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Expansão dos modais depende de novos projetos na malha logística

30.03.2023 | | Notícias do Mercado

Fonte: Valor
Data: 30/03/2023

Considerada essencial para estabelecer o equilíbrio da matriz brasileira de transporte de carga, ainda concentrada no modal rodoviário, a expansão da multimodalidade no país depende da implementação de projetos estruturantes na malha logística. Significa investir em infraestrutura viária e na construção de estações de transbordo, para melhorar a eficiência e desonerar a operação de escoamento da produção.

Uma matriz de transporte desequilibrada eleva o custo para os donos da carga que, segundo Paulo Resende, coordenador do núcleo de infraestrutura, supply chain e logística da Fundação Dom Cabral (FDC), pode atingir 12,35% do faturamento bruto. O índice está muito acima do registrado em outros países (8,5%), como China, Canadá, Estados Unidos, Austrália e até mesmo a Índia, compara.

A avaliação é que a integração entre os modais contribui não apenas para reduzir os custos de logística, como também assegura rapidez na entrega de mercadorias. Essa agilidade operacional é de extrema relevância porque, diferentemente do que ocorria no passado, grande parte das empresas não opera mais com grandes volumes de estoques para suprir o mercado. “O estoque agora anda sobre as rodas”, afirma Resende.

A multimodalidade se associa ao conceito de corredor logístico, ou seja, um tronco ferroviário ou hidroviário principal alimentado por acessos rodoviários. Essa configuração guarda relação entre distância e atratividade econômica. Estudo apresentado em meados do ano passado pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) indica que a cabotagem é atrativa no transporte superior a 1,5 mil quilômetros (km) de extensão. Já o escoamento da carga por ferrovia torna-se uma opção vantajosa a partir de 500 km a 750 km, enquanto as rodovias são a opção mais interessante para percursos menores.

Entretanto, o cenário do escoamento de carga no Brasil está bem distante do conceito de corredor logístico que caracteriza a multimodalidade. De acordo com Pedro Moreira, presidente da Associação Brasileira de Logística (Abralog), atualmente as rodovias detêm a maior participação no transporte de cargas, com 62% do total, as ferrovias respondem por 20%, enquanto hidrovia e navegação de cabotagem representam 14,3%. O restante abrange o fluxo de cargas por outros modais (dutoviário e aeroviário).

Apostando na sincronia dos modais como fator de competitividade para o país, o presidente da Abralog se mostra otimista quanto ao desenvolvimento de projetos necessários para mudar o cenário da logística nacional. Segundo Moreira, o orçamento para investimento público em infraestrutura de transporte previsto para este ano, de R$ 18 bilhões, será maior do que nos últimos cinco anos somados. O desafio será fazer com que esse recurso seja efetivamente executado, ressalta. “Temos que ter persistência para tornar nossa infraestrutura multimodal e competitiva.”

Investimentos bilionários em infraestrutura de transportes constam no Plano Nacional de Logística (PNL) 2035, elaborado no fim de 2021 – não se sabe ainda se o novo governo fará revisão –, cuja meta é o crescimento médio dos modais rodoviário (5%), ferroviário (193%), cabotagem (57%), hidroviário (44%), dutoviário (58%) e aeroviário (60%). Os valores médios aplicados podem chegar a R$ 25,1 bilhões por ano, no cenário de menor demanda, e a R$ 52,6 bilhões por ano, no cenário de maior demanda.

No entendimento de Resende, da FDC, os investimentos para equilibrar a matriz de transporte devem ser feitos simultaneamente em duas frentes. Uma delas é na melhoria do sistema rodoviário. A outra deve contemplar as ferrovias, “porque são capazes de captar cargas que necessitam de uma redução de custo logístico imediata”. No que diz respeito às ferrovias, ele defende a execução de no máximo cinco grandes projetos estruturantes para responder à demanda existente no curto prazo.

O regime de autorização para a iniciativa privada construir e operar ferrovias, ramais, pátios e terminais ferroviários, em vigor desde o ano passado com a aprovação da Lei nº 14.273/2022 – oriunda da Medida Provisória 1.065/2021 –, é visto como um estímulo aos projetos de expansão da malha ferroviária. Mas esse instrumento legal não vincula os projetos ao transporte multimodal, ou seja, os pedidos de autorização de estrada de ferro não precisam ser necessariamente relacionados à integração entre modais, explica Rafael Vanzella, sócio-líder da área de infraestrutura do Machado Meyer Advogados. “A multimodalidade não é um condicionante”, frisa.

O propósito da Lei de Autorização, prossegue o especialista, é facilitar o investimento principalmente em ferrovias de menor porte que interligam uma determinada unidade econômica – uma fábrica, uma fazenda, um armazém etc. – a uma malha ferroviária estruturante de maior densidade. A rigor, afirma Vanzella, são poucos os projetos conduzidos no âmbito governamental ou por meio de Parcerias Público-Privadas (PPP) com foco em transporte multimodal. Entre eles, cita a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) – concessão que no trecho da Bahia foi acompanhada de autorização para construção de um terminal portuário de uso privativo (TUP). Outro exemplo é a Ferrovia Interna no Porto de Santos (Fips).

A expectativa é de que o potencial hidroviário também possa ser mais explorado no país. Os rios navegáveis brasileiros somam 63 mil km de extensão, mas somente 30,9% deste total (o equivalente a 19,4 km) são utilizados comercialmente para o transporte de cargas. Elias de Souza, sócio-líder da indústria de governo e serviços públicos da consultoria Deloitte, chama a atenção para existência de poucos prestadores de serviços de logística nesse modal (356), enquanto no transporte de carga por rodovias atuam mais de 150 mil empresas. “No curto prazo, deve ser aberta a porta para mais operadores aquaviários. A hidrovia já existe, é só facilitar a operação”, afirma.

Ante a perspectiva de o equilíbrio da matriz de transporte de cargas ocupar posição de destaque na agenda do país, empresas que prestam serviços de logística alinham a estratégia para suprir a demanda crescente do mercado. De acordo com Ângelo Stradioto, gerente-geral da estratégia da VLI, que é especializada no transporte integrado entre produtores, terminais de transbordo, ferrovias e portos, tem sido grande a adesão de empresas de diversos ramos de atividade econômica à multimodalidade.

Uma das iniciativas da VLI contempla o transporte de fertilizantes no corredor Centro-Norte, entre o porto do Itaqui (MA) até Palmeirante (TO), uma parceria com a Companhia Operadora Portuária do Itaqui (Copi). Com investimento inicial em torno de R$ 200 milhões, o projeto tem capacidade para escoar 1,5 milhão de toneladas por ano. “É um ótimo exemplo da integração modal entre ferrovias e caminhões para substituição de produtos a partir do terminal da VLI em Palmeirante”, ressalta Stradioto.

Para aumentar a movimentação de cargas nas ferrovias e, consequentemente, a integração com caminhões e portos, a VLI comprou em fevereiro nove locomotivas no valor de R$ 200 milhões, que serão utilizadas no transporte de celulose no corredor Centro-Leste, entre os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Também em fevereiro, a companhia assinou memorando de entendimento com a Vports, antiga Codesa, para avaliar investimento para aumento de capacidade no novo porto de Vitória (ES).

Com planos de intensificar a operação multimodal, a Log-In Logística Intermodal adquiriu no ano passado duas empresas que operam no ramo de transporte rodoviário: a Tecmar Transportes, com a qual pretende atuar fortemente no segmento de transporte de carga fracionada, e a Olívia Pinto, que aumentará a presença da companhia na região Norte, aumentando sua capilaridade no país.

A Log-In está investindo também na ampliação de sua frota de navios utilizados para o transporte de contêineres nos quatro tipos de serviço de navegação que oferece ao mercado. Atualmente, são sete embarcações próprias, com capacidade total de 18.050 TEUs. Segundo Rafael D’Assunção, diretor de atendimento da companhia, mais dois navios foram contratados na China, com capacidade nominal de 3.158 TEUs cada um, com previsão de entrega em dezembro deste ano e maio de 2024.

A expectativa é de crescimento exponencial de movimentações de carga. O executivo da Log-In revela que existe uma demanda reprimida na cabotagem, principalmente no corredor entre as regiões Sul/Sudeste e Manaus (AM). No ano passado, parte da carga foi transportada por outro modal, por falta de espaço nos navios. “Como estamos investindo na ampliação da capacidade, entendemos que existe uma perspectiva muito positiva de crescimento de nosso market share”, afirma.

Além das recém-adquiridas Tecmar e Olívia Pinto, a Log-In administra e opera o Terminal Portuário de Vila Velha, no porto de Vitória (ES). Os ativos incluem dois terminais intermodais localizados em Itajaí (SC) e no Guarujá (SP). No ano passado, a companhia reportou crescimento de 48% na receita operacional líquida em relação a 2021, totalizando R$ 2,06 bilhões.