30.10.2025 | ABIFER | Notícias do Mercado
Fonte: Folha S. Paulo Data: 30/10/2025
Na semana passada, foi submetida para apreciação e aprovação da Diretoria do Metrô de São Paulo minuta de contrato a ser celebrado entre o Metrô de São Paulo, o governo estadual e a Artesp (Agência de Transporte do Estado de São Paulo).
Esse contrato, se assinado, deve marcar uma nova etapa na governança e na sustentabilidade financeira do sistema metroviário de São Paulo. Ele trará mudanças estruturais tanto na forma de remuneração da estatal quanto no modelo de regulação dos serviços. Pela primeira vez, o Metrô passará a ser regulado externamente pela Artesp —a mesma agência responsável pela fiscalização das concessões de rodovias e trens metropolitanos.
Para compreender o sentido desse novo contrato, é preciso voltar a 2006, quando começou o processo de desestatização de várias linhas metroviárias e ferroviárias. Com ele, criou-se uma caixa de compensação que centraliza as receitas de todo o sistema —metrô, CPTM e até parte das tarifas de ônibus da SPTrans. Essa caixa se tornou o coração financeiro do transporte metropolitano. No entanto, a forma como ela foi estruturada acabou gerando distorções.
As concessionárias privadas das linhas desestatizadas têm prioridade na retirada dos recursos da caixa, sendo remuneradas por uma tarifa técnica —que, ao longo dos anos, em vista das regras de correção dos valores previstas nos contratos, se tornou superior à tarifa paga pelo usuário. O resultado é que o Metrô e a CPTM passaram a depender do que “sobra” na caixa após os pagamentos aos operadores privados.
A imprevisibilidade desses repasses tem inviabilizado qualquer planejamento de longo prazo e tem obrigado o Metrô a depender de transferências diretas do Tesouro estadual.
O novo contrato pretende resolver justamente esse problema de sustentabilidade financeira. Ele transformará a relação entre o Metrô e o governo em um contrato de gestão com características próximas às de uma concessão. O Estado passará a remunerar o Metrô por oferta e qualidade do serviço. O risco de demanda ficará alocado ao Estado.
A métrica será objetiva: carro-quilômetro para medir quantidade e um índice de qualidade que incorpora fatores como manutenção, regularidade, conforto e satisfação dos usuários.
Com isso, o Metrô passará a ter uma receita previsível, na casa de R$ 2,2 bilhões por ano, o que permitirá melhor planejamento operacional e orçamentário. Em contrapartida, o contrato criará incentivos de desempenho: o cumprimento das metas de qualidade impactará diretamente a remuneração.
Essa lógica aproxima o Metrô das práticas já aplicadas às concessionárias privadas, estimulando a eficiência.
Outra inovação é o papel da Artesp como reguladora. Até agora, o Metrô era fiscalizado formalmente pela Secretaria de Transportes Metropolitanos e, na prática, apenas pela própria estrutura interna da empresa. A presença de um regulador externo permitirá maior transparência e rigor técnico.
A Artesp, que recentemente criou uma Superintendência Metroferroviária e uma Diretoria Metroferroviária e Ferroviária, passa a ter competência para fiscalizar indicadores e aplicar sanções e descontos na remuneração em caso de descumprimento de padrões de qualidade.
A assinatura do contrato, contudo, ainda depende de um processo de governança que deve se estender por pelo menos 90 dias. Após a aprovação da diretoria do Metrô, a minuta seguirá para análise da Procuradoria-Geral do Estado, que emitirá parecer jurídico, e para a Secretaria de Transportes Metropolitanos, que avaliará a conveniência e a oportunidade de firmar o acordo.
No âmbito da Artesp, será provavelmente necessária uma nota técnica da superintendência responsável e uma deliberação da diretoria colegiada. É possível, e até provável, que a minuta sofra ajustes nesse percurso —algo natural em processos que envolvem contratos complexos e de longo prazo.
O modelo paulista pode inspirar outras capitais a adotar instrumentos semelhantes para suas estatais de transporte urbano. Ele busca compatibilizar eficiência operacional, sustentabilidade financeira e controle público.
Se bem implementado, o novo contrato poderá não apenas estabilizar as finanças do Metrô, mas também reforçar uma cultura de regulação independente e orientada a resultados —algo fundamental para o amadurecimento institucional do setor de infraestrutura no Brasil.