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Movimento de cargas deve cair 10%

03.04.2023 | | Notícias do Mercado

Fonte: Valor Econômico
Data: 31/03/2023

Depois de registrar resultados expressivos em 2022, com a movimentação de 1,209 bilhão de toneladas, muito próxima do volume recorde de 1,214 bilhão de toneladas no ano anterior, considerando os resultados a partir de 2010, o setor portuário projeta para este ano queda de até 10% devido à redução da demanda global e aos altos juros praticados no país.

“No Brasil, a taxa de juros inibe investimentos. Em nível global, há uma queda do consumo e do poder aquisitivo por causa da retirada de programas de transferência de renda”, diz Caio Morel, diretor-executivo da Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres (Abratec).

Na movimentação de contêineres, Andrew Lorimer, CEO da Datamar, aponta queda de 3,86% em 2022. “A guerra na Ucrânia, a inflação americana e a crise nos preços de energia na Europa geraram uma demanda global mais fraca. O cenário tende a melhorar vagarosamente em 2023”, diz.

A desaceleração, porém, trouxe alguns resultados considerados positivos, como a derrubada dos preços dos fretes e a reordenação da logística global. “Não há mais porto engarrafado, nem falta de contêineres. O frete caiu de US$ 10 mil durante a pandemia para US$ 1,5 mil da China para Santos (SP) e US$ 3,5 mil da China para Manaus (AM)”, diz Rafael Dantas, diretor de vendas da operadora logística Asia Shipping.

Na área regulatória, a criação do Ministério de Portos e Aeroportos e as escolhas de Márcio França para a pasta, de Fabrizio Pierdomenico para secretário nacional de Portos e Transportes Aquaviários e de Roberto Gusmão para secretário-executivo, trouxe um certo alento ao setor.

“Ter pessoas do setor é animador e positivo para que o país siga crescendo e se desenvolvendo”, diz Ulisses Oliveira, diretor de relações institucionais e sustentabilidade do porto Sudeste. “O ministro deixou claro que não vai adotar o modelo anterior, nem privatizar a autoridade portuária, mas quer fazer alterações para melhorar a operação. Esse pode ser um caminho para acelerar a velocidade dos investimentos”, analisa Antonio Carlos Sepúlveda, diretor-presidente da Santos Brasil.

Na avaliação de Ricardo Arten, presidente da Arten, “não é preciso licitar a autoridade portuária, mas encontrar uma fórmula para acelerar os investimentos em acessibilidades marítima, rodoviária e ferroviária é bem-visto pelo mercado”.

Na visão do secretário Pierdomenico, o porto tem duas partes que serão separadas: a de fiscalização e ordenamento e a de zeladoria. A primeira não será privatizada, mas a parte de serviços poderá ser concedida. “Paranaguá vai conceder o canal de acesso, um projeto da autoridade portuária com modelagem da Infra S.A. Essa modelagem pode servir de base para outras concessões portuárias, como as do Rio Grande e de Itajaí.”

Paulo Bertinetti, diretor-executivo do Tecon Rio Grande, da Wilson Sons, diz que o canal tem mesmo de ser concedido, porque porto é sobretudo acesso. “O canal de acesso de Buenos Aires é concessão e a dragagem é permanente. Em 2022, o que nos afetou foram os congestionamentos no mundo, que nos levaram a perder escalas.”

Com a privatização descartada, o porto de Santos segue batendo recordes, tendo movimentado 162,4 milhões de toneladas, alta de 10,5% em 2022. “A preparação para a privatização trouxe eficiência, o que é útil para qualquer cenário”, diz Marcus Mingoni, diretor-presidente interino da Santos Port Authority.

Pierdomenico destaca que outros dois modelos estão em análise: a concessão não apenas do canal, mas de toda a zeladoria, e a autogestão. “Para Santos, tenho grande simpatia pelo modelo de autogestão, com a formação de um condomínio, em que os operadores do porto assumem a gestão da operação da infraestrutura portuária. Talvez exija alguma alteração na legislação para não haver insegurança jurídica.”

Primeira e única autoridade portuária privatizada, a antiga Codesa, agora VPorts, tem planos ambiciosos de crescimento de 90% em cinco anos, para 15 milhões de toneladas ante a média de 8 milhões dos últimos anos. Bruno Fardin, diretor de infraestrutura e operações, diz que o principal projeto estruturante será a revitalização do modal ferroviário.

Embora as licitações dos arredamentos portuários ocorram desde a década de 1990, o ritmo em que serão conduzidas ainda é incerto. Entre 2015 e 2022, foram 48 leilões, somando investimentos de R$ 7,2 bilhões. Para o período de 2023 a 2026, estariam previstos 46 arrendamentos e investimentos de R$ 10 bilhões. “Essa é uma previsão, mas depende das diretrizes do novo governo no curto prazo”, ressalva Eduardo Nery, diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq). Para Pierdomenico, o número pode estar superdimensionado e será depurado, com uma avaliação mais realista. “Em abril, vamos ter o primeiro lote, que deve ser anunciado até o fim de março.”

O mais cobiçado é o quarto terminal de contêineres de Santos, o STS-10, que está em processo de revisão para alteração do layout, cedendo uma pequena parte para viabilizar a troca de área do terminal de passageiros. Também se discute sobre a participação da BTP e de seus controladores.

“A finalidade continua sendo movimentação de contêineres. Eu entendo que deva ter o maior número de participantes, desde que a concorrência seja preservada pela Antaq e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Vamos concluir essas análises ainda neste semestre”, diz Pierdomenico. Para Mário Povia, ex-secretário nacional de portos e ex-diretor-geral da Antaq, a melhor solução é fazer a licitação e deixar o Cade avaliar depois.

Antonio Carlos Sepúlveda, diretor-presidente da Santos Brasil, diz que tem interesse no terminal e está discutindo no Cade, via entidades de classe, a exclusão da BTP. A empresa está na fase 2 de seu projeto de expansão, com investimentos de R$ 540 milhões, a fim de aumentar a capacidade de 2,3 milhões para 2,6 milhões de TEUs em 2023.

“O problema não é de verticalização, mas de práticas anticoncorrenciais e abusivas pelos grupos MSC e Maersk, responsáveis por mais de 70% da carga conteinerizada que vem para o Brasil. A BTP já trabalha com mais de 100% da capacidade e não tem mais para onde crescer. Se adquirir o STS-10, haverá um monopólio em Santos devido à prática de self-preference, o que pode até alterar a matriz de produção do país”, alerta Jesualdo Silva, presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP).

“Entendemos que tem de deixar participar e, depois do resultado, verifica-se se há algum problema concorrencial”, defende Ricardo Arten, presidente da BTP. A empresa movimentou 1,9 milhão de TEUs em 2022 e espera crescer 5% em 2023. Ela ainda aguarda a renovação antecipada de seu contrato, prevendo investimentos de R$ 1,5 bilhão.

O eventual esvaziamento das agências reguladoras também preocupa o setor após a Emenda Aditiva nº 54, de autoria do deputado federal Danilo Forte (União Brasil-CE). Em nota, a Abratec critica a vinculação das agências reguladoras aos conselhos ligados aos ministérios e secretarias. “O posicionamento do setor e da Antaq é de que o atual modelo já está consolidado, e as agências vêm buscando aperfeiçoamentos, como a introdução das análises de impacto regulatório e a exigência de audiências públicas”, diz o diretor-geral da Antaq, Eduardo Nery.

“Precisamos colocar arbitragem nos contratos para reduzir a judicialização de matérias muito técnicas, que levam anos para ter um desfecho. O TCU está instalando uma câmara arbitral semipública e semiprivada”, reforça Mario Povia, ex-diretor-geral da Antaq.

Outra demanda do setor é a extensão por cinco anos do Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária (Reporto), que desonera investimentos em portos e ferrovias. Renovado por dois anos (2022 e 2023), o programa não teve resultados no ano passado, porque a Receita Federal teria dificultado as aprovações.

“Estamos mais otimistas do que no governo anterior, que era contrário a regimes especiais. O Reporto tem renúncia fiscal de R$ 500 milhões por ano, incluindo o setor ferroviário, apenas 0,01% do orçamento da União”, diz Morel, da Abratec.

Para Pierdomenico, o Reporto é estratégico como alternativa para desonerar e apoiar os investimentos em infraestrutura, mas deve ser alinhado com a proposta de reforma tributária em estudo pelo governo.

O porto Sudeste precisou entrar na Justiça para usar os benefícios do Reporto na compra de um guindaste. Em 2022, a empresa movimentou cerca de 18 milhões de toneladas de minério de ferro e espera crescer para 20 milhões em 2023. O Sudeste também vem se consolidando como um terminal multicarga. “No ano passado, fizemos cinco operações ship to ship (transferência de petróleo entre duas embarcações no mar) por meio de três contratos com a Galp, a Petrobras e a Prio. E estamos próximos a fechar outros”, diz Oliveira. Já o Tecon Salvador postergou para este ano a chegada de 12 tratores elétricos de pátio e duas reachstackers (veículo para movimentar contêineres) para aproveitar os benefícios do Reporto. “Este ano, vamos operar com dois berços de 400 metros cada um e estamos habilitados para navios de 366 metros”, comemora Demir Lourenço, diretor-executivo do Tecon Salvador, da Wilson Sons.