externo que tiveram como objeto transporte público de média e alta capacidade, em onze deles (92%) foram constatadas irregularidades relacionadas à ausência, inconsistência e/ou falta de avaliação prévia do EVTEA no processo de seleção e contratação dos empreendimentos.

Cito como exemplo o caso dos Veículos Leves sobre Trilhos de Cuiabá-Várzea Grande/MT, auditado pela GCU e pelo TCU em 2018. Consoante apurado, o estudo apresentado a título de EVTEA não contemplou todas as variáveis necessárias, de modo que, já com a obra adiantada, concluiu-se que a operação do VLT seria deficitária. Tal empreendimento recebeu R$ 958.215.610,08 entre financiamentos com recursos do FGTS e do BNDES e suas obras encontram-se paralisadas desde 2014, com apenas 61% de execução.

Menciono também o caso dos Corredores de Transporte Público Fluvial de Recife/PE, auditado em 2016. Um dos achados tratou justamente da falta de comprovação de viabilidade econômica do empreendimento, o qual se encontra com as obras paralisadas. Na ocasião, a equipe observou que os investimentos de infraestrutura relativos à dragagem do rio, sinalização náutica, construção dos píeres, estações e centro de manutenção, de forma errônea, não foram considerados como investimento inicial. O fato levou a uma conclusão equivocada quanto à uma falsa viabilidade do empreendimento.

Os resultados dessas e das demais auditorias já realizadas pelo TCU nos empreendimentos de TMA, somados às informações obtidas nas entrevistas realizadas e na análise dos processos administrativos do MDR, de fato, confirmam a conclusão da SeinfraUrbana. O Ministério não realiza, direta ou indiretamente, de forma sistemática, a avaliação de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade financiados pela pasta. Não há nem mesmo normativos que exijam dos estados e municípios a apresentação desses estudos.

III – Critérios

A necessidade de exigência de análise de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade por parte do Ministério do Desenvolvimento Regional não está expressa de forma literal em um único normativo. É sim decorrente da interpretação sistêmica de algumas normas, como bem demonstrou a SeinfraUrbana.

O primeiro critério que merece ser citado para justificar a realização de EVTEA de empreendimentos de TMA é justamente o princípio da eficiência na administração pública, trazido pelo art. 37 da Constituição Federal. Isto porque, consoante já verificado em auditorias anteriores, o financiamento de obras sem os devidos EVTEA leva, inevitavelmente, à falta de eficiência na aplicação do dinheiro público e, consequentemente, a prejuízos ao erário.

O segundo critério que cito é relativo à Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU) e seus princípios, diretrizes e objetivos estabelecidos nos art. 5º ao 7º da Lei 12.587/2012. De acordo com esse normativo, são princípios da PNMU: a acessibilidade universal; o desenvolvimento sustentável das cidades, nas dimensões socioeconômicas e ambientais; a equidade; a eficiência, eficácia e efetividade na prestação dos serviços; a justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do uso dos diferentes modos e serviços, entre outros.

Já as diretrizes da PNMU orientam para: mitigação dos custos ambientais, sociais e econômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas na cidade; o incentivo ao desenvolvimento científico-tecnológico e ao uso de energias renováveis e menos poluentes; a garantia de sustentabilidade econômica das redes de transporte público coletivo de passageiros, de modo a preservar a continuidade, a universalidade e a modicidade tarifária do serviço.

Quanto aos objetivos da Políticas, destacam-se os de: reduzir as desigualdades e promover a inclusão social; promover o acesso aos serviços básicos e equipamentos sociais; proporcionar melhoria nas condições urbanas da população no que se refere à acessibilidade e à mobilidade; promover o desenvolvimento sustentável com a mitigação dos custos ambientais e socioeconômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas nas cidades.

Para que seja possível atender aos princípios, diretrizes e objetivos da PNMU é imprescindível que os empreendimentos de transporte público integrantes dela sejam, ao mínimo, viáveis quanto aos aspectos técnico, econômico e ambiental. De outra forma, não há como garantir a continuidade, a universalidade e a modicidade tarifária do serviço, conforme preconizado no art. 5º, inciso II, c/c art. 6º, inciso VIII, da Lei 12.587/2012, a partir das atribuições da União previstas no art. 16, incisos IV e VI, do mesmo normativo.

Quanto à previsão legal acerca dos estudos de viabilidade, a SeinfraUrbana expôs que o ordenamento jurídico brasileiro estabelece uma série de normativos, a exemplo do art. 6º, inciso IX, c/c art. 116 da Lei 8.666/1993 (Lei de Licitações) ; do art. 2º, inciso IV, da Lei 12.462/2011 (Lei do RDC) ; e do art. 42, inciso VIII, da Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais) , obrigando a elaboração de estudos técnicos preliminares que assegurem a viabilidade técnica, econômico-financeira e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento, possibilitando a avaliação do custo do empreendimento e a definição dos métodos e do prazo de execução.

Além deles, há ainda outros normativos infralegais que, de forma indireta, estabelecem as mesmas exigências, a exemplo da Portaria Interministerial 424/MP/MF/CGU/2016. Em seu art. 20, resta definido que o plano de trabalho de qualquer convênio ou contrato de repasse proposto será analisado quanto à sua viabilidade e adequação aos objetivos do programa pelo órgão concedente.

Por último, ressalto que é ampla a jurisprudência do TCU no sentido da obrigatoriedade de elaboração e aprovação de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental (EVTEA) , suficientes e adequados, previamente ao investimento público em empreendimentos e obras em geral e, em particular, para sistemas de mobilidade urbana. Nessa linha estão os Acórdãos 2.835/2015 (itens 9.1 e 9.2) , 1.373/2011 (item 9.1.3) , 2.582/2010 (item 9.1.2) , 2.674/2009 (item 9.3.1) e 1.837/2009 (9.1.4) , todos do Plenário.

Dessas decisões, destaco o Acórdão 1.373/2011, que cuidou de auditoria operacional realizada com a finalidade de avaliar a mobilidade urbana no Brasil. Á época, recomendou-se ao então Ministério das Cidades que ampliasse, em futuras contratações de projetos relacionados a intervenções em mobilidade urbana, os critérios para seleção de propostas, de modo a contemplar apresentação e análise de estudos sobre a adequação e viabilidade técnica e financeira do projeto.

Todo esse conjunto de jurisprudência e normas constitucionais, legais e infralegais, quando analisado de forma sistêmica, justifica a obrigatoriedade de a União exigir e avaliar os estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade financiados por parte do Governo Federal, seja com recursos do OGU ou do FGTS.

Como visto até aqui, os serviços de transporte público de média e alta capacidade são projetos caros e complexos tecnicamente, com muitos riscos envolvidos (econômicos e ambientais) e de extrema relevância social e econômica, características essas que justificam a devida análise dos seus respectivos EVTEA, havendo as obrigações legais para que isso seja feito.

IV – Causas

De acordo com o apurado nos trabalhos de auditoria, as principais causas para a ausência de análise dos EVTEA de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade por parte do MDR são decorrentes, resumidamente:

i) de deficiências na estrutura do Ministério, diante da indisponibilidade de equipe técnica qualificada para a tarefa de realizar a avaliação adequada desses estudos, em função do caráter multidisciplinar exigido;

ii) da ausência de normativo regulamentando os procedimentos de avaliação e as responsabilidades acerca da avaliação dos EVTEA nos processos de seleção/contratação de empreendimentos de mobilidade urbana.

Em manifestação anterior, o MDR já havia enfatizado a importância de se formalizar parcerias com outros órgãos para que as análises de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental sejam realizadas satisfatoriamente por equipes multidisciplinares, o que não seria possível apenas com o corpo técnico da pasta.

Além disso, a ausência de normativo que regulamente a exigência de avaliação de EVTEA pode ser atribuída ao baixo índice de governança, quanto à institucionalização de normas e procedimentos para a execução da Política Nacional de Mobilidade Urbana. O fato foi observado em auditoria realizada em 2015 na pasta e, conforme levantado neste trabalho, alcança os critérios mínimos de avaliação de EVTEA e de manifestação conclusiva sobre os empreendimentos de transporte de média e alta capacidade.

No âmbito da Caixa Econômica Federal apurou-se que, além da insuficiência de técnicos, a entidade entende que a legislação vigente e o seu contrato de prestação de serviço firmado com o MDR não lhe atribuem essa responsabilidade.

V – Efeitos

Como consequência da ausência de análise de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade, tem-se o risco de o governo federal estar financiando empreendimentos que: i) não estão alinhados com os planos municipais (de mobilidade urbana e diretores) e com os planos de desenvolvimento urbano integrado; ii) não apresentam a melhor solução em termos de custo/benefício; iii) não estão suficientemente maduros; ou no pior cenário, iv) não são viáveis do ponto de vista técnico, econômico ou ambiental.

Em todos os casos, a materialização desses riscos implica alocação ineficiente de recursos públicos e, na maioria das vezes, atrasos e paralisações de obras. Ao fim, tem-se a baixa efetividade da política pública, com a ausência das melhorias das condições de mobilidade projetadas. A população fica impedida de ter acesso universal à cidade, de forma inclusiva, segura, resiliente e sustentável, contrariando o que prevê a Política Nacional de Mobilidade Urbana.

Tal situação encontra-se refletida nos contratos constantes da carteira do Ministério do Desenvolvimento Regional. Dos 48 contratos de BRT, metrô, monotrilho, trem urbano e VLT acompanhados pelo MDR, apenas 12 foram concluídos. Do restante, 23 estão em execução, 4 obras não foram sequer iniciadas e 9 empreendimentos estão paralisados.

Somente os empreendimentos com obras paralisadas somam investimentos da ordem de quase 2 bilhões em recursos federais do OGU e mais 2 bilhões em recursos de contrapartida estadual ou municipal. O tempo médio de duração desses contratos é de impressionantes 87 meses, mais de sete anos.

Se considerados os contratos financiados com recursos do FGTS, a situação é ainda mais grave. Somente as obras do Monotrilho-Trecho 1 da Linha 17 Ouro do Aeroporto de Congonhas, do BRT Transbrasil e da Linha Leste do Metrô de Fortaleza têm, cada uma, 1 bilhão de financiamento com recursos do FGTS e estão com 71, 51 e 20 meses de atraso, respectivamente.

VI – Propostas de Encaminhamento

Frente ao todo exposto até aqui, pode-se afirmar que, a União, por meio da SMDRU/MDR, não tem realizado, de forma sistemática, direta ou indiretamente, a avaliação da viabilidade dos projetos propostos por estados e municípios, abordando a concepção, a construção e a operação do empreendimento.

Em razão disso, acompanho a proposta da SeinfraUrbana de determinar ao Ministério do Desenvolvimento Regional que estabeleça critérios mínimos para utilizá-los na avaliação e na manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade a serem contratados nos instrumentos de repasse federais, bem como nos de financiamento, alinhando-os à Política Nacional de Mobilidade Urbana e aos planos de mobilidade urbana, aos planos diretores urbanos e aos planos de desenvolvimento urbano integrado, considerando a viabilidade durante todo o ciclo de vida, desde a concepção, passando pela construção até a operação dos empreendimentos.

Além disso, deve-se determinar ao órgão, conforme sugeriu a unidade técnica, que se abstenha de celebrar instrumentos de transferências de recursos federais, bem como de financiamento, cujos projetos não contenham avaliação do EVTEA e manifestação conclusiva sobre sua suficiência e adequação, de acordo com os critérios mínimos que o órgão venha a estabelecer.

Ressalvo, como bem colocou a SeinfraUrbana, que não está sendo demandado que o MDR faça diretamente essa avaliação. A determinação é para que o órgão estabeleça os critérios mínimos e a forma de avaliação dos EVTEAs, acompanhada da devida manifestação conclusiva, ainda que externamente ao ministério. A função pode ser realizada, por exemplo, por meio de conselho de projetos, externo ao MDR, formado por especialistas no assunto, ou por meio de cooperação com outras instituições que exercem essa atividade.

Sobre os critérios de avaliação dos EVTEAs, a SeinfraUrbana realizou uma ampla pesquisa, inclusive nos referenciais técnico-normativos de entidades internacionais, para mapear qual seria a estrutura adequada de um estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental para sistemas de mobilidade urbana. Os resultados estão detalhados na Seção V do relatório que precede este voto.

Assim, em respeito à discricionaridade do MDR, julgo pertinente recomendar ao órgão que, quando da elaboração critérios mínimos de avaliação e de manifestação conclusiva sobre a suficiência e adequação dos estudos de viabilidade dos empreendimentos de transporte público de média e alta capacidade, considere: i) a estrutura básica sugerida pela SeinfraUrbana; ii) a possibilidade de participação externa ao ministério para realizar essa atividade; e iii) a necessidade de elaboração de normas e manual de procedimentos.

Informo que deixo de acompanhar a proposta da SeinfraUrbana de recomendar ao MDR que inclua em seu plano estratégico instrumentos que estruturem um plano sistemático de fomento para o desenvolvimento dos EVTEAs de projetos de transporte público de média e alta capacidade, por meio de apoio técnico ou financiamento, para os empreendimentos que são objeto de solicitações de recursos federais, seja com recursos do tesouro federal ou com recursos de financiamento. Embora considere a proposta bastante pertinente, entendo que este Tribunal estaria invadindo a discricionaridade do órgão ao sugerir a priorização de programas de governos.

Por último, diante da lacuna legislativa existente, uma vez que não há normativo que expressamente exija a elaboração e a avaliação de estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental de empreendimentos de transportes públicos de média e alta capacidade, acrescento proposta de informar o Congresso Nacional acerca da importância e da necessidade de criação de normas nesse sentido, de modo a tornar mais eficiente a alocação de recursos federais nas obras que requeiram financiamento público.

Para concluir, espera-se que a adoção das providências anteriores seja suficiente para aperfeiçoar as decisões acerca da seleção de investimento a serem financiados pela União e para dar celeridade ao processo como um todo. O resultado último aguardo são contratações de empreendimentos de mobilidade urbana com comprovada viabilidade econômica, financeira, ambiental e social e compatíveis com a PNMU.

Assim, será evitado o desperdício dos recursos públicos em obras paralisadas ou abandonadas, podendo a população usufruir com maior rapidez dos resultados de uma política de governo mais eficiente. No caso, pela redução do tempo gasto nos deslocamentos e pelo aumento da qualidade do serviço prestado.

Diante do exposto, VOTO para que seja adotada a minuta de acórdão que trago à consideração deste colegiado.

TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 3 de março de 2021.

Ministro VITAL DO RÊGO

Relator

 

Fonte: Diário do Transporte

Data: 10/03/2021