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Reequilíbrio das concessões é desafio no pós-pandemia

07.04.2020 | | Notícias do Mercado

Primeiros impactos da pandemia têm sido arrasadores para o fluxo de caixa das concessionárias de serviços públicos

 

Como se não bastassem os efeitos potencialmente catastróficos para o sistema de saúde e o universo de incertezas que recai sobre a toda a população, especialmente os mais vulneráveis, a pandemia de coronavírus lança mais um desafio de grandes proporções: a viabilidade dos contratos de concessão na área de infraestrutura. E não poderia haver momento pior para esse choque negativo: quando a iniciativa privada dava sinais de que lideraria o crescimento do PIB, o mercado de capitais aumentava sua participação como alternativa de financiamento aos projetos, começava a haver uma limpeza dos passivos – como o drama em torno do aeroporto de Viracopos (SP) e de rodovias licitadas na gestão Dilma Rousseff – e o governo Jair Bolsonaro prometia acelerar os leilões.

Os primeiros impactos da pandemia têm sido arrasadores para o fluxo de caixa das concessionárias de serviços públicos. Um dos setores mais atingidos é a aviação comercial, com repercussão direta nas contas de grupos responsáveis por terminais aeroportuários. O Galeão (RJ) terá apenas três voos diários em abril. Em Brasília, um dos principais centros de conexão do país, serão 21 pousos e decolagens – ritmo de operações normalmente observado em 30 minutos de aeroporto funcionando.

Operadoras de metrôs, trens urbanos e veículos leves sobre trilhos (VLTs) relatam uma redução de 82% na demanda depois de iniciado o isolamento social. Com o grande comércio fechado e indústrias produzindo menos, a taxa de queda no consumo de energia elétrica é de dois dígitos, mas distribuidoras precisam continuar honrando seus contratos de longo prazo com os donos de usinas geradoras.

O último grande tombo no nível de atividade, durante o biênio 2015-2016, deixou como legado uma avalanche de pedidos de reequilíbrios contratuais. Na área de rodovias, muitas concessionárias não conseguiram cumprir com exigências para a duplicação das pistas. Nos aeroportos, o movimento de passageiros ficou longe da curva inicialmente projetada. O saldo foi um comprometimento da sustentabilidade econômico-financeira de diversos contratos.

A resposta mais comum das agências reguladoras e do Congresso àquela crise, analisando esses pedidos de reequilíbrio ou projetos de lei com repactuação contratual, foi rejeitar mudanças e atribuir prejuízos das concessionárias ao “risco de demanda” que caracteriza o negócio.

Desta vez, no entanto, há quase um consenso de que a pandemia é o tipo de “evento fortuito” ou “razão de força maior” mencionado nos contratos para justificar mudanças pelo poder concedente.

“O cenário atual é parecido com o do racionamento, mas muito mais complexo”, comparou o presidente da consultoria PSR, Luiz Barroso, um dos maiores especialistas no setor elétrico (Agência Infra, 27/3). Empresas de distribuição de energia ainda estão fazendo as contas, mas o presidente da Copel, Daniel Slaviero, fala na necessidade de um empréstimo de R$ 15 bilhões a R$ 17 bilhões ao segmento para enfrentar o desequilíbrio de caixa.

Sem ter uma ideia precisa de qual será a demanda futura, o Ministério de Minas e Energia suspendeu leilões de novas usinas e linhas de transmissão. Também cancelou, por prazo indeterminado, a 17ª rodada de licitação para áreas de petróleo e gás natural. Diante do cenário totalmente incerto para os cruzeiros turísticos, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) desmarcou a concessão de um terminal portuário de passageiros em Fortaleza, mas o Ministério da Infraestrutura diz que manterá os demais certames – de portos, aeroportos, rodovias e ferrovias.

No difícil ambiente pós-pandemia, a aceleração dos investimentos privados nas concessões de infraestrutura terá papel-chave para uma retomada mais forte da atividade econômica. E o interesse dos potenciais investidores, sejam nacionais ou estrangeiros, estará certamente condicionado à maneira como o governo e as agências reguladoras lidarão com os problemas advindos da atual tormenta. Já houve acenos importantes, como o adiamento das outorgas anuais cobradas das concessionárias de aeroportos e uma flexibilização das obrigações regulatórias, para companhias aéreas ou para operadoras de linhas interestaduais de ônibus.

A decisão mais difícil, no entanto, ainda está pela frente: como recompor o equilíbrio dos contratos – talvez, inclusive, diminuindo os valores de outorga cobrados ou aceitando aumentos de tarifas para os consumidores. A conta não será agradável, mas não se pode fazer de conta que o problema não existe.

 

Fonte: Valor

Data: 06/04/2020