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Governo discute recuperação econômica pós-pandemia

21.04.2020 | | Notícias do Mercado

Planos de retomada não ficam em pé se não tiverem sustentação em uma sólida estratégia fiscal

 

Começa a ganhar corpo a tese de que será preciso tomar medidas fiscais para além da etapa emergencial de combate à pandemia para estimular a economia e reconstruir a capacidade produtiva. O desafio será encontrar espaço no orçamento para pagar também essa conta. Sem o adequado financiamento, o país entrará numa espiral de endividamento que abreviará a recuperação econômica.

Logo após o surgimento do novo coronavírus, economistas acreditavam que o Brasil seria afetado apenas por um choque de oferta, com o bloqueio das cadeias produtivas da China. O impacto tenderia a ser temporário e restrito, já que nossa economia é ainda muito fechada.

Com a adoção das políticas de distanciamento social, começou a se configurar um choque mais duradouro. O fechamento de fábricas, lojas e escritórios interrompeu a produção de bens e serviços não essenciais. A queda do rendimento do trabalho, a quarentena e a queda da confiança derrubaram a demanda.

Dada a profundidade da retração esperada do Produto Interno Bruto (PIB), que alguns calculam em 8% neste ano, é bem provável que a crise deixe cicatrizes mais profundas. Economistas começam a estimar o quanto da capacidade produtiva do país – o chamado PIB potencial – será eliminada com a falência de empresas e o desemprego prolongado.

A capacidade de recuperação da economia também deve ficar comprometida. Uma boa parte da resposta emergencial à pandemia envolve empréstimos para famílias e empresas atravessarem o período de perda de renda e receita. Mais endividado, é provável que o setor privado passe por um período de desalavancagem.

Esse quadro de incerteza tem levado os analistas econômicos a reverem seus prognósticos de uma retomada em “V” da economia em 2021. A recuperação tenderá a ser mais lenta e frágil, com riscos de novas recaídas. Muitos enxergam um papel a ser exercido pelo governo para reativar a demanda, passado o primeiro efeito do choque do coronavírus, e para reconstruir a capacidade produtiva.

É nesse contexto que começam a surgir, dentro do governo, os primeiros planos. O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, preparou um programa com 70 obras para serem tocadas até 2022, o que exigiria investimento de R$ 30 bilhões e criaria até um milhão de empregos, segundo antecipou o Valor na edição de 7 de abril.

O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Carlos Von Doellinger, está elaborando o que chama de um “Plano Marshall”, que será entregue em junho ao ministro da Economia, Paulo Guedes. Em entrevista ao Valor na última sexta-feira, ele evitou mencionar valores, mas adiantou que são contemplados quatro eixos: crédito para recuperar cadeias produtivas no mercado doméstico; linhas de financiamento para normalizar a capacidade exportadora; investimentos em infraestrutura usando parcerias público privadas (PPP); e o reforço a políticas sociais e de fomento ao emprego.

Os planos do governo coincidem com diagnóstico apresentado por líderes e economistas latino-americanos em carta divulgada durante o encontro do Fundo Monetário Internacional (FMI). A questão é que não há espaço fiscal para essas políticas, num momento em que os governos estão superendividados e as economias sofrem a fuga de capitais estrangeiros. Na carta, os líderes pedem que sejam reforçadas a linhas de assistência do FMI para os países da América Latina e Caribe. Do Brasil, assinaram o documento o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o ex-presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn.

A situação fiscal brasileira é dramática. O déficit primário, que era previsto em 1,5% do PIB, poderá chegar a 8% do PIB. A dívida bruta se aproxima a passos largos de 100% do PIB. A ampliação de gastos para reativar a economia, num quadro já preocupante, tenderá a agravar ainda mais a situação, elevando os prêmios de risco, afastando capitais estrangeiros e minando a confiança de famílias e empresas.

Planos de recuperação não ficam em pé se não tiverem sustentação em uma sólida estratégia fiscal. Torna-se mais urgente repriorizar despesas, com o andamento de reformas que já estão no Congresso e outras que ainda não foram enviadas, como a administrativa. É urgente não perder o foco na consolidação fiscal de médio e longo prazos, com medidas adotadas desde já.

 

Fonte: Valor

Data: 20/04/2020